2025/06/25

Bomtempo na alma de Gabriela

A música de câmara é o seu repertório de eleição, pela sua vertente intimista, explanada nos recantos do quarteto “Capela”. Gabriela Canavilhas, pianista, professora, e até radialista, percorre no seu novo álbum “Quintetos com piano” a trilha desenhada por João Domingos Bomtempo nas pautas do século XIX, e acompanhada do SEMANÁRIO viaja pelas suas paixões, as suas origens que lhe moldaram um percurso, por entre a música de hoje e de sempre.

Açoriana enamorada pelo adiado retorno às raízes africanas que lhe foram berço, agradecida pela experiência vivida ao longo de dois anos nos Estados Unidos, hoje professora no Conservatório Nacional de Lisboa e colaboradora da Antena2 no programa “O despertar dos músicos”.
Fiel intérprete do conceito de música de câmara que advém da ideia de um pequeno grupo de instrumentistas funcionando como solistas, num “género de repertórios que exploram a depuração da linguagem e procuram diferentes texturas sonoras”.
O inevitável relacionamento entre as instituições governamentais e o meio cultural Português mereceu referência por parte da pianista “o estado tem a obrigação de criar meios e condições para os artistas se expressarem nas áreas artísticas em que a lógica de mercado não funciona” acrescentando que “não se pode continuar a olhar a cultura como algo que necessita de ser subsidiado totalmente, mas como qualquer coisa com potencialidade para ser lucrativa no balanço económico do país”, concluindo, “o estado deve estar atento às vanguardas, às novas criações e ao estabelecimento e afirmação de novas linguagens”.
Situando a música erudita como tendo “tantas nuances de mercado como qualquer outra”, com o exemplo de um dos seus álbuns “Vocalizos”, totalmente construído com base em obras de compositores contemporâneos Portugueses e que atingiu um substancial número de vendas, situação que encaminha o rumo do seu discurso para o facto das editoras discográficas não apostarem ainda fortemente neste segmento do mercado musical como algo rentável.
A ” pluralização de repertórios apresentados, como se afere do grande êxito alcançado pelos três tenores, que se traduziu numa clara estratégia visando a massificação da venda, vem na sequência de uma lógica de mercado que começa a ser explorada na área da música erudita”.
Gabriela Canavilhas prossegue neste âmbito, mas introspectivamente colocada perante a questão da comercialização da sua própria obra revela “o reconhecimento de um aluno, uma carta de um ouvinte valem mais que os concertos e os discos pois são mera expressão da nossa actividade. O que realmente importa para um artista é tocar em alguém ao longo da sua vida”.
No fecho da conversa Gabriela, amante da música como arte indissociável da cultura que a molda em todas as suas cambiantes, traça para os leitores do SEMANÁRIO um pequeno esboço da sua visão em relação à música Portuguesa, nomeadamente quanto à questão da formação ” onde a qualidade do ensino tem melhorado substancialmente nos últimos anos, situação consubstanciada pelo surgimento de novos instrumentistas”.
Também o fenómeno gerado em torno da denominada música “pimba” mereceu um comentário, ” o ar de superioridade com que músicos credenciados observam este tipo de sonoridade traduz-se por um certo basismo latente, que faz desvanecer a verdadeira e natural essência tradicional de onde provém este tipo de canções”.

Morreu Maria Ondina Braga

Maria Ondina Braga, escritora, faleceu hoje em Braga, na sequência de doença prolongada. O seu funeral realiza-se amanhã na cidade dos Arcebispos.

Autora de uma vasta obra, dedicou-se durante quase duas dezenas de anos à tradução de nomes grandes da literatura, como Graham Green, Pearl Buck, Bertrand Russel, Herman Wouk, John le Carré, Herbert Marcuse, Anais Nin e Tzvetan Todorov.

Natural de Braga omde nasceu a 13 de Janeiro de 1932, Maria Ondina Braga estudou línguas na Royal Society of Arts, em Inglaterra, e na Alliance Française, em Paris e foi professora de Inglês e de Português em Luanda, Goa e Macau entre 1959 e 1965.

Como escritora foi bastante premiada e encontrando-se referenciada em antologias portuguesas e estrangeiras.

Da sua bibliografia o destaque vai para títulos como “A China Fica ao Lado” (traduzido para chinês), “Amor e Morte”, “A Revolta das Palavras”, “A Casa Suspensa”, “Lua de Sangue”, “Passagem do Cabo” e “Vidas Vencidas”.

O funeral vai partir às 15:00 de sábado, da Igreja de São Lázaro, em Braga, para o cemitério de Monte de Arcos.

Festival Super Bock Super Rock arranca a 27 de Março

Na nona edição do festival, Coldplay e Beth Gibbons & Rustin’ Man constituem-se como nomes a destacar no Festival Super Bock Super Rock, que arranca no dia 27 deste mês, em Lisboa, cerrando portas a 12 de Abril, todavia já em Madrid, Espanha.

Cerca de uma vintena de concertos estão já agendados, em mais esta edição do festival, promovido pela Música no Coração, repartindo-se entre Lisboa, Porto, Évora e Madrid, à semelhança do que sucedeu no ano transacto, em que alguns espectáculos decorreram mesmo fora do país, nomeadamente em Vigo (Espanha).

Outra das inovações previstas para a edição de 2003 relaciona-se com a realização de noites temáticas, que têm início com a “Noite Hip-Hop” a 01 e 02 de Abril, e onde marcarão presença os norte-americanos De La Soul e os Portugueses Sam The Kid, Micro, Fuse e Mundo Complexo.

Segue-se a “Noite Electro”, a 02 e 03 de Abril, com os Trash Palace, projecto dirigido por Dimitri Tikovi, os Zentex, os Antalgic bem como os dj’s Plagia, Pit Pull, Yari e Pan Sorbe.

Os extravagantes e lusitanos Blasted Mechanism e os espanhóis Los Planetas protagonizarão a “Noite Ibérica”, no dia 06 de Abril em Lisboa e dia 12, no encerramento do festival, desta feita em Madrid.

Para além das noites temáticas, esta nona edição conta com um ciclo de conferências que decorrerão em Lisboa e no Porto, com vista ao debate de temas sociais relacionados com o fenómeno musical, nomeadamente a questão dos impostos aplicados neste segmento de mercado, o hip hop, o papel do “disc- jockey”, do promotor e do jornalista.

Noutras noites, outros espectáculos a destacar no cartaz do festival, nos quais se registam agradáveis presenças, onde se poderão incluir a dos Brasileiros Charlie Brown Jr., Madrugada, Xutos & Pontapés, Beth Gibbons & Rustin’ Man, Lemon Jelly e dos Britânicos Coldplay, naquele que poderá ocorrer como um dos grandes concertos do ano.

DIXIT – “The Best of…”

Um álbum… uma banda… que comemora em 2003, dez anos de existência. Dez anos a remar contra adversas marés, no imenso oceano de crispações do mundo da música rock em Portugal… cantada em português.

Este é um disco que o colectivo do Seixal esperava há anos, bem que poderia ser o melhor de… mas este é um CD de 3 ironias.

A escolha do nome, deliberadamente em Inglês, contrasta com o idioma utilizado em todas as canções, talvez actualmente a teimosia dos DIXIT em continuar a escrever e cantar em Português.

Outra ironia surge no facto de este ser o 1º álbum e reunir as melhores canções (segundo os DIXIT) feitas nestes últimos 9 anos, num disco que bem poderia ser a compilação dos álbuns que foram criados, mas… que ninguém editou.

Normalmente os “Best of…” são as compilações de despedida. Para os DIXIT é um disco de apresentação e a afirmação de uma carreira.

Esta 1ª edição da Editora independente IMAN Records, tem a produção de Tó Silva, foi gravada durante os anos de 2001/2002 no estúdio Noites longas e tem distribuição/promoção da NEMESIS.

A bandeira dos DIXIT para este disco é “queremos ser ouvidos” porque o acto de dizer (DIXIT), só tem sentido se alguém ouvir. Contra os preconceitos, censuras e sistemas estabelecidos ai está o primeiro disco em português de 2003, para se ouvir bem alto.

Showcases de apresentação do álbum já realizados:
– Sábado, 1 de Fevereiro (Apresentação do website), 22h – Ghost Bar
(Pinhal de Frades, Seixal)
– Quinta, 6 de Fevereiro (1ª apresentação em TV), 23 h – Cabaret da
Coxa (Sic Radical)
– Sábado, 8 de Fevereiro (1ª Apresentação ao vivo), 18 h – FNAC Almada
Fórum (Almada)

O disco foi oficialmente lançado no dia 3 de Fevereiro.

“Tremores Íntimos Anónimos” no Teatro da Trindade

Estreia hoje na Sala Estúdio do Teatro da Trindade, em Lisboa, a peça “Tremores Íntimos Anónimos”, inserida no Ciclo Contemporâneos Portugueses. Com encenação de Susana Arrais e interpretação de Ana Cloe, Edmundo Rosa e Teresa Pombo. Os textos estão a cargo de Luís Carlos Patraquim e António Cabrita.

Segundo a sinopse da peça, “o desafio à partida era imenso, trabalhar ou retratar o nosso quotidiano de miséria pela pena irónica e divertida de dois
poetas/jornalistas tão mordazes como são o Luís Carlos Patraquim e o António Cabrita. Um mosaico de cenas, frase, diálogos soltos, encadeados segundo uma lógica de “e por falar nisso!…”.

Tremores Íntimos Anónimos retrata a descontinuidade da realidade humana e com as tonalidades do quotidiano, onde temas como a sexualidade, o voyeurismo, ou a incomunicabilidade
se articulam e desarticulam como num harmónio. Dois escritores.

Uma encenadora. Gerações diferentes, pontos de vista complementares?”
Em cena até 15 de Março de 4ª a Sábado.

Elogio da encenação como “caixa preta”

“Já em tempos, num texto sobre teatro, referi que para mim o teatro equivalia à “caixa preta” dos aviões: um dispositivo que condensava memórias, sonhos e traumas irredutíveis, que nos devolve à realidade dos fantasmas, à realidade de antes do desastre.

Talvez seja essa a ideia que subjaz ao título que eu e o Patraquim escolhemos para intitular a nossa proverbial trapalhada: Tremores Íntimos Anónimos. Isto é: os estados íntimos das almas nessa dança com que a realidade faz conversar e desconversar as criaturas, na quotidianeidade que as devora e torna descartáveis. Algumas vezes são personagens mais ou menos risíveis, em situação e/ou em conflito com a sua circunstância, outras vezes são apenas frases desgarradas que procuram personagem, jogo.

Convém dizer que a inteligente opção cénica de Susana Arrais entretece também um fio dramatúrgico que salva as “vozes desconexas” que o texto tenuamente enleava, dando-lhe um sentido que a peça não continha. Daí que possamos dizer com justiça que existia um texto-a-espaços-dramático antes das soluções da encenadora e que agora existe uma “peça”, que aquela e os actores exumaram e a que souberam dar persuasão.

Foi um trabalho de organização, decifração e clarificação que, como nas “caixas pretas”, devolveu um sentido ao desastre. Está pois de parabéns a equipa que levanta este espectáculo no palco e só para ter assistido a esse outro espectáculo da inteligência-em-acto valeu a pena cometer estes “tremores íntimos”. Que se esperam recompensados pelo “anonimato” das palmas.” António Cabrita

Tremores Íntimos Anónimos

“Piquenos exercícios de ironia, alguma ferocidade, muita ternura. Sentamo-nos num café e abrimos o jornal: na coluna das “breves” há mesmo uma notícia sobre as calcinhas borboleta; Brasil, Rio de Janeiro. A descrição da sua funcionalidade até é sugestiva, faz sorrir. As elucubrações são as possíveis: não dá para pedir tratamento do tema, suas “esquiso” ou outras explicações, a nenhum especialista de televisão. Mas não pode dar isto: outra vez piquenas vibrações, situações de linguagem, o desvelar do que se esconde sobre a “evidência” do quotidiano, sua tipologia de situações e de personagens/máscaras? Dá!

Então, se dá, toca a baralhar tudo e a pôr numa caixinha, tão antiga como a lâmpada de Aladino, tão incongruente como um tupperware. Era no tempo das transições: alguma coisa no fim, as fracturas a seguir. “O que é uma coisa?” perguntava um filósofo alemão. Tinha de ser alemão. Aqui não se responde a isso. Era preciso mais competência…. e quem não a tem “não se estabelece”. Aqui goza-se: uma família desnaturada, memórias desencontradas e incómodas, revelações de fazer uma girafa encolher o pescoço. Com piquenos tremores anónimos e algumas letrinhas apenas.” Luís Carlos Patraquim.