2025/07/12

Sampaio posto à provapor Rui Teixeira Santos

Nunca um presidente da República foi colocado à prova como Sampaio. Todos olham para ele. Compete-lhe ficar para a história ou simplesmente enterrar de vez Portugal. É parte deste verão quente, que parece que vai aquecer muito mais.

O país já se começa a adaptar à ideia de que não existe oposição. As sondagens estão aí exactamente a provar que os portugueses se vão conformando com a ideia de perpetuar no poder esta maioria. E, quando isto acontece, é evidente que todos, desde os políticos da oposição até aos cidadãos da República, começam a olhar para o presidente da Republica, para que ele assuma exactamente o papel que a oposição não assume.
Durão Barroso, já percebeu isso mesmo. Começou por fazer apelo aos parceiros sociais para retirar espaço à oposição parlamentar e trouxe para a rua o confronto com a oposição, sabendo, de ante mão, que os sindicatos não existem e que a sociedade civil já não tem capacidade crítica para poder contestar, ou mesmo agir, autonomamente. Além disso, basta-lhe amaciar Sampaio.
Politicamente, o resto acabou por ser o Juiz Rui Teixeira e o procurador João Guerra a fazer, com o processo de pedófilia da Casa Pia. A ser verdade, as últimas informações sobre escutas, estamos perante mais um caso de perseguição judicial e de um magistrado insensato. Mas mais que a justiça, com toda a manobra na comunicação social (e com a violação do segredo de justiça sistemático) começa a emergir na opinião pública que as leis não prestam e que a gestão do caso de pedófilia da Casa Pia é política e serve os interesses do Governo.
Socialmente, o resto acabou por ser a recessão económica, provocada pela insensatez de Manuela Ferreira Leite a fazê-lo, empurrando sete por cento dos portugueses para o desemprego, criando a maior crise financeira do Estado, e o ambiente mais económico depressivo. Se a crise já fez o seu caminho, todos sabemos que é falso o discurso oficial da retoma e que, o pior está para vir, logo em Setembro próximo, quando as fábricas não abrirem e o desemprego subir em flecha.

Exército quer a demissão de Paulo Portas

Como se isto não bastasse, Paulo Portas arranjou um problema na Defesa. E, ontem, pela primeira vez na história da República, os generais ex-CEM do Exército (tenhamos noção, com Eanes, Garcia dos Santos e Rocha Vieira à frente) reuniram-se, num jantar, para ouvir o chefe do Estado Maior do Exército demissionário Silva Viegas, e pedir, naturalmente, e mesmo sem palavras, a demissão do ministro da Defesa. A última vez que os militares se reuniram, eram apenas capitães e fizeram um golpe de estado…
Como se isto não bastasse, os juizes, em vez de humildemente reconhecerem que aplicam mal as leis, reagiram corporativamente às criticas e não percebem que não têm rigorosamente poder algum que não venha do povo e que não esteja subordinado ao direito.
O País treme quando começa a conhecer, um a um, os seus magistrados: desde Maria José Morgado, uma soixante huitard sobrevivente, a Conceição Oliveira, que vê lobbies na instância que a nomeia, ou a Rui Teixeira que não tem noção do que é a liberdade dos cidadãos, até aos responsáveis dos tribunais superiores, que têm reacções pouco inteligentes, corporativas e arrogantes.
Diante disto, o governo foge para o Porto, onde, debaixo de protestos legítimos, reúne o Conselho de Ministros para aprovar medidas de emergência contra o desemprego, que em vez de servirem para alguma coisa, vêm apenas complicar o sistema, criar mais excepções, demonstrando que não há um único ministro neste governo que tenha noção do que é uma empresa privada.

O País à espera de Sampaio

Diante disto, o País olha para Belém. Olha para Sampaio, que pede a demissão de Portas e ante a recusa de Barroso não demite o primeiro ministro. Olha para Sampaio, que assiste á “falcatrua” do fundo de pensões dos CTT (ontem decidido no Porto) para maquilhar as contas públicas, e deixa Ferreira Leite sossegada. Olha para Sampaio, que manda reunir à hora do jantar os magistrados da nação, para no fim declarar que está aberta a época de caça aos juizes. Ou seja, que o arguido Paulo Pedroso não pode estar preso, porque dois amigos seus decidiram falar, ao presidente da República, sobre o Procurador Geral de República…
O País olha para Belém. E, de Sampaio vem, apenas, o lamentável tiro de partida para o debate sobre a justiça, na linha aliás do manifesto infeliz de Mário Soares, Leonor Beleza e Jorge Lacão, que pediam a revisão da lei processual penal, no que respeita à prisão preventiva, escutas e segredo de justiça. Eles, como lembrou Marcelo Rebelo de Sousa, que fizeram, com outros (que, agora, curiosamente, andam fugidos, como Almeida Santos e Fernando Nogueira), o Processo Penal de um Estado persecutório, de inspiração alemã, mal feito e incompetente, para já não dizer violador da Constituição e dos Direitos do Homem. Um “processo penal para pobres”, bem ao gosto da moral desta burguesia de retornados e baixas patentes militares que tomou conta do Estado depois do 25-A.

Não se discute a justiça na rua

Tudo insensato, porque não é na rua que se discute a Justiça. Porque não é na televisão que se contestam abusos de direito. Porque não é em jantares em S. Bento, nem em discussões acaloradas com o juiz presidente do Supremo, que os juizes passam a aplicar as leis, respeitando os princípios gerais de direito e os direitos do Homem.
Todo o edifico está errado. Mas não se abata o que existe intempestivamente porque, depois, não sobra nada, o que seria ainda mais inseguro e injusto. Não se pode substituir a “roleta russa” pela “arbitrariedade”, tenhamos noção!
O direito está assim porque se foram fazendo leis, cada vez mais mal feitas, à medida do populismo estúpido e da agenda da comunicação social, em vez de se pensar o sistema coerentemente e com bom senso.

O que mudar nesta justiça

É evidente que a prisão preventiva não é um instrumento de investigação, mas antes um meio de prevenção excepcional, pelo que ninguém deveria poder estar mais de um ou dois dias preso sem culpa formada. Parece ainda evidente que em caso de erro, não só o Estado deveria automaticamente cumprir obrigação de se retractar (eventualmente, com desculpas públicas do Conselho Superior de Magistratura ao inocente) e de pagar ao inocente uma indemnização significativa, ao mesmo tempo que o juiz que ordenou erroneamente a prisão preventiva deveria igualmente sofrer uma pena simultaneamente restritiva da sua liberdade e que afectasse a sua carreira futura. É evidente que não é admissível que um órgão de soberania possa escutar outro, mas também é certo que não pode haver discriminações entre portugueses diante da lei, apenas porque ocupam uma função de Estado. A violação das conversas privadas, as escutas, assim como a do sigilo bancário ou da privacidade dos cidadãos, só pode ser feita excepcionalmente e não deveria ser o principal instrumento de investigação da judiciária. Mas, para que isso aconteça, o executivo tem que alocar à judiciária meios de investigação, ao mesmo tempo que temos que confiar no bom senso da magistratura, que apenas excepcionalmente faz escutas em crimes graves de terrorismo ou redes do seu financiamento e branqueamento dos seus recursos mafiosos. Porque foi para isso que se permitiu alargar o âmbito das escutas e não para um juiz de 32 anos, que gosta de fazer musculação, num ginásio em frente ao seu tribunal, escutar conversas entre o líder da oposição o chefe do grupo parlamentar dos socialistas. É evidente que não faz qualquer sentido a autonomia do Ministério Público que deve depender formal e organicamente do Ministro da Justiça, para que possa cumprir a política criminal do Governo, sufragada pelos portugueses e aprovada na Assembleia da Republica. Não faz sentido que seja o procurador geral da Republica a escolher a política penal portuguesa e, muito menos, podermos ceder ao automatismo da acção penal que, em face de meios, sempre limitados de investigação, transforma a Justiça numa verdadeira “roleta russa”, o que é tão injusto quanto os “casos exemplares” dos regimes totalitários ( que, curiosamente, atingem, também e sempre, os adversários políticos do governo).
É evidente que o segredo de Justiça tem que servir para proteger o arguido e não para o prejudicar, embora, na fase inicial do processo, possa servir para ajudar à investigação. Mas deveria haver sempre um prazo, nunca superior a três meses, em que o investigado fosse obrigatoriamente constituído como arguido e informado que estava a ser investigado e as ponderosas e justificadas razões que levaram o Ministério Público a avaliar da oportunidade da referida investigação, devendo a excepção, (em casos tipificados, como por exemplo o terrorismo ou as redes mafiosas e de crime organizado), ser autorizada por um tribunal superior.
Finalmente, parece evidente que deveríamos, rapidamente, extinguir o Centro de Estudos Judiciários e integrar a formação dos magistrados em Mestrados nas Faculdades de Direito, públicas e privadas, e obrigar a que a carreira comece sempre pelo Ministério Público e que, apenas, possam ser juizes de primeira, magistrados com, pelo menos, dez anos de Ministério Público.
Tudo isto, mas muito mais, é preciso.
É tempo de Portugal passar a ser um Estado de Direito. É tempo do Estado perceber que está ao serviço dos cidadãos e de os olhar como gente de bem, titular de direitos e nomeadamente do poder, que delegadamente os órgãos do Estado exercem.

Os erros dos tecnocratas

O mesmo se passa na economia. O país perplexo assiste a erros de tecnocratas que fazem afirmações insensatas como a do ministro da Saúde, esta semana, que dizia que não queria saber de ideologia, o que interessava é que os serviços funcionassem para o utente.
Já ninguém vai na conversa das culpas do PS e são sempre os mesmos economistas cavaquistas da Universidade Nova (agora acompanhados pelo oportunista Pina Moura) a dizerem que a retoma vem já aí e que a estratégia de Ferreira Leite é correcta.
Não só não é tecnicamente correcta, como, ainda por cima, os resultados estão à vista, estando Portugal a sofrer a maior recessão da Europa, sem que se consiga evitar a derrapagem das contas públicas ou o recurso à cosmética contabilística (forma, aliás, que na mente perversa e limitada de membros do governo até serve para evitar pesar mais sobre os portugueses a necessidade de consolidação orçamental, ao mesmo tempo que nos afasta da mira dos fundamentalistas da Comissão Europeia e convida ao limite no despesismo no Estado).

Governo com “complexo Sousa Franco”

É, ainda por cima, consensual que o governo é muito desigual. O primeiro ministro surpreendeu pela positiva e na Saúde e na Educação até há obra para mostrar. Mas, o resto é muito mau, a começar na má qualidade da legislação produzida, pelas ideias insensatas que levam à pratica e pelo comportamento pessoal de alguns membros do Governo.
Durão Barroso está com o “complexo Sousa Franco”. Acha que, se despedir Ferreira Leite, o Governo entra numa espiral de descrédito igual à que Guterres sofreu quando Sousa Franco saiu do governo socialista. Só que há uma diferença enorme: Sousa Franco era competente e sabia para onde ia. Mais ainda: na altura, havia crescimento económico significativo, optimismo na classe empresarial e confiança no Estado. Hoje, não só estamos em recessão, como, ainda por cima, estamos no nível mais baixo das expectativas dos agentes económicos (conforme os dados de ontem do INE). E, de pouco vale manipular, de hora avante, com ou sem nova administração, os números do INE, para ter índices e estatísticas mais simpáticas para o Governo. Basta ter ido ao Algarve no mês de Julho, para perceber que os portugueses não fizeram férias, como nos anos anteriores. Já nem precisamos de estatísticas para sabermos que Lisboa é uma das cidades mais caras da Europa e que os portugueses são os que recebem salários médios mais baixos.

Estado de pré-insurreição no Exército

Com as Forças Armadas em estado de pré-insubordinação, com a economia assim e o desemprego a explodir, com a justiça no banco dos réus e com a liderança do PS ameaçada por causa do processo da Pedófilia, todo o País olha para o presidente da Republica. E o que vê? Infelizmente nada.
Sampaio limita-se a pedir a demissão de Portas, que Barroso não dá, e, depois, não acontece nada. Sampaio faz presidências abertas e o governo diz que sim senhor, mas não acontece nada, pois Ferreira Leite não tem dinheiro e continua com a mesma política, (dando-se ainda ao luxo, diante da perplexidade dos restantes ministros do actual governo, de fazer análise do cabimento orçamental, mas também da oportunidade política das decisões que competem aos outros ministros, assumindo-se como Ministra de Estado, que também é).
Sampaio pode reunir os supremos magistrados da Pátria, poupando o governo, mas é ao poder legislativo que, em última análise, compete rever a situação e, sejamos lúcidos, a palavra do presidente, um democrata e urbano e civilizado homem de direito, temos que o reconhecer, não pesa na “cabecinha” dos juizes da Nação.
Barroso pode esconder-se com a trapalhada de Portas e de Ferro Rodrigues, esperando assim safar-se do desgaste político de uma crise económica que não tem sabido gerir. Mas, sejamos lúcidos, isto, a continuar assim vai acabar mal, mais pobre e dependente de Espanha.
O Verão vai alto e quente e, antes mesmo que as fábricas não abram, em Setembro, antes que o Juiz Rui Teixeira comece a interrogar todos os dias as 32 crianças da Casa Pia, antes que os militares se revoltem nas casernas, era importante que o presidente da República soubesse o que vai fazer. Este é, talvez, o momento mais delicado de um presidente da Republica, desde o 25 de Novembro.

Cuba e Iraque: dois desafios para a Europapor Manuel dos Santos

A situação política internacional continua altamente dependente da forma como evoluir e se normalizar o conflito que os Estados Unidos e um punhado dos seus aliados sustentam no Iraque.

Curiosamente a imprensa internacional e, por reflexo, as opiniões públicas nacionais nos países da Europa tem salientado mais a qualidade das suas democracias, medida pelo grau de fiabilidade com que os diversos lideres políticos justificaram a guerra, do que as inegáveis consequências políticas, para a paz no Mundo e especialmente no Médio Oriente, que o desfecho daquele conflito contém.

Apesar de todas as dificuldades, algumas mesmo inesperadas face à facilidade com que caiu o regime do Iraque, é inegável que a situação no Mundo é, hoje, melhor e, sobretudo, começa a ver-se, relativamente ao conflito de maior grau de dificuldade – o que opõe Israel à Palestina – uma boa oportunidade de resolução.

Apesar disso, o que continua a ser especialmente discutido é a legalidade da intervenção americana, à luz do direito internacional resultante de um equilíbrio de terror que, hoje, felizmente, já não existe, ou a natureza e consistência dos argumentos que, nomeadamente, na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, foram usados para “justificar” a guerra.

Tudo isto se tornou mais evidente e ganhou uma dimensão inesperada, à luz dos últimos desenvolvimentos, marcada pela eliminação dos filhos do ditador do Iraque e pelo conflito que opõe a BBC ao Governo britânico que já provocou o desaparecimento, em circunstâncias trágicas, do cientista inglês David Kelly.

Dir-se-à que esta é a verdadeira força das democracias que permanentemente se discutem e confrontam que sempre rejeitam utilizar, em proveito próprio, os métodos, os meios e os instrumentos que combatem em relação às sociedades que não são livres.

Contudo, o acessório ainda que muito importante, não pode nunca esconder o essencial. Ora, o essencial é que a intervenção norte-americana e britânica no Iraque e o seu sucesso (que todo o mundo livre deve desejar) se tornou num elemento fulcral e decisivo da paz e surge hoje claramente como o único caminho para promover a prazo, a resolução definitiva do conflito entre Israel e os árabes. Como também é essencial, compreender, sobretudo para os europeus, que a intervenção de Tony Blair, o Primeiro-ministro da Grã-Bretanha, neste conflito, pode ter dado à Europa o pretexto e a oportunidade de assumir um papel de destaque e importância numa reforçada e revigorada cooperação transatlântica com os Estados Unidos.

São, portanto, bastante mais positivos que negativos, para o mundo livre, as consequências que podem resultar da guerra do Iraque (o que será visível no curto prazo seguramente) o que, se não impede que tudo se discuta em democracia, exige, pelo menos também que não se esqueça, discuta e reflicta sobre o que é verdadeiramente essencial.

Paralelamente com a discussão da situação no Iraque e das suas consequências nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, a imprensa reflectiu, nos últimos dias, o conflito verbal aberto entre a União Europeia e Cuba.

O resumo da situação é fácil de fazer: na sequência de um certo endurecimento do regime cubano, perante os seus opositores, que se traduziu em pesadas penas de prisão e em 3 condenações à morte, a Europa reagiu condicionando a futura ajuda financeira e política à abertura do regime. De imediato Cuba, pela voz do seu líder, ameaçou prescindir de qualquer ajuda e abriu um conflito diplomático de consequências ainda dificilmente previsíveis.

Tive, recentemente, oportunidade de escrever neste espaço que a situação política e social cubana é extremamente complexa e dificilmente compreensível para quem não a aborde segundo uma óptica suficientemente ampla quer do ponto de vista socio-cultural, quer do ponto de vista histórico.

O “socialismo” de Cuba não é hoje exportável para fora da ilha (como o comprova a patética imitação do ditador Venezuelano) e o perigo cubano, bem presente na década de 60 com o episódio dos mísseis soviéticos apontados ao seu poderoso vizinho é, hoje, uma fixação e um pretexto para justificar um confronto.

Um confronto que opõe sobretudo os cubanos residentes na ilha e defensores do regime castrista aos cubanos exilados nos Estados Unidos que detém um poder de influência notável sobre a Administração Bush.

Com efeito os cubanos no exílio condicionam muitas das decisões políticas do Estado da Flórida e ufanam-se, mesmo, de serem os principais responsáveis pela vitória eleitoral do actual Presidente americano.

Daí que estejam a reagir violentamente à política cautelosa dos Estados Unidos, no que respeita à imigração clandestina, mesmo quando são invocados motivos políticos, o que na prática traduz uma relativa normalização com a República de Fidel Castro e põe em crise o discurso oficial mais violento quanto à ausência de liberdade dos cubanos.

Ora é precisamente este comportamento que permite perceber melhor a hipocrisia das relações externas dos dois estados e consolida a convicção que os dois regimes políticos precisam um do outro para se justificar.

Por isso é importante o papel que a União Europeia queira e possa desempenhar nesta área do Mundo.

Talvez tivesse sido mais prudente, antes de ameaçar com sanções financeiras e represálias políticas, ir ao terreno verificar as condições concretas do exercício do regime político cubano e as suas limitações no quadro de um embargo económico, com consequências trágicas para o povo que de algum modo alimenta e sustenta a ditadura e as suas consequências mais perversas, como a pena de morte.

Mesmo agora que o ditador cubano aproveitou o 26 de Julho (que é sempre um momento de catarse e exaltação nacional sabiamente aproveitado por Fidel Castro) para zurzir na política europeia, não pode considerar-se que estejam fechadas todas as portas e eliminadas todas as oportunidades.

Sábia foi por isso a reacção da Comissão Europeia ao desvalorizar o conteúdo do discurso presidencial do último “20 de Julho” solicitando uma verdadeira “prova de vida” das intenções anunciadas.

O Iraque e a República de Cuba constituem, cada vez mais, dois exemplos onde a política externa da União Europeia se pode afirmar e consolidar.

E se já não existe qualquer dúvida do interesse da Europa em apoiar, no essencial, o comportamento americano no conflito do Iraque, também não se pode duvidar do interesse europeu em definir, em relação a Cuba, uma política própria que não tem necessariamente de coincidir com os “interesses visíveis” dos Estados Unidos.

EUROPA: DEZ PONTOS PARA A C.I.G.por G. d’Oliveira Martins

1. Que Constituição para a União Europeia? O debate sobre o futuro da União já se iniciou. Importa, antes do mais, tornar claro que a Conferência Intergovernamental (CIG) deverá encontrar soluções capazes de motivar os cidadãos europeus em nome de um projecto comum.

Há, pois, muito trabalho ainda a realizar, sobretudo se quisermos manter a coerência fundamental do anteprojecto elaborado pela Convenção. Os aperfeiçoamentos são necessários. Daí que a ideia de Constituição ou de Tratado Constitucional deva ficar associada, formal e substancialmente, à maior protecção dos cidadãos e ao respeito inequívoco da esfera própria dos Estados de Direito, que passarão a ficar integrados numa rede de natureza constitucional com poderes definidos e limitados, orientados para a defesa e salvaguarda dos interesses comuns europeus.
2. As duas soberanias. A UE baseia-se nas soberanias nacionais dos Estados membros, que livremente decidiram compartilhar uma soberania europeia, correspondente às competências comunitárias, definidas pela Constituição. Importa, por isso, impedir a extensão artificial e burocrática de competências à custa de poderes constitucionais dos Estados. A Constituição da União não se sobreporá às Constituições nacionais relativamente aos poderes soberanos nacionais, ao contrário do que por aí se diz. Uma coisa são as competências inerentes à soberania nacional, para as quais prevalecem as Constituições nacionais, outra são as competências próprias das União ou as exercidas em comum, para as quais não pode deixar de prevalecer a Constituição Europeia.
3. As duas legitimidades. Como União de Estados e de Povos, é essencial tornar claro para o cidadão europeu que os poderes comunitários, e em especial o poder legislativo, têm de resultar da convergência dessas duas legitimidades. Deve, por isso, adoptar-se o método senatorial, ou seja, o poder legislativo deve ser exercido pelo Parlamento Europeu, em representação dos Povos e dos cidadãos, e por uma Câmara dos Estados, onde estes estejam representados igualitariamente, à semelhança do que ocorre, por exemplo, na Confederação Helvética. Assim, cidadãos e Estados estarão adequadamente representados por duas legitimidades, que os tornem relevantes na vida europeia.
4. O princípio da subsidiariedade. Para que a esfera nacional ou local não seja atingida e para garantir uma acrescida competência de acompanhamento das questões comunitárias atribuída aos parlamentos nacionais, deve ainda preservar-se o princípio da subsidiariedade e o instrumento proposto pela Convenção, no sentido de prever um alerta parlamentar perante as iniciativas da Comissão que possam ferir a esfera de poderes das assembleias legislativas. Trata-se de um avanço com muito mais consequências do que à primeira vista possa parecer, uma vez que os parlamentos dos Estados membros vão ter de se reforçar técnica e politicamente para afirmarem as soberanias nacionais.
5. A necessária simplificação. Perante a necessidade de permitir aos cidadãos a legibilidade das decisões comunitárias, em especial no campo legislativo, os procedimentos deverão ser reduzidos em número, a co-decisão deve constituir-se na regra, e as fontes de direito deverão passar a ter designações que facilitem a sua compreensão por todos (leis-quadro em lugar de directivas, leis europeias em lugar dos regulamentos etc.). Nesse sentido, o ante-projecto de nova Constituição, saído da Convenção, apresenta-se como um passo positivo de clareza e transparência, que não poderá ser adulterado. Basta ler o texto para perceber o avanço significativo alcançado.
6. Cidadania europeia e Europa Social. A cidadania europeia reconhecida expressamente e reforçada pela integração da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais, com força obrigatória, no novo Tratado, permitirá uma melhor protecção dos europeus em todo o mundo, designadamente pelas missões diplomáticas de países da União. A personalidade jurídica da UE permitirá ainda a adesão à Convenção Europeia dos Direitos Humanos, a aplicar nas relações com os órgãos comunitários e relativamente às políticas comuns. Há, no entanto, muito pouca audácia no tocante à Europa social, à coordenação no governo económico e aos recursos próprios. E, se bem que se preveja a coesão económica, social e territorial e o pleno emprego entre os objectivos da União, a verdade é que o alargamento e o desenvolvimento europeu exigem mais meios e mais coordenação – sob pena de fracassarem.
7. O método comunitário. Importa preservar o equilíbrio de poderes e competências que permitiu o sucesso da União Europeia. Não deverá, por isso, haver dúvidas sobre quem detém o poder legislativo ou o poder executivo. A Comissão representa o interesse geral, o Conselho e a Comissão terão de completar-se, o Parlamento Europeu deverá cultivar, em nome dos cidadãos e dos Povos, ligações institucionais mais fortes com a legitimidade democrática e parlamentar dos Estados.
8. A maioria qualificada e o veto. Infelizmente, pouco se avançou no elenco de matérias a decidir por maioria qualificada. Com 25 ou 30 membros, o veto tornar-se-á gerador de vazios, em matérias essenciais, como a da paz e da segurança. A regra da unanimidade não nos favorece, antes podendo abrir caminho à lógica do directório. Por ironia, o defensores da unanimidade são, assim, os melhores aliados da lógica anti-democrática do domínio dos grandes… E se falta uma cláusula de segurança comum, à semelhança do existe na OTAN ou existiu na UEO, tudo se complica ainda mais, uma vez que não há instrumentos expeditos de defesa comum, até para reforçar uma parceria euro-atlântica entre iguais.
9. A Presidência do Conselho Europeu e a Comissão. O tema da distribuição de poder é fundamental, mas não é tudo. Vai ter de se encontrar um novo equilíbrio, que favoreça a estabilidade e a legitimidade. Fim das Presidências rotativas? É fundamental deixar claro que tem de haver um sinal inequívoco de que a igualdade entre os Estados não é uma palavra vã. Uma Comissão mais reduzida? Não se caia no erro de querer estabelecer no Tratado o número de comissários, para depois de 2009. Temos, sim, de evitar qualquer sentimento de perda para os cidadãos. E o princípio da lealdade cívica exigirá que todos saibam que não há cartas marcadas nas decisões comunitárias. Todos poderemos estar do lado vencedor ou do lado que perde… Essa a regra do jogo.
10. O Directório ou a União de Estados e Povos livres e soberanos? Vai haver agora muita demagogia e vão ser usadas mentiras ou meias verdades, em nome do populismo mais ou menos nacionalista. Eis porque um debate sério é fundamental. Vai haver novidades na CIG. Vai ter de haver alterações. Só serão para melhor, porém, se não caírem na cegueira de querer continuar a pensar com base numa soberania que já não existe. Caso contrário a lógica imobilista só terá uma consequência – reforçar os egoísmos, tornar irrelevantes países como Portugal e consolidar um qualquer Directório, a funcionar na velha lógica diplomática… Quem avisa…

Semanário – Desporto 141por Manuel Lopo de Carvalho

1 – O Sporting atravessou um período delicado da sua vida neste final de época futebolística, dado que por um lado teve de enfrentar um processo sucessório ao nível da sua SAD e por outro viu-se na necessidade de reforçar a sua equipa de futebol que tinha entrado num declínio inquestionável.

A maneira como conseguiu lidar com estas questões saldou-se por um resultado francamente positivo. A forma serena, elevada e profissional como se processou a saída de Ribeiro Teles e a entrada de José Eduardo Bettencourt abonam muito a favor da organização instalada no Sporting e da qualidade dos dirigentes envolvidos.
O mandato de Ribeiro Teles caracterizou-se por um rigor na gestão e por um anti vedetismo que muito contrastou, para melhor, com o do seu antecessor. Os resultados obtidos foram excelentes. Um título de campeão, uma Taça de Portugal e uma Super-Taça, falam por si.
A entrada de Bettencourt tem o grande mérito de manter a linha de rumo que vem de trás e, como os primeiros indícios apontam, vai ser continuada a política de rigor cujos frutos começam a estar à vista.
O lucro apontado para o próximo exercício é da ordem de 12 milhões de euros sendo um desafio muito difícil para a gestão. A ser conseguido constituirá a consagração de uma gestão de rigor que devia servir de exemplo para outros que muito falam e gritam mas pouco fazem.
A forma como a equipa foi reforçada também é digna de nota. Primeiro trataram da venda de Ricardo Quaresma para realizar meios financeiros e depois aplicaram esses meios disponíveis de forma criteriosa, reforçando a equipa em sectores que se encontravam altamente carenciados.
É um facto que tudo isto foi feito socorrendo-se do brilhante “procurement” realizado pelo Benfica mas é bom que fique claro que as contratações só foram realizadas depois do Benfica ter desistido. Ou seja o Sporting não deu azo a qualquer desculpa de mau pagador por parte do Benfica. Limitou-se a comprar o que o seu rival não conseguiu fazer.
Entretanto e apesar destas contratações conseguiram baixar os custos operacionais do clube de forma significativa.
Para começo de mandato é caso para dizer que Bettencourt entra a matar.

2 – Entretanto do outro lado da segunda circular reina o total descontrolo emocional e o pânico ansioso.
Por um lado a equipa não foi reforçada, nem sequer retocada.
Decorreu mais um ano e alguns dos seus jogadores fulcrais, que já não eram novos, ficaram obviamente mais velhos e lentos. Zahovic, Helder e Argel são disso os exemplos mais flagrantes.
Por outro lado o sorteio da Liga dos Campeões não podia ter sido pior. Nem mesmo o Celta, apesar das sete más recordações, era tão desfavorável como a Lázio de Roma. O facto de esta equipa, há pouco mais de três meses, ter sido goleada e afastada da final da Taça UEFA pelo F.C.Porto, agravado com o conhecimento público da existência de problemas com os seus principais jogadores com repercussões negativas no seu rendimento, torna inevitável as comparações. Uma eliminação será seguramente muito mal recebida pelos sócios.
Por outro lado ainda, o sorteio da Super-Liga também não foi famoso devendo o Benfica defrontar o Boavista, Guimarães e F.C.Porto até à quinta jornada.
Sabendo-se, como se sabe, a influência que os resultados desportivos normalmente têm nos actos eleitorais do Benfica, percebe-se bem o pânico e a desorientação directiva.
Só isso, aliás, justifica a ressurreição do desaparecido e saudoso porta-voz João Malheiro que publicamente negou por duas vezes a evidência, ou seja que José Veiga tem praticamente o exclusivo dos jogadores do Benfica como resultado evidente de uma política da sua SAD. Ficou sem se perceber porque é que toda a gente sabe disto excepto, pelos vistos, a própria SAD e o seu porta-voz.
O aproximar do acto eleitoral e o medo de perder está, pois, a diminuir o discernimento dos dirigentes, não sendo, definitivamente, bom conselheiro.
Para enfrentar os próximos dois meses com calma e paz de espírito, sugere-se aos dirigentes benfiquistas que promovam a entrada imediata dos famosos 500.000 sócios que prometeram para este Verão. Assim ficará garantido que assegurarão uma sólida maioria de sócios atentos, veneradores e obrigados no próximo acto eleitoral, deixando consequentemente de ter preocupações e devolvendo alguma tranquilidade ao clube.

Autoridade da Concorrência aprova aquisição da Enatur

A Autoridade da Concorrência aprovou a aquisição de 49% do capital da Enatur pelo grupo Pestana.

“Não nos opomos à concentração, uma vez que a mesma não é susceptível de criar ou reforçar uma posição dominante da qual possam resultar entraves significativos à concorrência” afirma a Autoridade da Concorrência.
O consórcio que venceu o concurso para a privatização da Enatur, e que ofereceu 17,5 milhões de euros por 49% do capital social da empresa, é liderado pelo grupo Pestana com 59,8% do capital, e integra a Caixa Geral de Depósitos, com uma participação de 25%, a Fundação Oriente, com 15%, e as Viagens Abreu e a Portimar, com 0,1% cada.
O contrato a assinar com o Estado abrange a participação no capital da Enatur e a gestão das Pousadas de Portugal.
A Enatur tem 44 pousadas espalhadas por todo o país, 18 das quais classificadas como históricas.