2023/06/01

Uma nova Guerra-friapor Rui Teixeira Santos

Ontem, a escalada de exibição bélica prosseguia no Mar Negro, com movimentações de navios militares russos e americanos. Não faltava quem lembrasse que estávamos a pagar os excessos do Ocidente.

Ontem, a escalada de exibição bélica prosseguia no Mar Negro, com movimentações de navios militares russos e americanos. Não faltava quem lembrasse que estávamos a pagar os excessos do Ocidente. Havia muitos a lembrar o Kosovo, mostrando que a reacção russa era o contraponto dessa acção militar do Ocidente. Havia outros a lembrar também a Tchechénia e o paradoxo de Moscovo, que agora se posiciona com tanta veemência a favor das províncias separatistas, quando agiu com enorme brutalidade quando o assunto era o desmembramento da Tchechénia do território russo.
No caso do paralelo com a situação da independência do Kosovo, só a vontade de estar contra o Ocidente pode justificar a confusão. Juridicamente, o reconhecimento da independência do Kosovo pelos governos ocidentais foi uma excepção em relação às leis que protegem a integridade territorial de um país, aceite pelo direito internacional e baseada no facto de estar a ser cometido um genocídio. Belgrado, antes da luta pela independência dos kosovares, havia ferido brutalmente os direitos da minoria étnica albanesa. E, somente em consequência desta situação é que a comunidade internacional teria optado por intervir e, finalmente, reconhecer a independência do Kosovo.
A intensa discriminação por parte de um Estado, por um longo espaço de tempo, é uma das justificações que, excepcionalmente, permitem a uma minoria lutar pela separação territorial (uma situação com paralelo na Turquia, com os kurdos, mas, também, em meu entender, em Portugal, se continuarmos a discriminar, orçamentalmente, a Região Autónoma da Madeira – fica o aviso feito ao Governo e ao Presidente da República!). No caso actual da Ossétia do Sul e da Abcássia não ocorre tal discriminação por parte do governo da Geórgia. Ou confirmamos esta doutrina e conseguimos conservar a integridade territorial de países europeus como a Espanha, Itália e Reino Unido, ou isto é uma caixa de Pandora, sem regras.

A questão alemã
A análise de que a reacção russa é legítima para o equilíbrio internacional e, ainda por cima, responde ao Kosovo, é, pois, muito elementar e parcial e não tem cobertura no quadro do Direito Internacional.
O problema da crise do Direito Internacional começa muito antes do Kosovo, que já é uma tentativa para estabilizar os balcãs e instalar uma base americana, longe da inconstância política italiana e para segurar o leste mediterrânico.
O problema começou, como começa sempre: pela Alemanha e para ambição hegemónica prussiana. Um velho problema que a Europa e o mundo nunca resolveram e que pagam da pior maneira.
Tudo começou quando, unilateralmente e contra toda a CEE, em 1991, o chanceler Helmut Khol comunicou ao Conselho Europeu que, no dia seguinte, ia ser declarada a independência da Croácia (aliás, o Presidente Cavaco Silva, então primeiro-ministro, estava presente e poderá, seguramente, testemunhar). Tudo o resto, incluindo o regresso da guerra à Europa, deriva daí. E, até sabemos que do resto faz também parte o projecto europeu em algumas das suas componentes, que podem ser mais perigosas.
Mas, sendo o problema central a Alemanha, importa ter uma abordagem realista. Há épocas de águia e épocas de falcão. No estado actual da crise do Direito Internacional e não tendo a Europa e o Ocidente meios para travar a Rússia – e isso é fundamental
por causa dos Estados Bálticos e da Polónia – a resposta passa necessariamente pelos seguintes passos:
1. Deixar claro à Rússia que discordamos da violação da integridade territorial da Geórgia;
2. A Rússia tem que ser tratada na esfera internacional como aquilo que é: um país não civilizado. E temos que deixar claro que as três provocações russas (a saber, o desmantelamento da democracia interna na Rússia, o assassinato em Londres de um agente dos serviços secretos e a invasão da Geórgia) são entendidas no mundo ocidental como manifestações da falta de civilidade da Rússia e da sua oligarquia corrupta dominante (típica de um regime patrimonial assente na extracção de petróleo);
3. Aprofundar a integração económica e política na União Europeia, pois só dessa maneira poderemos fazer face à ameaça energética, politica e militar russa. Recordemos que a Rússia tem, inteligentemente, vindo a negociar individualmente com cada estado europeu (incluindo Portugal) tratados de cedência de energia e posições de capital que tornaram países como a Alemanha dependentes energeticamente, em 40%, da Rússia. Ora isto é uma fragilidade na segurança europeia, agora que é mais claro a dúvida que eu nunca tive. Que a Rússia é a barbárie e que a sua oligarquia dominante tem, sempre teve, loucos sonhos imperiais.
Posso, hoje, ser o único no planeta a escrever isso. Mas, Churchill também teve razão antes de tempo e se o tivéssemos ouvido teríamos evitado a desgraça que se seguiu à II Grande Guerra.

Nações civilizadas
É bom que fique claro: as nações civilizadas são aquelas que se pautam, na sua actuação, pelo respeito do Direito. Sempre que a ordem jurídica internacional é colocada em causa, evidentemente, devemos ficar alarmados.
O que distingue a Rússia da civilizada Europa é, exactamente, o facto de não respeitar os direitos políticos dos seus cidadãos, coisa que não se verifica na Europa, nem o Direito Internacional, na defesa dos seus interesses nacionais.
É essa a fronteira: a fronteira do Direito.
E sabemos bem que essa fronteira é condição para o desenvolvimento sustentado e para a Paz.
Por outro lado, temos de abandonar a lógica dos equilíbrios bipolares. A história não se repete e, embora a teoria dos contrapesos seja adequada na ordem interna, sempre se mostrou perigosa e insuficiente na ordem internacional.
O actual peso da Rússia no contexto político e económico mundial e a falta de um plano ideológico nesse sentido, tornaram totalmente anacrónicas as geometrias politicas polarizadas.
Os Estados têm interesses e os interesses nacionais estão acima do resto. Isto percebe-se, dentro dos limites do Direito Internacional, que necessariamente é conservador, no sentido que mantém o “status quo”.
Do ponto de vista académico há pois que abrir a reflexão para este mundo multipolar sem potência dominante.
Já para nós europeus, do ponto de vista estratégico e em termos de segurança, importa estarmos atentos à Rússia. Nunca nos esqueçamos que Hitler só invadiu a França porque o governo da Frente Popular – PS/PCF – teve uma politica económica errada, mas, sobretudo, porque a França fragilizou as suas defesas e reduziu, substancialmente, a modernização das suas Forças Armadas – curiosamente, um programa implementado pelo cauteloso e sempre prudente (era como o José Sócrates e a Ferreira Leite, ou seja, estava preocupado com o equilíbrio orçamental! ) General Pétin, que acabaria por ser o maior traidor da França e sobretudo por colaborar com as forças de ocupação.
Importa dizer à Europa, neste momento, para não desarmar e, sobretudo, para ser clara na defesa do Direito Internacional, ainda que, do ponto de vista prático, a Rússia nunca mais retire da Ossétia do Sul nem da Abcássia e os quatro milhões de georgianos estarão condenados a servir de carne para canhão (apesar de tudo sempre são
menos que os mortos da II Grande Guerra!!!).
Sou o primeiro a reconhecer fragilidades aos Impérios europeus, as barbaridades, mesmo crimes de guerra, cometidos pelo mundo ao longo da História. Sou o primeiro a reconhecer que, muitas vezes, olhamos para os interesses nacionais, antes de olharemos para as pessoas concretas, para os outros países e povos.
Mas a Europa é hoje a zona do Globo onde as pessoas têm maior liberdade e onde, apesar das deficiências conhecidas em matéria de direitos humanos, nós gostamos de viver.

Última nota
Uma última nota: há situações na política internacional em que o Direito não existe e não se consolida. Há situações que, depois, ficam para sempre ou que se arrastam sem respeito pelo Direito. É o caso da Coreia do Norte e da Coreia do Sul, dois estados que existem e, contudo, violam as resoluções da ONU. Ou, anterior a isso, o nosso caso de Olivença, em que por direito a vila é nossa mas, há centenas de anos, que se mantém ocupada por Espanha, sem que isso perturbe a paz ibérica.|

Começa a ser óbvio

Começa a ser óbvio que, apesar da conjuntura económica e da recessão que aí vêm, o eng. Sócrates vai mesmo conseguir renovar a sua maioria absoluta. Ferreira Leite perdeu o estado de graça, dentro e fora do partido e, portanto, é neste momento um problema maior.
É certo que esta estratégia pode interessar ao Presidente da República a quem é fiel. Mas não interessa ao eleitorado do PSD nem à democracia portuguesa. O PSD é hoje um partido balcanizado, onde se confundem ambições sem conteúdo ideológico e onde não parece haver sequer um programa político que não sejam “poder”.
E, obviamente, quando assim é, nem Poder há. Preocupado com isso, Marcelo Rebelo de Sousa cometeu um erro que nem parece seu: propôs um pacto. Em vez de um pacto de ideias e de projecto para Portugal, um pacto de silêncio até às legislativas. É evidente que todos, até Paula Teixeira da Cruz tida por apoiante de Ferreira Leite, rejeitaram.
Não havendo estratégia, sobra a táctica. E os amigos de Ferreira Leite, a partir da S. Caetano já preparam o assalto àquilo que resta. Por isso querem as questões autárquicas discutidas até ao fim do ano, para evitarem veleidades da oposição. Só que Ferreira Leite se esquece que com 2.500 assinaturas – cada vez mais fáceis de arranjar em face da ausência da direcção do partido – é possível convocar um congresso extraordinário que, sem ser electivo, revogue todas as decisões da direcção do Conselho Nacional. E Ferreira Leite, para não morrer com ferro – como matou antes com ferro – é bom que pondere isso e, sobretudo, que, em matéria autárquica deixe o sectarismo barrosista que tanto mal fez ao PSD. O PSD quer autarcas e candidatos que ganhem eleições e não os amigos da dra. Ferreira Leite.
Finalmente, o dr Alberto João Jardim. É verdade que tem pouco a perder, mas começa a ser claro que ao disparar sobre toda a gente, Alberto João jardim quer mais que afastar Ferreira Leite. Pode querer deixar a Madeira e avançar para a liderança do PSD nacional, abandonando assim a ambição de ficar na história regional como o líder da autonomia.
Fica aqui a nota: há que contar sempre com o dr. Alberto João jardim se houver eleições no PSD.|

O calor de verão ou a criminalidade violenta

O presidente da Republica não deveria pronunciar-se sobre a criminalidade violenta. Caladas deveriam também estar as vozes que querem alterar o regime legal da prisão preventiva.
Estas questões não podem ser abordados em face de epifenómenos, amplificados por alguma comunicação social, seguramente manipulada por poderes fácticos, a que poderá não ser alheia a próxima escolha do futuro secretário-geral de Segurança Interna, cargo criado pela nova lei de Segurança Interna, promulgada, esta semana, pelo Presidente da República.
Não sejamos ingénuos: há uma deriva totalitária no país (assunto cujo enquadramento histórico e ideológico tratei a semana passada), na qual alinha sempre o senhor Magalhães (o tal dos chips e das listas informáticas, das câmaras de videovigilância e do big brother – é boa pessoa, mas ficou-lhe, do PCP, o velho tique de controleiro – que tem na agenda voltar a poder usar “discricionariamente” – permitindo os abusos inadmissíveis a que assistimos nas ultimas décadas sobretudo sobre os mais pobres – da prisão preventiva, para onde foram atirados dezenas de inocentes e que serviu, tantas vezes, de “condenação sem sentença” de alegados criminosos, cujos os crimes as policias nunca provaram.
Mexer, agora outra vez, na lei é voltar atrás. Mais vale alguns criminosos na rua que um, um só inocente na cadeia – é um imperativo ético, mas, sobretudo, é a tradição cristã e liberal do Direito que sempre defendi
Ainda por cima, não nos sossega a evolução do Regime nem os abusos da administração – desde a ASAE à CMVM, do Fisco às polícias (ainda, agora, assistimos ao inacreditável desfecho do caso Maddie) e do que mais por aí virá.
Já só falta, agora, para cumulo, entregar o chefe da Segurança Interna a uma dessas “facções da inteligenzia” que lutam pela influencia no governo – normalmente ligadas a entidades pró ou contra a integração ibérica – e, depois, dar-lhes maiores poderes na prisão preventiva – por suspeitas de crimes menores – para se institucionalizar um instrumento judicial que poderá manipular a política nacional – como vimos antes nos casos do sangue contaminado/hemofílicos, da Universidade Moderna, da Pedofilia/Casa Pia, do Freeport, etc. – todos, aparentemente, casos à medida da politica interna.
É altura de passarmos a ser um país civilizado e dos nossos políticos deixarem de entender o exercício do Poder como “business as usual”, o que significa negócios para os amigos e acção politica reduzida à conservação do seu poder.

A reacção da Política
Como enquadramento deste ambiente institucional temos, obviamente, a onda de criminalidade violenta de Agosto. Não vale a pena nega-la. Mas, será ela, numa horizonte de médio prazo, algo extraordinário?
Extraordinárias têm sido as declarações de alguns políticos e académicos. Não estudaram os números, não preparam os dossiês… Foram, apenas, ao encontro da onda mediática, acriticamente, e sem perceberem que podem estar a servir estratégias, essas sim, eventualmente criminosas e bem pensadas, de controlo do poder político e económico em Portugal.
O alegado aumento da criminalidade violenta levou até o CDS-PP a pedir uma reunião extraordinária da Comissão Permanente da Assembleia da República, mas o requerimento dos democratas-cristãos foi inviabilizado pelo PS, que garante, porém, estar disponível para discutir o tema dentro do “calendário estabelecido pelo Parlamento”. O populismo no seu melhor, sempre com as consequências piores…
Finalmente, o Presidente da República. Cavaco Silva entrou na competição mediática e considerou “uma coisa muito séria” a “onda de assaltos e crimes violentos” que se tem verificado no país, sublinhando a necessidade de “uma concentração de meios e esforços e uma estratégia adequada” para o seu combate e para que seja reforçada a confiança dos cidadãos nas polícias. Cavaco Silva, defendendo que cabe ao Estado garantir a segurança de pessoas e bens.
Interrogado se considerava que a estratégia que está a ser seguida não é a adequada, o chefe de Estado admitiu que “a onda de crimes aumentou significativamente” e que “não há dias sem assaltos”, o que poderá implicar que haja uma “adaptação da estratégia”. Cavaco Silva falava aos jornalistas no final da cerimónia de inauguração do Unidade de Cuidados Continuados de Odemira. Obviamente, o presidente falou sem estudar o assunto.
A pressão é tal que, ontem mesmo, o próprio governo – pela voz de Pedro Silva Pereira, no final do Conselho de Ministros – acusado de nada fazer e de estar em silencio, teve necessidade de vir expressar a sua preocupação e garantir que estava a actuar no terreno.

Violência ondulatória
Mas, vamos aos factos, para percebermos que este alarmismo é montado por alguém e serve interesses que seguramente não são os da segurança, nem tão pouco os da serenidade das forças policiais (falta ver se a nomeação do novo chefe da PSP, Oliveira Pereira, não é também uma das causas desta súbita agitação!)
Tenhamos noção: esta onda de criminalidade violenta que alarma o País é cíclica. Não é a primeira vez que acontece e, no médio prazo, não é sequer anormal, ao contrário do que disse publicamente o Presidente da Republica.
A criminalidade violenta aumentou cerca de dez por cento nos primeiros seis meses deste ano relativamente ao período homólogo de 2007, de acordo com o responsável pelo Gabinete Coordenador de Segurança.
Segundo o tenente-general Leonel Carvalho, a criminalidade violenta aumentou “ligeiramente acima dos dez por cento” nos primeiros seis meses deste ano, enquanto a criminalidade geral aumentou “ligeiramente abaixo dos dez por cento” no mesmo período face ao período homólogo de 2007. Referiu, porém, que a criminalidade violenta representa apenas “seis a seis e meio por cento do total da criminalidade”, ou seja “uns poucos milhares de crimes”. É portanto um episódio de Verão.
Leonel de Carvalho acrescentou, ainda, que o aumento da criminalidade violenta se reporta, sobretudo, a assaltos a bancos, a carros e a postos de combustível.

Muito longe do alarme dos jornais
Portanto, estamos perfeitamente dentro de números razoáveis, dentro daquilo que chamarei “movimento estatístico ondulatório”, que não justifica nenhum alarme e muito menos a mudança da legislação. Eventualmente, justificará novas abordagens na investigação policial, mas isso é uma questão técnica e não política. Aliás o próprio responsável pelo gabinete coordenador disse isso mesmo e o Procurador-Geral da República (PGR), Pinto Monteiro, emitiu ontem uma nota com “sugestões para melhor combater a criminalidade especialmente violenta”, o que é normal em face do alarmismo criado por certa comunicação social. (É curioso que é sempre a mesma, pelo que a os “poderes fácticos” que a controlam começam a ficar demasiado identificados).
Portanto, estatisticamente, esta flutuação é inexpressiva e, ao contrario do alarme criado, o crime violento não veio para ficar.

Uma advertência
Mas, uma advertência. Estas coisas da comunicação e da amplificação alarmista nunca é neutra. E, portanto, é muito provável que, nas próximas semanas, o crime violento aumente significativamente, que se assista a coisas nunca vistas, para depois voltarmos à normalidade.
Portanto: o alarme de Agosto vai ter vítimas e consequências, temporárias é certo, mas graves para as vítimas e para o País – nomeadamente para o turismo. E, aqui, o Estado de Direito nada deve poder fazer, para alem de uma acção pronta e eficiente na prevenção, sempre dentro da legalidade.
Prefiro, também, neste particular, que sejam cometidos alguns abusos por parte da comunicação social e que não exista qualquer punição por isso, do que abrir a porta à censura, à auto-censura ou à perseguição de jornalistas e à limitação da liberdade de imprensa.
Os actos ficam com quem os pratica e a prazo tudo se paga… Na comunicação também é assim.|

A sociedade civil lusófonapor Maria Valentina Machado

Todas estas questões constituem importantes pontos de partida para o estabelecimento de um programa de acção estabelecendo prioridades que seria óptimo que a CPLP, os Estados Membros e respectivas sociedades civis, tivessem em consideração

Aquando da última Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da CPLP, reunida em Lisboa, Jorge Sampaio, na comunicação proferida, afirmou que a sociedade civil lusófona vem mostrando o desejo de uma maior participação na vida da Comunidade. Tal desejo é por si só francamente positivo mas se não obtiver um amplo apoio por parte da CPLP, acabará por se estiolar e, consequentemente, representará mais uma frustração lusófona.
A Presidência Portuguesa que afirmou que tudo fará para dinamizar a Comunidade, mas que precisa da colaboração de todos porque a tarefa é ciclópica, tem uma excelente ocasião para demonstrar, inequivocamente, quanto é imprescindível, para tal dinamização, a sociedade civil lusófona. Poderá ter imensa dificuldade em saber como proceder mas, do meu ponto de vista, deverá começar pela divulgação das actividades, reuniões e decisões da CPLP a todo o povo lusófono e estar aberto às suas sugestões. Para tal, seria muito vantajoso que em cada Estado Membro houvesse um Fórum da Sociedade Civil que veiculasse à CPLP as respectivas sugestões e organizasse, em cada área de acção, a respectiva colaboração. E em determinadas áreas é mais fácil essa participação do que noutras, como por exemplo no âmbito da saúde, do apoio infantil, na luta contra a fome e contra a pobreza que tanto afligem um tão elevado número de lusófonos. Estas situações como aliás outras, igualmente importantes, passam desapercebidas do comum dos lusófonos porque não divulgadas, pelo menos no que toca a Portugal, onde há maior cuidado em revelar noticias de povos da UE do que dos Povos lusófonos que falam a língua comum e que por razões históricas e culturais nos estão tão próximos.
Esta preocupação da divulgação em cada País do que se passa nos outros, de positivo e de negativo, seria já uma importante contribuição da Presidência Portuguesa para levar a cabo a tal dinamização da CPLP. Basta, a título de exemplo, recordar como os portugueses reagiram aquando dos massacres de Dili e como se viveu todo o processo de libertação e independência de Timor. Ninguém ama o que desconhece! E não apenas dos Estados Membros mas da própria CPLP. Em Portugal e certamente também nos outros países, há uma ignorância total sobre a CPLP, suas políticas, suas actividades suas decisões e seus objectivos.
Aliás, estão decorridos mais de 30 dias sobre a realização da Cimeira e apenas se teve um pálido conhecimento do que lá foi tratado, que a Declaração de Lisboa se limitou a enunciar e a desenvolver em cerca de uma vintena de páginas e sobre a mesma a comunicação social portuguesa apenas referiu meros tópicos. É assim que se quer dinamizar?
Tenho escrito várias vezes que a televisão estatal deveria incluir nos seus noticiários relevo aos acontecimentos lusófonos onde quer que aconteçam e à CPLP. Tenho igualmente sugerido que, quer na rádio quer na televisão, se criasse um programa dedicado ao espaço lusófono, seus aspectos económicos, sociais, culturais, de modo a que todos nos conheçamos melhor e, consequentemente, nos sintamos mais Comunidade Lusófona.
Estão de facto decorridos 30 dias sobre a referida Cimeira e desconhece-se por completo uma agenda concreta e objectiva a cumprir pela Presidência Portuguesa. É assim que se quer dinamizar?
Comparar esta inércia com a entusiasmante agenda de há um ano em que Portugal assumiu a Presidência da UE e da qual tivemos um conhecimento diário, é frustrante para aqueles que se proclamam da sua Lusofonia. Há um ano a Presidência Portuguesa da UE foi um sucesso e alcançou, praticamente, todos os seus objectivos constantes da respectiva agenda; a Presidência Portuguesa da CPLP não pode ser um fracasso e, pelo contrário, tem de terminar com sucesso, tal como aconteceu aquando a da UE, alcançando igualmente todos os seus objectivos. Há um ano, conhecia-se perfeitamente a agenda e as respectivas prioridades; hoje praticamente ignora-se tudo. É assim que Portugal faz tudo para dinamizar a CPLP?
É urgente escalpelizar a Declaração de Lisboa e estabelecer prioridades em agenda, divulga-las e, então, solicitar a colaboração de todos os Estados Membros, respectivos Governos e Sociedade Civil no sentido de se alcançarem as metas e objectivos. Se assim não for, falharemos e não fomos capazes de concretizar as palavras do actual Presidente da CPLP.
Do meu ponto de vista é mais que tempo de se chegar ao fim do estudo de que foi encarregue Portugal, Angola e Moçambique com vista à criação formal do Parlamento Lusófono, desejo que emanou em 2006 do Fórum Parlamentar da Língua Portuguesa e que há muito se vem considerando imprescindível como concretização da representação dos povos na CPLP. Aliás, não se compreende que haja o Parlamento Europeu e o Parlamento Africano e não exista o Parlamento Lusófono.
Porém, há que ter cuidado em fomentar em todos e cada um dos Estados Membros a importância de tal estrutura representativa, para não acontecer o que em Portugal se passa com o Parlamento Europeu que se traduz num escandaloso divórcio entre os eleitores e os eleitos.
Uma outra situação que é bem reveladora do desejo de participação da sociedade civil na vida da CPLP é a Declaração das Mulheres Lusófonas, expendida aquando da sua I Cimeira realizada em Lisboa e também quase nada divulgada
Da sua Declaração Final, ressalta esse desejo de participação activa e mobilizadora imanente de algumas das respectivas conclusões, decisões e propostas, com particular realce para as seguintes: reforçar o diálogo e o trabalho em rede das Mulheres da Lusofonia, através das respectivas organizações de mulheres de forma a estabelecer e estreitar laços de amizade e congregando esforços para a continua e persistente promoção da igualdade de Homens e Mulheres, respeitando as respectivas diferenças, perseguindo os objectivos comuns que promovam um desenvolvimento sustentado para todos, promovendo a eliminação de toda e qualquer forma de discriminação de modo que todos possam viver plenamente a sua cidadania; importância do empreendedorismo feminino bem como da formação e diversificação de competências profissionais, educação formal e não formal, conciliação entre a vida pessoal, familiar e profissional; concertação internacional para a promoção do comércio justo e do consumo ético, defesa do ambiente. Na área de saúde, chamaram a atenção para a saúde sexual e reprodutiva com particular ênfase para as doenças sexualmente transmissíveis, a necessidade de uma séria promoção do planeamento familiar e da educação sexual e para os afectos, do combate a doenças pandémicas como a sida, a tuberculose e a malária.
Todas estas questões constituem importantes pontos de partida para o estabelecimento de um programa de acção estabelecendo prioridades que seria óptimo que a CPLP, os Estados Membros e respectivas sociedades civis, tivessem em consideração.
E como se desconhece qual a agenda e respectivas prioridades da Presidência Portuguesa da CPLP, lanço o desafio que, terminada a época estival, as mesmas sejam estabelecidas, se é que ainda o não foram, e sejam devidamente divulgadas entre os lusófonos com vista à promoção de uma participação eficaz.
Só assim a Presidência Portuguesa poderá, de facto, dinamizar e fortalecer a Comunidade Lusófona e considerar que cumpriu a sua missão. Caso contrário prestará um mau serviço à CPLP e sobretudo à Lusofonia.|
Docente a ULHT

Terá Cavaco Silva um projecto pessoal de poder?por Rui Teixeira Santos

O problema não é a dra. Manuela Ferreira Leite estar calada. Ela tem todo o direito a gerir os seus “timings” e os seus silêncios.

O problema não é a dra. Manuela Ferreira Leite estar calada. Ela tem todo o direito a gerir os seus “timings” e os seus silêncios. Mesmo que as férias sejam exageradas, de Julho a 7 de Setembro (data da Universidade de Verão), fazendo lembrar as “férias grandes” escolares – mesmo assim muito maiores que as férias judiciais, as férias parlamentares ou as férias de qualquer trabalhador por conta de outrem -, a questão é com a senhora.
O nosso problema é que tememos, para não dizer que temos a certeza, que quando a senhora falar, ela não vai dizer nada de relevante. O problema é que a senhora não tem nada para dizer.
É a constatação desta realidade que começa a criar o maior incómodo dentro do PSD, até porque, na actual conjuntura, parece evidente que a falta de oposição enclausura o sistema político.
Neste contexto, e, ainda que não tenha nenhuma ideia para o País, a dra Ferreira Leite, aos setenta anos, certamente não assumiria a maçada de dar cabo do PSD por conta própria, ou porque se acha com capacidade para ser primeira-ministra, sobretudo, depois do seu discutível desempenho nas Finanças. Em boa verdade, nunca ninguém a viu como tal, senão como “protegida de Cavaco”, até que o confronto com Santana Lopes, necessário para o lançamento da candidatura presidencial de Cavaco Silva, a transformou numa vedeta à dimensão nacional e primo-ministeriável.
Neste contexto, enganam-se todos aqueles que julgam que Ferreira Leite tem agenda própria, quer o poder e quer chegar a primeira-ministra de Portugal.
Não. Como desde cedo se viu, Manuela Ferreira Leite é fiel ao Presidente da República e age em consonância com ele. Foi nos seus governos e continua a sê-lo, agora, sem nenhuma autonomia estratégica ou opinião pessoal. E, se chegar a primeira-ministra, sê-lo-á, como antes também foi ministra das Finanças ou da Educação, chefe de gabinete ou secretária do Orçamento.

A oposição interna para subsistir tem que provocar directas
Ferreira Leite tinha uma incumbência. Conquistar o PSD, para que o presidente tivesse um instrumento para obrigar ao Bloco Central, à grande coligação – necessária para enfrentar a crise e reformar o Estado, sem mexer em nenhuma das vacas sagradas do Regime. Mas, sobretudo, porque sentindo a fragilidade do primeiro-ministro à esquerda, uma tensão bipolarizadora animada de Belém facilmente retiraria a maioria absoluta ao PS e abriria o caminho à coligação central, onde o poder presidencial se amplia.
E, a resposta está dada: Ferreira Leite nunca se irá embora, nunca antecipará directas ou congressos, nunca correrá o risco de perder o conquistado e vai fazer a lista de deputados e escolher os candidatos autárquicos, que sirvam o projecto presidencial. Ponto final.
Ou seja, cerca de 60% do partido, o PSD que não votou em Ferreira Leite, está fora e vai ficar fora, seja a tendência de Passos Coelho, ou qualquer outra organizada ou que se venha a organizar dentro do partido.
O entendimento desta situação, obviamente, vai alterar a estratégia que alguns vinham seguindo até agora: em primeiro lugar, vai começar a contestação interna aberta à liderança de Ferreira Leite, já que o ataque à agenda presidencial não é possível, por agora.
A sua incapacidade para responder à gravidade da situação económica, o facto de estar de férias grandes e nem ter encontrado resposta à operação de propaganda – aliás, brilhante – encenada pelo primeiro-ministro com os 133 mil empregos da legislatura, oportunamente divulgados para ofuscar o drama de, pela primeira vez, termos desemprego a crescer no Verão – são temas suficientes para o arranque dos ataques. Nem Pedro Passos Coelho, nem a grande maioria do actual grupo parlamentar, têm grande coisa a perder, assumindo publicamente a divergência que, naturalmente, vai crescer substancialmente com o debate do Orçamento do Estado para 2009, a partir de Outubro.
Será essa contestação suficientemente desgastante para obrigar Ferreira Leite a atirar a toalha ao chão e ir contar votos, como fez Luís Filipe Menezes?
Estou certo que não será, pelo simples facto que Ferreira Leite não é a incumbente, mas apenas a criatura e que, portanto, o ruído e a contestação não tocam o criador.
Ferreira Leite aguentará, estoicamente, como sempre – essa, aliás, é uma das características das “protegidas de Cavaco” (fidelidade é isso mesmo) e vale a pena fazer a homenagem a Leonor Beleza, que estoicamente resistiu durante mais de uma década a um processo onde o óbvio destinatário era o chefe, Cavaco Silva.
Ferreira Leite nada terá de seu para jogar também e, ao contrário de Leonor Beleza ou de Isabel Mota ou de Teresa Patrício Gouveia, não ficará à espera da Fundação Champalimaud, da Fundação Gulbenkian ou da Fundação de Serralves. Já tem pelo menos duas ou três pensões de reforma (de política, do Banco de Portugal, etc.) e não é isso que a move (façamos-lhe justiça).

Questões fracturantes
Portanto, em resumo, Ferreira Leite irá em qualquer circunstância tudo fazer para chegar aos votos e fazer o próximo grupo parlamentar (misto da cavaquismo e barrosismo) e a oposição interna será totalmente banida.
A única maneira de forçar Ferreira Leite a ir a votos é com a circulação de assinaturas e a convocação de um congresso extraordinário, que delibere directas antecipadas.
Há quem defenda que Ferreira Leite vai a votos e perde com Sócrates, sendo depois corrida. Ora, esse pode ser um erro fatal para os 60% dos militantes que não votaram em Ferreira Leite. Pelo simples facto de uma qualquer votação lhe permitir, primeiro, fazer Bloco Central com o PS e, segundo, escolher a bancada parlamentar e, portanto, determinar o PSD para a próxima legislatura. E, nesse contexto, é bem provável que a ruptura já não seja possível dentro do partido, mas tenha que ser pensada a refundação do centro-direita fora do PSD.
E, esta questão é central, até porque, seguindo a lógica alarmista de Belém e o dito de Adelino Maltez, que o intervencionismo presidencial é moral, ou seja, que os vetos presidenciais, nomeadamente este sobre o novo regime jurídico do divórcio, reflectem não uma inflexão estratégica do Presidente – colocando em causa a coabitação -, mas a afirmação de uma concepção da vida e do mundo diversa da do governo e da maioria parlamentar, a fractura faz-se entre Cavaco e Sócrates.

Um homem de convicções pessoais e sem um corpo de doutrina
Cavaco Silva é um homem de convicções de esquerda, é um social-democrata, nunca teve nem defendeu nenhum valor conservador e sempre instrumentalizou os valores à sua manutenção no poder. Não faz sentido falar em fractura ideológica nesta lei do divórcio – que visa acabar com milhares de situação inaceitáveis de abuso nos tribunais e, sobretudo, que evita o habitual golpe do baú de um dos cônjuges – e ao mesmo tempo o Presidente da República ter promulgado sem qualquer obrigação constitucional o alargamento da Interrupção Voluntária da Gravidez.
Sejamos claros: em nossa opinião é óbvio que não são valores morais, nem questões ideológicas, que presidem ao veto nesta lei, tal como aliás também não foram as razões directamente expressas na questão do veto ao Estatuto Autonómico dos Açores.
São sempre, em Aníbal Cavaco Silva, questões de poder. No primeiro caso, o problema final é a Madeira e Alberto João Jardim, com o seu “federalismo fiscal” e, no segundo, é uma manobra perfeitamente populista – tentando agradar a uma maioria sociológica mal informada – em nome de anunciados valores de que curiosamente se lavou as mãos aquando do referendo ao aborto.
E porquê? Porque na ausência de Ferreira Leite o Presidente assume-se então como actor político directo e já não, apenas, como o garante da Constituição. O Presidente Cavaco Silva ao fazer uma marcação pessoal – que claramente o PS não deverá aceitar – está ele mesmo a ser o agente da desestabilização, do desgaste do executivo, para, eventualmente, em momento oportuno, poder actuar com maior veemência.
E, nesse sentido, estar calada é a estratégia correcta para Ferreira Leite.|

A questão liberal

No actual contexto político e económico, a questão liberal não se reduz apenas à livre iniciativa, que cada vez está mais ameaçada pelo enquadramento do País (o País está enquadrado, reduzido a um quadrado, e, quem não tiver os contactos certos, “não se safa”, servindo o Estado – enorme – apenas como instrumento de conservação desses interesses instalados).
No contexto actual, a questão do liberalismo é uma questão de humanismo e um imperativo ético. E, nesse sentido, o liberalismo volta a ser subversivo, como o foi no século XIX.
O liberalismo hoje regressa às suas origens, enquanto clivagem com o Antigo Regime. Tem que ser uma resposta às desigualdades e a afirmação da igualdade de oportunidades para todos.
A liberdade e a igualdade são, no nosso contexto político nacional, valores por adquirir. Elas estão presentes, diante do autismo das autoridades, sempre que exista um país que tem uma diáspora para além de metade da sua população, a quem não dá resposta e manda sem destino à procura de sustento.
Tenhamos noção que não é um lugar-comum dizer que a grande marca identitária da mudança do País foi sempre colonial. E, a explicação é simples, na candura da nossa inaugural impossibilidade de vivermos com aquilo que temos.
Mas, o que é mais relevante na nossa história centenária é que em todas as rupturas liberalizadoras há uma presença forte do discurso da derrota ou do fracasso colonial.
Logo no fim do nosso feudalismo e com o advento da dinastia de Avis – com o nascimento da consciência burguesa da primeira nação da Europa – é a solução externa que preside, enquanto razão de Estado – seja na busca das linhas de comércio, da pimenta, dos escravos ou do ouro, já tivemos diversas oportunidades para desenvolvermos o tema.
A primeira grande ruptura ultramarina, que leva ao choque modernizador e de abertura económica – e portanto numa primeira fase também de libertação popular e afirmação burguesa -, dá-se com o colapso de Alcácer-Quibir – que leva exactamente ao fim da dinastia de Avis e ao regime de abertura dual (dois Estados com o mesmo rei na Ibéria) e à dinastia dos Habsburgo (dita Filipina).
Modernamente, a grande ruptura com o Antigo Regime – o fim da Inquisição e a instituição de uma Carta Constitucional de matriz liberal em 1822 – é filha directa da independência do Brasil.
Depois, é o nosso fracasso no “mapa cor-de-rosa”, que vai, finalmente, fazer colapsar a coroa que os Bragança deram a Nossa Senhora da Assunção e impor uma República, que nem os próprios republicanos desejavam.
E, não nos esqueçamos que a restauração da liberdade com o 25 de Abril é resultado directo do anacronismo do nosso modelo colonial e efeito do desgaste de uma guerra colonial, feita em três frentes, nascida depois do colapso da Índia, e com um contingente geral, que o Orçamento Geral do Estado dificilmente conseguia suportar, quanto mais remunerar convenientemente.
Podíamos quase criar uma lei política nacional, segundo a qual, sempre que a pressão externa não existe, o País tende a fechar-se em si próprio, a criar soluções mais autocráticas que colocam em causa a dignidade dos cidadãos, em nome de uma pequena minoria, que, normalmente, enriquece com os poucos negócios do Estado, usando verdadeiramente a corrupção como instrumento para forçar à transferência dos recursos do Estado para esse pequeno grupo de detentores. Foi sempre assim.
A questão que fica por saber, e de algum modo o professor Oliveira Salazar tentou responder no período anterior à II Guerra Mundial, é se será inevitável que o totalitarismo se deixe instrumentalizar, ao ponto de sacrificar o bem-estar comum à usura de uma minoria que se instala à mesa do Orçamento do Estado.
Sem pressão colonial nem agenda externa, assistimos, neste momento, ao reforço do Estado, dos seus poderes de controlo e de manipulação, tudo acoitado num discurso ideológico e paroquial, ora securitário, ora de reforço da autoridade do Estado, ambos na agenda da pequena burguesia, sempre disposta a sacrificar a liberdade para manter o pouco que de seu julga ter.
Neste contexto, a questão que se vai colocar aos portugueses é se, não podendo viver com ajuda externa, a divisão do que produzimos pode ser feita a favor da comunidade e do bem-estar comum ou se mantemos a tendência da lei histórica nacional de reforço de algumas elites em prejuízo da nação, agravando o fosso entre ricos e pobres, sempre que o destino da Pátria fica confinado ao quadrado.
Esta é questão liberal no actual contexto político e económico nacional.|

A economia ao serviço do homempor Maria Valentina Machado

Se é um facto incontestado que sem uma robusta e saudável economia não é possível um desenvolvimento social capaz de satisfazer o Homem, também não é menos verdade, muito antes pelo contrário, que, sem este, aquela nunca será forte e, consequentemente, com capacidade de distribuição da riqueza. Mas a economia não pode escravizar o Homem, porque a razão fundamental daquela é servir este, levando-o a que o seja em plenitude.

A economia portuguesa revelou no 2.º trimestre do ano corrente uma melhoria muito ténue mas que, relativamente à situação de outros parceiros da UE, com crescimentos negativos do PIB ou em franca recessão técnica, podem indiciar uma certa esperança em que arranque definitivamente. No entanto, não se pode esquecer que a economia portuguesa é excessivamente dependente do exterior, com uma forte componente de exportações, o que deve deixar um alerta muito sério, pois com a crise que afecta os países para quem exportamos, é muito provável que aquelas diminuam e consequentemente afecte o pequeno crescimento do PIB.
De qualquer modo e porque a esperança é a última a morrer, devemos estar prudentemente cautelosos mas animados.
Um outro dado que pode ser animador é o facto da taxa de desemprego ter baixado, ainda que muito pouco, no mesmo período de tempo. Contudo, e relativamente ao desemprego, não se deve esquecer que tal melhoria pode apenas dever-se ao emprego temporário que esta época do ano propicia. Logo, é necessário não deixar de fomentar a criação de emprego e tal só pode e deve ser levado a cabo pelos empresários. Ao fim e ao cabo, é nestes que reside a possibilidade de traçar uma estratégia ascendente da nossa economia, tendo sempre presente que esta deve estar ao serviço do Homem e não este escravizado àquela, como, aliás, tem vindo a acontecer. É evidente que em épocas de crise, como aquela que temos vivido e que se arrasta há demasiado tempo, o Homem tem de sacrificar-se para que aquela cresça, ainda que contra ventos e marés. E assim tem acontecido nestes três últimos anos, primeiramente devido ao estado calamitoso em que se encontravam as contas públicas que todos, interna e externamente, reconhecem se conseguiram equilibrar com as medidas corajosas tomadas pelo Governo, mas sobretudo com a imensa capacidade de sacrifício e espírito de compreensão do povo português. Só que essas medidas corajosas e impopulares não afectaram todos por igual mas sim e sobretudo, a chamada classe média, hoje extremamente empobrecida. E quando se pensava que o mau tempo tinha passado e se aproximava a bonança, outros factores, agora externos, surgiram como a especulação do petróleo e seus derivados, a crise financeira americana, com a consequente desvalorização do dólar e suas consequências na economia global, implicando recessão no investimento e o aumento, muitas vezes especulativo, do preço de bens essenciais. É óbvio que uma economia tão dependente do exterior como a nossa tem de reflectir e ressentir-se dessa crise internacional e, por isso, face aos resultados referidos relativos ao 2.º trimestre deste ano, têm de nos deixar esperançados mas muito prudentes e receosos.
Esta crise internacional beneficia apenas as economias daqueles países que, não respeitando os Direitos do Homem e consequentemente os das Crianças, conseguem não apenas sobreviver mas desenvolver-se à custa de condições de trabalho indignas do ser humano, com horários de trabalho excessivos e reduzidos salários e, para escândalo do mundo civilizado, explorando o trabalho infantil, tal como na Europa aconteceu em finais do séc.. XVIII. É óbvio também que nestas condições não pode haver uma sã competitividade global, pois os princípios e os métodos são completamente diversos.
Deseja-se, espera-se e merece-se que a economia portuguesa dê origem ao desenvolvimento do país, não apenas no vector económico mas no vector social. Sabe-se que sem aquele este não é possível desenvolver e por isso mesmo o desenvolvimento social entre nós tem tão pouca expressão mas, quando se espera que a economia portuguesa ainda que tenuamente cresça, é bom recordar que o desenvolvimento adveniente tem de ser harmonicamente distribuído, com justiça e equidade, contemplando os mais desfavorecidos que são, para além dos tais cerca de 2 milhões de pobres, a tal classe média empobrecida que são cerca de 6 milhões de portugueses. E tal tem de se conseguir a curto e a médio prazo, pois, como se tem referido constantemente, os portugueses estão, não apenas cansados de sacrifícios, mas sobretudo indignados, para não dizer revoltados, com as disparidades existentes que separam os mais ricos dos pobres ou empobrecidos, que o mesmo é dizer que separam cerca de 2 milhões de ricos dos restantes 8 milhões.
E essa distribuição harmónica, com justiça e equidade, passa, em primeiro lugar, pela criação de emprego, condição essencial para o desenvolvimento económico e social; passa por uma política de salários justos adequados à capacitação dos trabalhadores, cujo mínimo não pode ser inferior a 500 euros se, de facto, nos queremos aproximar da média europeia; passa ainda pela continuação do esforço na formação académica e profissional dos jovens, tornando-os trabalhadores capacitados; passa pelo reconhecimento, por parte do Estado, que, por si só, não conseguirá os resultados que se esperam a curto prazo, confiando e colaborando com a sociedade civil, sem a qual estaríamos a anos-luz das metas já alcançadas; passa ainda pela não marginalização daqueles que, por qualquer razão, não foram nem estão devidamente qualificados, possibilitando e investindo numa formação contínua recorrente, para o que se exige, não apenas a disponibilidade do Estado, mas igualmente da sociedade civil em geral e das empresas, sindicatos e associações profissionais em especial; passa pelo reconhecimento e não marginalização dos idosos, quer tenham ou não sido trabalhadores, revendo as suas pensões, nomeadamente as de reforma, com base na inflação, mas também com base não apenas no salário mínimo mas também de acordo com o salário médio da sua carreira; passa por uma política firme e eficaz de erradicação da pobreza e discriminação social, com a certeza de que não são somente os pobres os discriminados ou marginalizados, mas também outros que o são apenas por motivos sociais; passa por uma correcta e coerente política de promoção e protecção da família, incentivando a natalidade, a fim de que se rejuvenesça a população portuguesa, condição essencial para uma economia saudável e promissora e, porque é na família que se forma o Homem, actor e usufrutuário da mesma economia; passa pelo desenvolvimento, com justiça e equidade, do mitigado Estado-Providência que temos, também ele fruto da colaboração do Estado e da sociedade civil, no sentido de que ninguém, ninguém mesmo, deixe de usufruir, em plenitude, dos seus direitos de cidadania.
E não se pense que tal é pura utopia porque, de facto, o não é, desde que o desenvolvimento económico se não divorcie do desenvolvimento social. Se os países do Norte europeu conseguiram esse desenvolvimento harmonioso, também os do Sul, onde nos integramos, também terão de o alcançar.
Se é um facto incontestado que sem uma robusta e saudável economia não é possível um desenvolvimento social capaz de satisfazer o Homem, também não é menos verdade, muito antes pelo contrário, que, sem este, aquela nunca será forte e, consequentemente, com capacidade de distribuição da riqueza. Mas a economia não pode escravizar o Homem, porque a razão fundamental daquela é servir este, levando-o a que o seja em plenitude.
A economia não depende somente do capital, mas também e sobretudo do Homem que a torna possível.
A economia só faz sentido quando o objectivo, primeiro e último, é o serviço do Homem.|

Docente da ULHT

O PSD não é elitista e isto não dá votospor Rui Teixeira Santos

O papel da senhora não é o de ir em arraiais, mas ela fará a sua aparição em Setembro na Universidade de Verão, em Castelo de Vide, com António Vitorino e Pacheco Pereira.

O papel da senhora não é o de ir em arraiais, mas ela fará a sua aparição em Setembro na Universidade de Verão, em Castelo de Vide, com António Vitorino e Pacheco Pereira.
Este fim-de-semana o PSD, o PSD real, vai ter as suas celebrações: no Pontal e na Madeira, como manda a tradição.
A líder não estará presente.
E, Manuela Ferreira Leite até tem razão: a sua presença não lhe acrescentaria nada, não lhe daria nem mais um voto, não lhe serviria sequer para combater o eng. Sócrates e o governo socialista.
Só que a sua ausência, provavelmente, tirar-lhe-á, a ela e ao partido, votos, ampliará o sentimento de orfandade, reinante no PSD, e torna urgente a clarificação da liderança do PSD, antes das próximas legislativas, agora que se percebe que a senhora não pode ser mais que chefe de gabinete de estudos.
Pela simples razão que o PSD não é elitista e, portanto, que estas atitudes de autismo não dão votos.
Manuela Ferreira Leite é comparável a Diogo Freitas do Amaral. Também ele era elitista e tímido no contacto com o partido e a população. Não tinha jeito nem vocação. Só que estávamos em 1975 e o PSD não é o CDS. Além disso, Freitas do Amaral era acompanhado por Adelino Amaro da Costa e por Basílio Horta, que sabiam bem o que a população pensava e como agia. Sem essa componente populista e pragmática, o CDS nunca teria sido nada em Portugal.
Ora, Ferreira Leite é acompanhada por Morais Sarmento/Arnaut, que não consta que sejam muito populares, e por Pacheco Pereira e António Borges, que devem ter pouco para acrescentar neste particular.
Ou seja, sem mensagem nem presença, Ferreira Leite corre o risco de destruir para sempre o PSD. E das duas uma: ou é substituída antes mesmo das legislativas, o que pode ser difícil, pois o “cavaquismo septuagenário”, orquestrado a partir de Belém, com intervenção política e protagonismo presidencial, ou começa a haver espaço para a refundação do centro-direita e para a criação de uma novo partido, à semelhança do que aconteceu em Itália.
Ferreira Leite, aliás, como o Presidente Cavaco Silva, odeia o partido, odeia a máquina do PSD.
Chegada à liderança, comporta-se como o autocrata iluminado. (Mesmo que nós saibamos que o seu “autismo” tem também uma componente de ausência de ideias.) O PSD é um problema, aliás um problema com o qual Cavaco Silva se deu mal, apesar da máquina nogueirista, quando foi primeiro-ministro.
Só que, sem partido, Ferreira Leite também não existe, ao contrário de Cavaco Silva que, a partir do Governo, tinha poder e lugares para distribuir ou ambições para satisfazer e empresas públicas para privatizar e obras para contratar.
Não deixa de ser curioso – e sabemos que Ferreira Leite também ficou siderada – que, mesmo na sua gente, as deserções já tenham começado, com António Borges a passar-se para o lado de Pedro Passos Coelho, defendendo a privatização da Caixa Geral de Depósitos (um disparate equivalente à estupidez de terem extinto o IPE) e desautorizando, assim, a própria líder que (e bem) percebeu que seria um erro prescindir de um dos poucos instrumentos de intervenção microeconómica do Estado e, sobretudo, numa conjuntura financeira e económica como a actual.
Ferreira Leite não tem jeito e o cavaquismo não tem gente para a acompanhar. O fim da história está à vista…

O exemplo de Espanha
Enquanto, a nossa economia definha e os políticos do Governo e da oposição estão de férias, o exemplo espanhol ressalta pela diferença. Ontem, o presidente do Governo espanhol interrompeu as suas férias para presidir pela primeira vez à Comissão Delegada de Assuntos Económicos e anunciar um novo pacote de medidas contra a crise económica que afecta o país ibérico, aproveitando a nova directiva da União Europeia, que permite liberalizar serviços e agilizar procedimentos, tendo em vista a concorrência. Assim, anunciou a liberalização da abertura de centros comerciais, a extinção do imposto sobre património, a agilização dos procedimentos administrativos para lançar novas obras públicas e a eliminação de barreiras burocráticas e fiscais que estrangulam as PME.
José Luís Zapatero não é um bom governante. Mas, infelizmente para nós, é melhor que o nosso governo e, sobretudo, muito melhor que a nossa oposição.|

Impotentes diante da Rússia

Com o Presidente russo num cruzeiro no Volga, com a atenção mundial concentrada nos jogos de Pequim e com Vladimir Putin assistindo à sua inauguração, o cálculo ocidental foi que o Presidente georgiano podia resolver o assunto da Ossétia do Sul em 24 horas e fazê-lo de um modo irreversível.
Mas tudo correu mal e, em seis dias, os russos acabaram com a capacidade bélica da Geórgia, ameaçando, ontem, mesmo levar a sua acção punitiva até à destruição da própria capital e destituição do seu governo democrático.
Ficou claro que o Ocidente era totalmente impotente diante do avanço russo e que os Estados Unidos e a Europa nada terão a dizer na evolução no Cáucaso e na Ásia Central.
É neste contexto que o futuro da Europa deve ser considerado. O ridículo papel de mediador feito pela diplomacia francesa pôs a claro que não contamos e que existem ameaças estratégicas relevantes, agora que desperta de novo o clássico imperialismo russo.
Que faremos amanhã se a Rússia se irritar com os gémeos da Polónia? Ah! Nesse caso será diferente, pois a Polónia está na União Europeia e na NATO. Será? Sem Europa, sem federalismo europeu que garanta a paz, sem uma parceria construtiva com Moscovo, sem um diálogo internacional, a nova ordem far-se-á como a antiga: à lei da bomba e pela força.
Mas o que ficou claro, esta semana, é que a Geórgia actuou para nos envolver mais rapidamente, que a Geórgia, não tendo todas as respostas da NATO nem da UE, agiu de modo a precipitar os acontecimentos e acabou sozinha, humilhada, ocupada, definitivamente destruída, apesar dos protestos do Ocidente.
O Ocidente enganou-se mais uma vez…|

O discurso ideológico do controleirismo

O País nunca deixou de ser um sítio pequeno, periférico, distante da modernidade, sem viabilidade, que se visita, mas onde convém não estar por muito tempo. Esse universo da aldeia, essa falta de cosmopolitismo, traduz-se, depois, na inveja e no comportamento miserável dos pequenos poderes, na denúncia rasca, na exibição do pequeníssimo poder dos saloios. E quando a crise se agrava, tudo isto se torna mais evidente.
Vem isto a propósito do autismo que se verifica no Estado e que pode bem acabar de vez com a possibilidade do PS repetir a sua maioria absoluta. Começa no fisco e na Segurança Social, que continuam a apertar as empresas com o discurso ideológico do pagamento dos impostos, uma verdadeira agenda para afastar os empresários do poder, mas que resulta na falência em cadeia das PME em Portugal.
Há toda uma série de pequenos poderes de listas e de agendas securitárias que visam apenas controlar, verificar, estupidamente destruir a iniciativa.
Esta semana ficámos a saber que o ministro da Administração Interna apoia a proposta da associação de bares do Porto para criar um mecanismo que limite a entrada de clientes indesejáveis em discotecas e vai estudar o enquadramento legal para tal, conforme noticiava o JN desta quarta-feira.
Mais uma lista como a dos cheques do Banco de Portugal ou a do registo criminal ou a dos doentes do SNS.
Mas, alargam-se os poderes das polícias, como soubemos ainda esta semana por via da jurisprudência. Com efeito, as polícias portuguesas podem recolher SMS (mensagens escritas por telefone) gravados nos telefones sem necessidade de autorização de um juiz, segundo um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa. Os três juízes que assinaram o acórdão consideraram por unanimidade que é de presumir que a mensagem recebida em telemóvel foi lida pelo seu destinatário e que, por isso, “a mensagem mantida em suporte digital depois de recebida e lida terá a mesma protecção da carta em papel que tenha sido recebida pelo correio e que foi aberta e guardada em arquivo pessoal”. É, por isso, que, “tratando-se de meros documentos escritos, estas mensagens não gozam de aplicação do regime de protecção da reserva da correspondência e das comunicações”, dizem os juízes, aplicando este entendimento ao correio electrónico e transmissão telemática de dados. Até Germano Marques da Silva, especialista em Direito Penal ouvido pela TSF, corroborou esta interpretação, dizendo que “um SMS é um documento que pode ser apreendido durante uma investigação”.
Já tínhamos visto o excesso das escutas telefónicas – que nunca deveriam constituir meio de prova, mas, apenas, indício para investigação – mesmo com controlo judicial. Agora, ficam as polícias a poderem fazer por sua iniciativa a leitura dos SMS.
O alargamento dos pequenos poderes do Estado, em nome da segurança, está a transformar Portugal num país irrespirável, não tanto porque esses mecanismos vão funcionar (em Portugal nada funciona e portanto não haverá o risco da demanda total), mas, porque não funcionam permitem a injustiça do poder discricionário, da pequena vingança, do caso exemplar.
A criminalização das dívidas ao Estado apenas serviu para isso. Para, rigorosamente, mais nada. Os poderes quase judiciais das autoridades administrativas, ditas independentes, só vieram tirar do escrutínio democrático partes significativas do poder executivo, criando-se desta maneira um Estado dentro do Estado, completamente controlado por poderes fácticos e interesses e sem controlo político. É o caso da Anacom, da Autoridade da Concorrência, da PGR ou da CMVM. Todas elas são entidades administrativas, fazem parte do poder executivo, mas ninguém as controla e aparecem como uma espécie de “poder sagrado” que vela pelo interesse público – aliás único fim do Estado – detido por uma tecnoestrutura acima de qualquer suspeita. Sem querer fazer nenhum juízo de valor, isto parece-se em muito com a Inquisição, e dá espaço ao abuso, o que, na arquitectura do poder democrático, tem que ser evitado.
E, depois, vem o mais grave: estas autoridades induzem, quando não instigam mesmo, comportamentos mesquinhos por parte de partes que se sentem, momentaneamente, prejudicadas. O estímulo que o Estado tem feito à denúncia, à delação, à queixa, o abuso dos julgamentos mediáticos e das conclusões precipitadas (alguma coisa, finalmente bem e a crédito deste Governo, se fez em matéria de prisão preventiva!) são sinais preocupantes de uma sociedade fechada, provinciana e profundamente doente.
A denúncia da imprensa sobre as alegadas offshores do BCP estarem relacionadas com o controlo da Cimpor, alegadamente “bufadas” pela Semapa, é miserável se assim for, até porque Pedro Queiroz Pereira não se deve esquecer que também tem telhados de vidro.
Irrita-me ver este ambiente de delação. Este ambiente pidesco e de crise de costumes. Também em 1975 houve alguns chiques que se passaram. Os seus gestos ficaram com os próprios e deles nem a história registou memória.
Já se viu isto em 1975 e o País pagou da pior forma os excessos. Paga, ainda hoje, com uma burguesia fragilizada e descapitalizada. Paga, com sectores importantes da sociedade ligados ao crime organizado e à corrupção para se defender e sobreviver. Todos vão ficar mal na fotografia. E, finalmente, a competitividade do País vai ficar afectada, a confiança da população nas elites é menor e o ambiente para a mudança acentua-se.
Se juntar a isto o ambiente generalizado de insegurança, o aumento do crime violento, os assaltos diários aos bancos e as tensões raciais na periferia, podemos dizer que o legado da República não está a ser brilhante.|