2025/09/04

4.º Festival Internacional de Cinema Independente arranca na 4ª feira

Lisboa está de olhos postos no 4.º Festival Internacional de Cinema Independente de Lisboa – Indie Lisboa 2007 – que arranca dia 19 de Abril, prolongando-se até dia 29 deste mês. Mais uma vez a qualidade e a diversidade dos filmes apresentados são uma constante de um festival, que já se tornou numa referência de um público exigente e ecléctico. O SEMANÁRIO esteve à conversa com Miguel Valverde, um dos seus directores, que nos revela o que Indie traz este ano.

O crescimento exponencial que se verificou este ano espelha o sucesso que o Indie Lisboa tem vindo a alcançar. Quais são os objectivos que se propõem a atingir este ano?
Tínhamos decidido no final da anterior edição que este seria o ano da consolidação, para que pudéssemos estabilizar o modelo que já tínhamos criado. Por um lado, tentaríamos apostar em mais filmes, por forma a dar mais condições aos espectadores para que o Festival continuasse aberto e orientado para o público e para que toda a parte organizativa pudesse ter finalmente o seu espaço de preocupação para parecer-se com outros festivais a nível internacional. Esse objectivo inicial não aconteceu. O festival volta a crescer com um maior número de salas e outras iniciativas, o que nos levou a pensar numa bilheteira centralizada para tornar mais prática a aquisição dos bilhetes. Resolvemos criar também o Indie Bus, destinado exclusivamente a espectadores do Indie, para poderem circular entre a Avenida de Roma e a Avenida da Liberdade, onde estão a ser exibidos os filmes.

A componente de formação faz parte das apostas do Indie Lisboa, nomeadamente com Lisbon Talks. Qual é o principal intuito desta opção?
Achámos que um festival que pretende ser um espaço de reflexão tinha de ter uma iniciativa deste género. Pretendemos criar uma maior proximidade entre o nosso público e os agentes do meio profissional do cinema. As conversas com os realizadores também já existiam, mas apenas no final da sessão. Nesse sentido achámos que aquelas pessoas que falavam sobre o seu trabalho precisavam de encontrar-se, criando assim um contexto profissional onde se discute o trabalho de cada um.

O critério de escolha entre 2500 filmes inscritos pode ser bastante complicado. Mudou alguma coisa em relação à metodologia de anos anteriores?
Fundamentalmente, precisámos de mais pessoas para verem os filmes, devido ao crescimento rápido que se verificou desde a primeira edição. Foi por isso que reforçámos a equipa com quatro pessoas que trabalham nas longas-metragens e duas pessoas com as curtas, e uma terceira que ajuda a desempatar quando não estão de acordo. Com esta medida conseguimos, a meu ver, a melhor programação de sempre do Indie Lisboa.

Há várias referências a filmes de anteriores edições do Indie. É o caso de Sam Peckinpah ou Lisandro Alonso. Há uma preocupação com a continuidade e a ligação com as anteriores edições?
De facto há muitos festivais que escolhem acompanhar autores e não propriamente filmes, o que pode levar à exibição de maus filmes. Nós não temos essa pretensão. O que gostamos é de autores que fazem bons filmes. Como tal, temos repetido autores que conseguem isso memo. Com isso começou a fazer mais sentido a secção do Observatório do Festival, porque há autores que as pessoas já procuram quando optam por aquela lista de filmes. Curiosamente, este ano, há mais autores que fazem curtas e longas-metragens, tornando este festival uma mistura entre os dois géneros.

Ao olhar para a lista de filmes seleccionados, houve um em particular que captou a minha atenção: “Olhar o Cinema Português”, 1896-2006, de Manuel Mozos. O défice de conhecimento da nossa história cinematográfica por parte da maioria do nosso público pesou na escolha deste filme?
Foi a primeira vez que coincidiu a apresentação de um filme deste realizador, de quem gostamos muito e que, tendo esta oportunidade, não podíamos passar ao lado de um filme sobre uma temática tão interessante que, de alguma forma, atesta a vitalidade do nosso cinema, mas ao mesmo tempo a selectividade dos filmes que foi feita por Mozos.
Decidiram este ano introduzir o programa especial: New Crowned Hope e uma homenagem ao festival L’Alternativa de Barcelona. O que está por detrás destas opções?
O primeiro está relacionado com o 150.º aniversário do Mozart, onde vamos exibir sete filmes, seis longas e uma curta-metragem, de autores que conhecemos há algum tempo, de quem gostamos muito, e que achámos que faria sentido exibir. O segundo resultou de um encontro de vontades, que veio no seguimento de nos terem convidado na edição transacta do festival deles, que teve lugar em Novembro de 2006, para mostrar uma série de filmes. Ficou então nessa altura prometido um evento semelhante em Lisboa, devido a um respeito mútuo e pela contaminação de gosto entre ambas as partes.

O herói independente deste ano foi dedicado a Shinji Aoyama e ao cinema alemão contemporâneo. O que está na origem destas escolhas?
Acaba por estar relacionado com a história deste festival. Desde o início que nos identificamos com um determinado tipo de cinema alemão, embora seja difícil para nós catalogarmos esse género. Nesse sentido, não se trata de uma retrospectiva do cinema alemão contemporâneo. Nesta secção propomos um olhar sobre uma determinada corrente de cinema alemão mais realista, ligada a classes trabalhadoras, ao contexto familiar dentro de portas, que vem na tradição de outros filmes exibidos em edições anteriores. A homenagem ao Aoyama vem no seguimento da atenção especial que dedicamos a cineastas asiáticos. Neste caso em particular trata-se de um realizador bastante ecléctico, que envereda por vários géneros, excepto pelo terror, devido a uma espécie de pacto que fez com o seu antigo professor que é especialista nesta área.

Derek Jarman, Sergei Paradjanov e Martin Scorcese editados em DVD

Foram recentemente lançados pela editora Midas quatro filmes consagrados do cinema independente. Quatro longas metragens de Derek Jarman e Sergei Paradjanov e dois documentários de Martins Scorcese sobre o cinema italiano e norte-americano, entre outros lançamentos também disponíveis no mercado nacional. A Midas apostou de forma ousada e apoteótica iniciar-se no mercado nacional apostando na qualidade de três grandes referências do cinema do século XX.

Derek Jarman

Derek Jarman, um dos realizadores mais influentes do cinema britânico, conseguiu deixar a sua marca pela opulência visual e a oposição desafiante aos cânones tradicionais do teatro e da literatura. Jarman foi influenciado por nomes como Michael Powell e Emeric Pressburger patente no estilo de cinema mais pessoal com reflexão na imagem em detrimento da narrativa e da caracterização.
Nos dois filmes lançados pela Midas, “Caravaggio” e “Wiittgenstein”, os elementos que mais servem para caracterizar Jarman estão bem presentes, com o seu fascínio pela violência, o homoerotismo e a imagética poética, nunca escondendo a sua doença terrivel, o HIV. Em “Caravaggio” sobressai um anacronismo lento e em “Wittgenstein” um estilo severo e teatral. Ambos os filmes incorporam elementos do seu passado artístico quando desenhou cenários e guarda-roupa para o Ballet e ópera. Fez os seus primeiros filmes enquanto trabalhava com designer de cenários em 1971 em “The Devils” e “Savage Messiah” de Ken Russel.
“Caravaggio” foi sem dúvida um dos seus trabalhos mais populares. Com esta longa metragem, Jarman fez uma reflexão acerca dos conflictos que o pintor manteve com a necessidade pela patronagem, condição sine qua non para sobreviver como pintor, e as suas crenças religiosas e sexualidade. Jarman utiliza elementos anacronistas como máquinas de escrever, motas e carros, que acabam por enfatizar a vertente mais hedonista do filme projectando a vida numa tela.
A dramatização teatral moderna que fez com “Wittgenstein” da vida do Filósofo vienense de Cambridge, Ludwig Wittgenstein que morreu em 1951, enfatiza o interesse pela sua linguagem. O filme aborda a homosexualidade de Wittgenstein desde a sua infância e a ligação que teve em Cambridge com Bertrand Russell e John Maynard Keynes onde o seu orgulho e perfecionismo académico que lhe valeu a genialidade com que ficou conhecido.
Em paralelo com a sua carreira de realizador, continuou a pintar e a exibir os seus trabalhos nas galerias londrinas cuja matriz de inspiração sempre se manteve relacionada com a cultura inglesa tanto ao nível histórico quanto contemporâneo. Acabou por morrer aos 52 anos devido a um estado terminal como consequência de ser seropositivo.

Sergei Paradjanov

Sergei Parajanov foi um dos mais importantes realizadores do século XX cuja admiração contrastou com uma perseguição feita pela Estado soviético da altura cujo enfâse nas heranças culturais das regiões satélites de Moscovo não era bem vista por parte de um regime que queria a todo o custo manter uma unicidade cultural em torno do comunismo, cujo realismo social, que era uma constante no cinema da altura, não se conjugava da melhor forma com os temas de foklore e religiosidade presentes nos seus filmes.
Paradjanov foi preso pela primeira vez em 1947 acabando por passar vários meses numa prisão da Georgia sob acusações de homosexualidade. Acabaria por sofrer outro desaire poucos anos mais tarde quando a sua jovem mulher ucrâniana foi assassinada pelos seus parentes, por ter casado com um estrangeiro. As dificuldades que passou na sua vida não o impediram de manter uma veia criativa notável recebendo inúmeros prémios, onde se contam o Grande prémio de Mar Del Plata; Festival de Roma e da Academia Britânica, todos em 1965, com o filme “Tini Zabutikh Predkiv”. No ano seguinte foi posto nas lista negras do regime soviético, cuja perseguição durou até ao colapso da máquina comunista.
Após ter estado 15 anos desempregado, em 1984, Parajanov recebeu ajuda por parte da elite da Georgia e realizou a “Lenda Da Fortaleza Surami”, um marco da sua expressão cinematográfica.
Baseado numa antiga lenda georgiana, é uma homenagem aos guerreiros daquela região que morreram pelo seu país. Um filme que recorda a importância do sacrifício para enaltecer a defesa da pátria.
“Ashik Kerib” foi realizado em 1988 em homenagem a Tarkovsky, uma obra prima do Azerbeijão baseado no poeta russo Mikhail Lermontov com uma fábula de um pastor que tenta ganhar dinheiro para casar com a rapariga que ama. Neste filme Parajanov dispensa dos mecanismos tradicionais para contar estórias, apresentando uma estória coreografada com uma mistura de elementos tradicionais e contemporâneos. Ganhou com este filme o Prémio Felix da Academia Europeia de Filmes.
Ambos os filmes contém diversos extras que servem como plataforma de compreensão mais aprofundada da obra deste cinesta.

Martin Scorcese

Já se sabia que o Martin Scorcese era um dos maiores cineastas da sua geração, uma referência ímpar para estudantes, curiosos e apaixonados pelo cinema. Esta constatação pode partir da sua obra, que surge numa altura de grande agitação quando o sistema de estudios ruira de forma estrondosa, potenciando um tipo de cinema de autor mais independente. Mas independentemente de se gostar ou não dos filmes de Scorcese, o seu conhecimento e paixão pela sétima arte acaba por ser inquestionável. Partilhando o seu conhecimento e estudo pelo cinema realizou dois documentários para o British Fim Institute que abrem portas para duas eras do cinema que inspiraram gerações vindouras. O primeiro, “Uma Viagem Pelo Cinema Americano”, debruça-se pelos grandes nomes da sétima arte ao longo do nascimento do cinema até ao final dos anos sessenta. Nomes como Arthur Penn, Samuel Fuller em imagens de arquivo Frank Capra, John Cassavetes, John Ford, Howard Hawks, Elia Kazan, Fritz Lang, Nicholas Ray, Douglas Sirk, King Vidor, Orson Welles, entre outros, povoaram o imaginário de Scorcese e serviram de inspiração à medida que ia crescendo. O documentário “A Minha Viagem a Itália” acaba por servir como um regresso às origens familiares de Scorcese com a obra dos mais famosos nomes do cinema italiano do neo-realismo nos anos 60, com uma divisão em duas partes com Roberto Rossellini, Vittorio De Sica (1ª parte), Luchino Visconti, Federico Fellini, Michelangelo Antonioni (2ª parte).
Dois documentários que não podem estar fora da prateleira de qualquer DVDteca.

A trama do Porto

A primeira edição do “Trama”, uma novidade na rede de festivais de artes performativas, acontecerá na cidade do Porto durante os primeiros três dias de Abril. Este festival apresenta espectáculos de música, dança, “performance”, teatro, “spoken word” e desenho digital.

São várias as propostas em estreia apresentadas em diversos locais do Porto. Uma espécie de manta de retalhos, onde estes são os vários espectáculos e a manta o tecido urbano. Um grupo de pessoas e instituições dão corpo a uma ideia: “performance” na criação de arte, ideia essa trabalhada nas ópticas da confrontação e da recriação.
Informal e flexível, o programa apresentado tem um percurso definido: Serralves, Casa da Música, Rivoli, Maus Hábitos, Hotel D. Henrique, Praça Dom João I e uma estação de metro do Porto. A escolha dos espaços é arrojada, demonstrando a polivalência do projecto e a preocupação em ser um festival do Porto e não de um só espaço da cidade. O próprio festival é construído numa rede urbana, institucional e criativa, complexa, tornando-se circular.
Na área da dança destaque para Maria Donata d’Urso, que traz “Pezzo (0) due” ao palco do Rivoli, nos dias 1 e 2 de Abril. Este espectáculo surge da colaboração entre a coreógrafa italiana e Laurent Goldring, um artista que filmou vários retratos do corpo. A proposta coreográfica de “Pezzo (0) due” tem o foco no subtil, no pormenor, “no ouvir a interpretação mais do que na vontade de exprimir algo”, segundo a própria. A pele é o espaço cénico.
Rosie Dennis explora o conceito de Spoken Word no bar panorâmico do Hotel Dom Henrique, com duas peças “Acess All Areas” e “Love Song Dedication”. Na primeira, a “performer”, poetisa e vocalista cria uma personagem disfuncional, numa “performance” que resulta da exploração da sensação de claustrofobia resultante da vivência e trabalho em “open spaces”. Na segunda peça, a australiana Rosie Dennis explora a fragilidade e a vulgaridade do amor, evocando uma meditação sobre o ser e a paixão.
O espaço menos óbvio a ser utilizado na programação do festival foi provavelmente uma estação de metro. Mas ela está lá, junto à Casa da Música, e serve de palco a António Jorge Gonçalves. O designer gráfico entrega-se ao desenho digital com “Etereopolis I”, um graffiti digital em espaço público. O processo é realizado em tempo real, nos dias 1 e 3 de Abril, sem recurso a material pré-gravado. A ideia é responder aos estímulos que o próprio local oferece. A habitação do espaço urbano pelo próprio desenho que se encontra em constante metamorfose.
Fugindo desta ideia de “performance” individual surge Gob Squad, um colectivo de artistas ingleses e alemães que trabalha desde 1994 em “performance”, multimédia e novas tecnologias. No Porto mostrarão “Super Night Shot”, um espectáculo que inicia uma hora antes de ter o público na plateia do Auditório de Serralves. Quatro “performers” saem para a rua e captam imagens no centro da cidade. Apresentada depois, como multiprojecção vídeo, a “performance” demonstra o seu carácter imprevisível e eleva o quotidiano ao conceito de épico.
Por fim, na área da música, na própria Casa da Música, chegará Mike Patton vs. Rob Swift and Total Eclipse. Este espectáculo é nada mais nada menos que a estreia mundial de um projecto que junta Mike Patton, ex-Faith no More, e Rob Swift e Total Eclipse, dos X-Executioners. Estes assumem os pratos, enquanto Patton nos delicia com a sua voz.
Nota-se que este festival se assume como uma junção não só de várias artes do palco, de rua e de procura de integração de todos os espaços citadinos na criação artística, mas também como união de vários projectos oriundos de vários países. Um mix de arte nacional e internacional.
Na organização estão os espaços em questão e a BRRR Festival Live Art, o Lado B Produções Artísticas e a CulturPorto, todos a trabalhar para que esta primeira edição seja um sucesso a repetir.
A 1, 2 e 3 de Abril, o Porto vai ter vários focos apontados na sua cidade. Porto, “here we go”!

A marca de uma geração

Está em palco no Toyota Box desde no início deste mês um dos mais arrojados projectos musicais dos últimos anos, “Sexta-Feira 13”. O musical tendo por base a música de uma das mais importantes bandas portuguesas, os Xutos e Pontapés, promete inflamar os ânimos de quem o for ver.

Tente pensar no panorama musical português nas últimas décadas sem pensar nos Xutos e Pontapés. Mesmo com excelentes contributos de outros grandes nomes do rock, os Xutos continuam a ser uma das imagens centrais do Rock português. A figura do Zé Pedro nos anos oitenta representa o estereótipo de uma geração de pessoas, agora nos seus trinta e quarenta, que viveram intensamente êxitos como a “Sexta-Feira 13”, “Eu Sou Bom” ou o “Circo das Feras”. É justamente na senda destas lendas vivas do Rock que surgiu pela mão de António Feio e Susana Félix, o musical que faz jus à mais controversa e marcante banda portuguesa.
Com um carisma muito próprio, “Sexta–Feira 13” nasce da vontade de várias pessoas, incluindo Eduardo Madeira, ao quem foi entregue o texto e Renato Júnior com a direcção musical. Neste campo foi preciosa a ajuda e colaboração dos próprios Xutos, que se mostraram muito entusiasmados com o projecto.
“Sexta-Feira 13” incorpora um elenco de luxo, no qual podemos destacar Bruno Cochat, Sérgio Lucas e Joana Furtado, numa estória que serve de espelho a uma geração de inconformados que viveram o amor, a morte e a juventude encontrando eco na música dos Xutos e Pontapés.
Os Xutos são indissociáveis da imagem de rebelde da geração de oitenta – um fora da lei, um inadaptado que responde apenas à suas regras, contra ao que a sociedade considerava como convencional. A música desta banda ainda hoje perdura, como prova temos em cena um dos mais arrojados musicais portugueses dos últimos tempos, sem cair no marasmo do cançotismo saudosista de tempos considerados áureos, como parece ser aliás a tendência dos musicais portugueses.
Este projecto é vivido intensamente tal como a banda que marcou uma geração. O Rock é uma forma de estar na vida, não um estilo musical. Os Xutos são Rock. Quem for ver não sairá indiferente perante a chuva de emoções e de música com que será confrontado. “Sexta-Feira 13”, a não perder no Toyota Box.

Alentejo em movimento

A temporada de 2006 de dança em Évora é preenchida por uma programação intensa e de grande qualidade em grande parte apresentada pelo Espaço do Tempo (de Montemor-o-Novo). O Espaço do Tempo, sob a direcção de Rui Horta, e em co-produção com o Centro Dramátrico de Évora, com organização da Câmara Municipal de Évora, apresentam este mês dois espectáculos imperdíveis.

“Berna, n.º 49 Kramgasse” é um espectáculo de Cláudia Nóvoa e será apresentado nos dias 10 e 11 Fevereiro, no Espaço do Tempo em Montemor-o-Novo. Cláudia Nóvoa fazia parte do Ballet Gulbenkian e alguns dos espectáculos que lhe deram mais prazer interpretar foram “Jardim Cerrado”, de Nacho Duato, e “Old Children”, de Mats Ek. A bailarina, depois de “Solidão aos Molhos”, regressa à criação, em nome próprio, com um elenco de cúmplices que partilharam a despedida daquela companhia de dança.
Criou o espectáculo, agora apresentado, em 2005, ano mundial da física. Ao ler alguns jornais, Cláudia Nóvoa sentiu algum interesse em relação a um pormenor da morte de Albert Einstein. Este pormenor foi o facto do patologista que lhe realizou a autópsia lhe tirar o cérebro para melhor o estudar, guardou pedaços em formol, andando fugido durante mais de 40 anos. Foi assim que a coreógrafa assumiu o desafio de “entrar no cérebro deste cientista famoso” e começou a sua própria ciência. Estudou e passou a conhecer melhor os responsáveis de grandes descobertas da humanidade e criou um espectáculo, que se pode dizer que é fruto do fascínio da evolução do conhecimento científico. O espectáculo foi construído em residência artística no Convento da Saudade, em Montemor-o-Novo e esta será a sua primeira apresentação, neste novo espaço de espectáculos.
Na base, o comportamento do átomo, a grandeza do cosmos, a relatividade do tempo, as forças de interacção. A viagem começou com Einstein, são tratados os conceitos de espaço, tempo, velocidade, luz, massa e energia. O nome “Berna, n.º 49 Kramgasse” nasce da importância da residência em Berna, onde o cidadão suíço pensou e elaborou a teoria da relatividade. Isto aconteceu em 1905, há 100 anos. Hoje essa casa é um museu muito visitado e Cláudia Nóvoa é uma bailarina, que interpreta o papel de coreógrafa e cria “Berna, n.º 49 Kramgrase”. A “performance” conta com a interpretação da própria coreógrafa, Romeu Runa, Sandra Rosado e Pedro Mendes. O desenho de luz é de Paulo Graça, a música de Mário Franco e a fotografia de António Rebolo.
O espectáculo vive da energia e do movimento, assumindo um interesse pelo lado poético da matéria. Propõe-se a olhar de uma forma quase nua sobre a expressividade do corpo, sem recurso a grandes tecnologias.
No fim-de-semana seguinte, “Obstrucsong” estará no Teatro Municipal Garcia Resende, em Évora, depois de ter passado por Praga, Berna e Bruxelas, além da Dinamarca, Polónia, entre outras cidades. O espectáculo está em digressão desde Maio de 2005. Coreografado por Palle Granhoj, um dos mais prolíficos e criativos coreógrafos da cena dinamarquesa e interpretado pela Companhia Gtanhoj Dans (Dinamarca), esta é uma performance criada em cooperação com os intérpretes: Aline Rodriguez, Anne Eisensee, Daila Chaimsky, Dorte Petersen, Gaute Grimeland, Kristoffe Pedersen e Jannik Nielsen. Palle Granhoj dirige a peça num tapete de lã. Nas suas palavras, às vezes quando ouves música, um simples acorde pode ser suficiente para nos pôr com uma determinada disposição. “Obstrucsong” é a sua tentativa de deixar uma dança simples e física, uma canção em forma de ritual, dar à audiência a sensação de que falta algo. O que falta é explorado neste espectáculo.
O espaço puro enquadra o essencial do seu método: a obstrução técnica. Segundo o coreógrafo, grelhas e obstáculos são limitativas para os intérpretes, deixando surgir novas possibilidades. It was complex… I just need it to be really simple!
A fonte de luz primária é a lâmpada e os engenhos simples, caixas de lata, tampas e varões flexíveis fazem a moldura do espaço de dança e do palco. As línguas usadas neste espectáculo são o volapuk e o inglês, fazendo com que haja uma exploração diversa da linguagem. A voz dos intérpretes é o foco. Todos os sons se baseiam na voz natural e acústica. Da respiração dos intérpretes surgem sons estranhos e curiosidades que crescem através dos sussurros, até se tornarem num canto e em gritos. Segundo a crítica finlandesa: they sing like an angle choire.
O design é de Per Victor. “La Libre Belgique” considera a ideia sedutora, o conceito vertiginoso e a entrega é feita com humor, precisão e luminosidade. Os arranjos musicais são de Laila Skovmand. Esta é uma performance de uma companhia com um curriculum longo e que é uma lufada de ar fresco na dança moderna. Subirá ao palco deste teatro na cidade de Évora nos dias 17 e 18 de Fevereiro às 21h30.