2025/09/14

Mário Cláudio ao SEMANÁRIO

“Todos somos uma minoria”

A cultura étnica faz transparecer o carácter híbrido motivador do tecido estruturante da obra de Mário Cláudio, “Oríon”, a segunda de uma “tríade” literária.

A propositada criação de uma linguagem miscigenada, como forma de mostrar ao leitor o traço construtor de cada palavra, e de o encaminhar bem para lá dos tempos, com a imagem do presente como berço de uma narrativa e de uma conversa que abandona a ficção.

A constelação Oríon, é representada pelo mito simbólico renascido da lenda de um caçador, que depois de tantas aventuras se transforma em constelação celeste.

Todavia “Oríon”, no livro de Mário Cláudio, é o relato, que sob a forma de romance metafórico aproveita o verídico acontecimento histórico do envio de um punhado de crianças judias, em 1443, no reinado de D. João II, para o arquipélago de S. Tomé e Príncipe, o que ” faz pensar em algo tão característico da condição humana, na qual todos nós somos crianças de alguma maneira abandonadas numa ilha, tentando contemplar o horizonte, onde por vezes avistamos uma constelação que interpretamos como sinal de esperança, de possibilidade da realização de um sonho futuro”.

Aos quinze anos encontrou em si mesmo, ” a escrita como algo central na minha vida”, considerando mesmo ser “impossível sobreviver sem ela”, explicando sucintamente a motivação que o conduziu à criação desta obra, ” tinha lido um episódio histórico acerca deste acontecimento, e surgiu-me a ideia de construir um romance”.

Para o escritor, professor, e licenciado em direito, a quem as invictas palavras que exalam da sua voz não conseguem ocultar as raízes portuenses, “os romances nascem disso mesmo, de ideias que se sedimentam e depois emergem, surpreendentemente”.

“Desembarcou na ilha uma leva de degredados, gente que mirava as novidades da paisagem com uma brasa em cada olho, se deslocava numa lentidão de cautela e de pasmo, hesitante quanto ao solo que pisava, mas decidida a beber até ao seu termo a vida que lhe fora poupada…” .

Neste segundo livro de uma trilogia possuidora de uma “égide comum aos três romances, embora cada um deles se possa ler de forma independente” e cuja ideia matriz se relaciona com a abordagem ” à situação de pessoas que se encontram num contexto de fragilização diante do poder, no primeiro caso com sete delinquentes, agora com sete crianças iguais a todas, desde sempre, mas de etnia diferente”.

As distinções apresentadas, quase como que através de uma eclesiástica encenação divina, pelas sociedades contemporâneas, povoam o seu imaginário de uma avidez revolucionária, que transparece não raras vezes, na sua obra, bem como na conversa, “procuro prestar o meu contributo, naquilo que melhor sei fazer, reflectindo e tentando fazer reflectir acerca das razões que conduzem à confrontação e à eterna guerrilha entre minorias e maiorias”. Explicitando o seu papel social como televisionador do presente, e referindo-se aos degredados dos nossos dias assume, “como escritor, como artista que sou, a minha tendência conduz-me a estar sempre ao lado das minorias ostracizadas, até porque todos nós, por uma ou outra razão, fizemos, fazemos, ou faremos parte delas”.

No actual contexto global, classifica a sua obra como “um momento de reflexão para situações que necessitam de ser pensadas, de forma mais generalizada, por forma a rasgar e atravessar todos os lugares, de todas as épocas”.

O romancista explana também o seu pensamento acerca da cultura nacional, nomeadamente quanto ao enquadramento que vai recebendo por parte da governação, preferindo começar por focalizar “a terrível fase por que atravessamos, pois psicologicamente encontramo-nos fortemente combalidos”, sublinhando ser este um “período de acentuada depressão, não só em termos monetários, mas muito mais preocupantemente, em termos de esperança, tão necessária ao desenvolvimento de qualquer sociedade”. Revelando-se “consternado”, continua no entanto expectante quanto ao “rumo que se está a seguir”, que anseia, ” mude radicalmente o deu decurso, o mais rápido quanto possível”.

Mário Cláudio prossegue, agora analisando o país como algo “tão débil do ponto de vista da intervenção cultural, quer dentro das nossas fronteiras, quer pelo mundo”, traçando uma pessimista, mas muito pessoal previsão, “se não adoptarmos e não incrementarmos uma dinâmica diferente daquela a que estamos habituados, em todos os níveis da nossa sociedade, corremos o risco de, mais tarde ou mais cedo, soçobrar”.

Não esquecendo o Governo, e as competências que lhe incumbem nesta matéria, critica a situação vigente no Ministério da Cultura, observando, “a existência de uma área da cultura nesta governação, parece não corresponder a quase nada, apenas a um nome, sem qualquer tipo de conteúdo”.

CDS-PP solidário com Portas

Do Largo do Caldas veio, esta semana, mais um esperado apoio ao actual Ministro de Estado e da Defesa, Paulo Portas. Desta vez foi o secretário-geral do seu partido, Luís Pedro Mota Soares.

O CDS-PP “está unido” em torno de Paulo Portas no que toca aos recentes desenvolvimentos do Caso Moderna. Quem o diz é o secretário-geral do partido, Luís Pedro Mota Soares, numa entrevista à agência Lusa.
Para Mota Soares “o partido está cada vez mais unido em torno do seu líder e do seu projecto político” aproveitando também para desvalorizar as recentes revelações de José Braga de Gonçalves, o principal arguido do julgamento do Caso Moderna a decorrer no Tribunal de Monsanto, quanto à passagem Portas pela empresa de sondagens Amostra. O secretário-geral do CDS-PP disse ainda que quanto às revelações “não há dados novos” para o processo que está a ser julgado.

Centésima viagem apostólica do Papa é à Croácia

O Papa completa, no próximo mês de Junho, a sua centésima viagem apostólica, desta vez, à Croácia. No início do mês de Maio João Paulo II desloca-se a Espanha.

O Vaticano confirmou que em Junho deste ano o Papa se desloca à Croácia ascendendo a cem as viagens apostólicas dos seu pontificado de 25 anos. Segundo o director da Oficina de Imprensa da Santa Sé, Joaquín Navarro-Valls, “o Santo Padre João Paulo II realizará uma viagem apostólica, de 5 a 9 de Junho, à Croácia e visitará as cidades de Rijeka, Dubrovnik, Osijek e Djakovo Zadar”.
Assim sendo, esta será a centésima viagem apostólica do Papa desde que se iniciou o seu pontificado em Outubro de 1978. João Paulo II já realizou 98 viagens apostólicas, sendo que na última se deslocou ao seu país de origem, a Polónia. Ainda antes da Croácia, será a Espanha a receber João Paulo II nos próximos dias 3 e 4 de Maio.
Entretanto, segundo noticia a agência Ecclesia, o governo croata “expressa a sua satisfação sobre o facto de o Santo Padre ter aceite o convite do Presidente e do Primeiro-ministro croatas e está ansioso por dar as boas-vindas a João Paulo II”. Esta é a terceira viagem de João Paulo II àquele país balcânico.

À espera do milagre!por Manuel dos Santos

As ” boas” notícias não param de surgir na economia portuguesa.

Premiados, como já estamos, com a mais baixa taxa de crescimento real do PIB em 2002 e 2003, no contexto da Europa, caminhamos agora a passos largos, para o topo dos países com o maior nível de desemprego.

Nos últimos doze meses, segundo o organismo estatístico europeu, foi Portugal o país que registou o maior agravamento do desemprego – a respectiva taxa ultrapassou já uns preocupantes 6,7% da população activa. É bom recordar, em tempo de avaliação de heranças, que o nível de desemprego se situava em 4,3 pontos percentuais quando o actual Governo assumiu funções.

Curiosamente, esta situação que nos coloca já num “invejável” 6.º lugar na União Europeia não tem tido a repercussão que merecia e, sobretudo, que devia em Portugal.

Este destino ficou, aliás, traçado desde o início.

Ao preocupar-se mais com a herança financeira dos socialistas, do que com a correcção das medidas de política reais ajustadas à nova situação de enquadramento da economia portuguesa, o actual Governo estava a construir o cenário que, agora, desgraçadamente vivemos.

A sociedade portuguesa não pode aguentar por muito mais tempo as condições de pressão que resultarão de um nível de desemprego muito elevado, e o funcionamento dos chamados estabilizadores automáticos, ou está esgotado, ou dificilmente se põe em marcha tendo em conta as opções orçamentais (irreversíveis) do actual Executivo.

Resta-nos pois a esperança de que estejamos a viver apenas uma crise conjuntural e que, com a recuperação da economia europeia (para quando?), estaremos brevemente em condições de salvar o “essencial”.

Mas mesmo esta esperança mingua quando verificamos o ambiente de pessimismo (sem par) que se vive na sociedade e, nomeadamente, nos agentes económicos nacionais.

Foi, de resto, o desapontamento com o falhanço das expectativas de crescimento elevado (tendo em conta a modernização da economia europeia e por arrastamento da economia nacional) mas, sobretudo, a dramatização da situação económica, feita sem lógica sem nexo, que conduziram à actual situação.

Há pois boas razões para pensar que a situação económica (e social) corresponde a uma crise estrutural, que é agravada por factores exógenos, mas que inevitavelmente terá consequências muito fortes sobre o futuro e a qualidade do desenvolvimento e da coesão económica e social do País.

É urgente, portanto, lançar um profundo debate na sociedade portuguesa, juntando o que pode ainda ser juntado, eliminando o que deve ser eliminado, mas, nomeadamente, criando condições de verdade e transparência que sirvam para mobilizar os portugueses para a recuperação.

A obsessão com o défice orçamental (agora também criticada pelo ex-ministro Miguel Cadilhe, como já o fora antes por João César das Neves) e o completo autismo social que condicionam e manietam a acção governativa, têm de ser rapidamente ultrapassadas.
Reconheça-se, no entanto, que não se vive um período particularmente favorável ao debate das questões internas na sociedade portuguesa.

A agenda política, do interesse dos portugueses, surge completamente invertida.

Quando ainda era possível discutir (e fazer) alguma coisa, surgiu o caso da Moderna, logo a seguir à corrupção de alguns agentes policiais, depois a suposta rede de pedofilia, de imediato a problemática da saúde pública pela via da questão da carne de frango poluído com nitrofuranos, finalmente, a guerra no Iraque e as diversas posições sobre ela assumidas na nossa sociedade.

Entretanto, o “tal” desemprego foi crescendo, o Investimento Directo Estrangeiro está reduzido a limites impensáveis, o rendimento real das pessoas (que conseguem manter emprego) cai todos os dias, os investimentos públicos e privados estão praticamente congelados (correndo-se sérios riscos de perdas significativas de fluxos financeiros comunitários) e as chamadas reformas estruturais, ou não saíram do papel ou se limitaram a criar vagas, no aparelho de Estado e organismos conexos, para receber a enorme legião de “companheiros” da armada laranja.

É certo que no Mundo as coisas não vão melhor. Os tradicionais motores da economia europeia (França e Alemanha) estão gripados. A divisão no seio da União é cada vez mais intolerável. O projecto do alargamento da União e da Reforma das Instituições que lhe está associada podem ser, a curto prazo, vítimas da indecisão e da volatilidade que se vive.

Na Guerra do Iraque, o inefável ministro da Informação iraquiano apela à guerra santa e à mobilização de comandos suicidas (a verdadeira e mais eficaz arma de destruição maciça dos regimes fundamentalistas), prometendo-lhes o paraíso e desejando, segundo a boa regra do marketing dos detergentes, que não percam esta última oportunidade.

Do outro lado do conflito, os americanos e os ingleses partilham as “benesses” do pós-guerra, repartem os grandes contratos de reconstrução do Iraque e determinam a nova ordem mundial procurando resistir às principais potências europeias, que não se tendo envolvido na guerra, não aceitam contudo ficar de fora dos benefícios do banquete final.

As pessoas morrem aos milhares, nomeadamente as crianças, e a estas ninguém lhes pergunta se desejam “brincar” numa futura auto-estrada construída pela engenharia francesa ou determinada pela tecnologia americana.

Se alguma coisa, porventura, lhes fosse perguntado apenas reclamariam comida e cuidados de saúde, chegados a tempo e horas.

O Governo português também meteu Portugal nesta “festa”. Não era o insuspeito “Le Monde” que, ainda há pouco tempo, relatava que o nosso primeiro-ministro tinha saído temporariamente de uma reunião importante do PPE, para atender uma chamada urgente do seu amigo (sr. Bush) americano?

Com um bocado de sorte ainda vamos conseguir uma pequena fatia de um pequeno contrato, de uma subempreitada para reconstruir o Iraque.

Só podemos esperar que esse milagre não chegue já demasiado tarde.

O novo paradigma tecnológico e o aniversário do Governopor Rui Teixeira Santos

Qual é a guerra actual? É a guerra digital. O novo paradigma tecnológico, introduzido pela guerra americana, torna inevitável a sua vitória, seja qual for o número de mortos.

Não se trata de uma doutrina. Trata-se de uma realidade, igual àquela que o Homem do Bronze enfrentou quando começou a Idade do Ferro.

Não foi só por audácia que os 300 espartanos, comandados pelo Rei Leónidas, travaram os 260 mil persas de Xerxes. Foi sobretudo porque a tecnologia e o armamento, as lanças de ferro e os escudos maiores dos Espartanos eram invencíveis, perante as espadas de cobre e as defesas dos persas.

Quem não perceber isto, não percebe o que está a acontecer no mundo e será julgado pela história como autor de políticas miseráveis que contribuíram não só para a ruína da Europa, mas para a sua total e definitiva irrelevância a nível internacional.

Fica para sempre provado que são estes políticos e economistas pouco avisados, que nunca foram à guerra e que nada sabem de História da Humanidade, que mataram a Europa e insensatamente a estão a conduzir para um beco de escravidão sem sentido.

O problema dos nossos economistas é que não percebem que as restantes variáveis não são constantes como vem nos livros. Não percebem que quando se dá um salto tecnológico, está-se a dar um salto sociopolítico e económico.

E como a Europa não é mais que um grande Portugal, o mesmo problema só se repete em escala maior. Por amor de Deus, calem o doutor Cavaco Silva, prendam Teodora Cardoso, demitam a Ferreira Leite e não deixem Miguel Beleza falar. A brigada do reumático continua a não perceber o que está a acontecer e na linha dos contabilistas de Bruxelas, como o inacreditável Pedro Solbes, todos os dias se enganam nas suas previsões e com a mesma cara apresentam novas previsões.

Devia haver uma Inquisição para prender as bruxas do nosso tempo. Cavaco e Ferreira Leite conduziram Portugal a uma crise económica porque não percebiam em 1992 nada de política cambial. Agora alegremente agravam a situação de Portugal, porque não percebem nada do efeito da tecnologia na guerra, na economia e, já a seguir, na política monetária, com a moeda digital global.

Cavaco não percebeu

Cavaco Silva não percebeu que tem de haver dinheiro para armas, porque sem armas não há nada mais. Ferreira Leite não percebeu por que é que o Governo ao fim de um ano não fez uma única reforma e o pouco que fez em finanças públicas só contribuiu para aumentar a fuga aos impostos e pesar na recessão e acelerar o aumento do desemprego.

Estamos todos de acordo que são necessárias reformas estruturais e contenção nos gastos públicos e redução das despesas do Estado. Mas, ao contrário do que diz Cavaco e Ferreira Leite, nada disso se faz nesta conjuntura de recessão.

Um bom governo acautelaria que a recessão fosse evitada a todo o custo, que os efeitos em termos de desemprego fossem reduzidos, até por causa dos impactos nas contas da Segurança Social, que nesta conjuntura não se provocasse choques na função pública e perseguições aos empresários, como se o não cumprimento por parte de alguns fosse a matriz do comportamento de todos.

Ferreira Leite não percebeu a tempo a crise que aí vinha e por isso o País paga agora a sua incompetência.

Do mesmo modo que a Europa não percebe, agora, que tem que apoiar o senhor Colin Powell, sob o risco de Dick Cheney e Donald Rumsfeld prosseguirem, sem sequer nos ouvir. E têm toda a razão: porque tem uma superioridade tecnológica, embora lhes falte as boas maneiras.

E nisso erraram os novos falcões do Pentágono. Porque, certos da superioridade do resultado, descuraram a guerra psicológica e o controlo dos media, onde os iraquianos têm estado a ganhar a todos os títulos, acentuando o antiamericanismo que já existia no mundo árabe.

Os ingleses, neste processo, têm sido notáveis, até na moderação dos impulsos imperialistas americanos. Aznar e Barroso surpreendentemente têm estado bem. Já Maquiavel ensinava que mais vale estar dentro do processo do que ser neutral, como quer a esquerda europeia, retrógrada e romântica, sem perceber que a questão não é de belicismo, mas de revolução tecnológica, que necessariamente cria uma nova guerra, uma nova política e um novo contexto económico.

O pilar europeu

Que as opiniões públicas europeias estejam contra a guerra, já era de esperar. Mas, do mesmo modo que o aprofundamento da União Europeia é um imperativo de Segurança e de Defesa, que aliás a América sempre apoiou, na lógica do pilar europeu da Aliança Atlântica, também o claro alinhamento com os EUA nos propósitos de segurança no Médio Oriente têm que ser um objectivo.

A Europa, que não tem uma guerra há muito tempo, está esquecida que quem ganha a guerra tem direito ao saque. Portanto, não vale a pena lágrimas de crocodilo ou orações e missas encomendadas por tal propósito. Os iraquianos terão que pagar o esforço de guerra anglo-americana que, obviamente, vão beneficiar com isso, passando militarmente para a era tecnológica seguinte.

O que lamentamos é que, em Portugal, os nossos generais e almirantes queiram comprar equipamento da Idade da Pedra em segunda-mão aos EUA, não percebendo que, para o esforço de guerra, vale a pena os países endividarem-se, até porque isso beneficiará as gerações futuras.

É, aliás, um debate que costumamos ter em Economia Política.

Uma das grandes vantagens de Portugal, hoje, é ter à frente do Governo um homem da Ciência Política, que esteve nos EUA e que não se deixou contaminar pelas velhas doutrinas conservadoras dos generais que defendem os exércitos pouco flexíveis, enormes e convencionais.

A nova doutrina americana é contrária à europeia tradicional: exércitos profissionais, rápidos e com capacidade de adaptação ao terreno, apostados na precisão da guerra digital, cuja margem de erro é de apenas 2%. Uma margem suficiente para Saddam ter as suas imagens na Al Jezzira, mas insuficiente para colocar em causa a limpeza da ocupação.

Ora isto é algo que Barroso pode entender, mas que, na sua “entourage”, até no seu gabinete, poucos percebem.

Para Cavaco ou Ferreira Leite são verdadeiros símbolos isotéricos de outro mundo.

Perceber a tecnologia é como que “receber a luz”: ou se está nessa, ou não se entende. É esta a lógica dos jovens, mas é também a lógica das novas igrejas. É este o “admirável novo mundo da América”, que a Europa afrancesada ou a Alemanha provinciana desconfiam, porque não percebem.

A cruzada da América

A América neoconservadora assume o direito à sua cruzada. E se a Síria ou o Irão se colocarem a jeito, alimentando a guerra no Iraque, como outros antes fizeram na Coreia, que se desenganem, pois a história terá outro fim, dada a superioridade estratégica da guerra digital americana, e só estarão a acelerar o inevitável processo de controlo e destruição das armas nucleares do Irão e das armas de destruição maciça da Síria.

E de pouco ou nada vale dizer, mesmo Blair a braços com a sua crise de popularidade interna, que não se irá com a América ao Irão ou à Síria, à Líbia ou à Coreia do Norte. Porque a América, até ao próximo ciclo eleitoral (Novembro de 2004), vai ter como prioridade estratégica eliminar os perigos do terrorismo e provavelmente criar as condições económicas para acabar com a economia paralela que financia o terrorismo, a corrupção e o tráfico de armas e de droga.

E, neste momento, se quisermos participar no processo temos que ir em socorro de Powell, em vez de fazermos manifestações. Porque, como disse, à guerra digital se seguirá a moeda digital, muito mais regulamentada, muito mais controlada por um poder central, que será provavelmente o da FED, retirando-nos definitivamente qualquer possibilidade de política monetária, tornando impossível a economia paralela e a fuga ao fisco.

E porque a moeda é uma questão de fidúcia na autoridade que a gere, obviamente o mundo confiará muito mais na América da guerra digital e da vitória, que na Europa das manifestações e do discurso pacifista ou da neutralidade.

Liberal dentro de fronteiras, a América imperial é absolutamente conservadora internacionalmente.

Exactamente ao contrário dos pacifistas europeus, que são conservadores nas contas públicas e nas políticas e depois irresponsavelmente, liberais nas relações internacionais.

O discurso nacionalista

No meio disto, que espaço resta à governação dos países, ameaçados pela recessão, dirigidos por incompetentes contabilistas de segunda classe, e em face da globalização com a sua independência nacional e soberania ameaçadas?

Obviamente, resta o discurso ideológico da afirmação dos valores constantes da história, como referencial cabalístico de uma necessidade, qual desígnio, também ele divino, porque havemos de ser nós, os portugueses, senhores do nosso destino, protegidos pela mãe de Deus, Nossa Senhora e, depois, rainha de Portugal.

Neste período de indecisão e de guerra, vai Durão Barroso a Atoleiros (Fronteira, Portalegre), por ocasião do primeiro aniversário do Governo, celebrar o mito e reafirmar que hão-de os portugueses no mundo governar-se a si mesmos, pois ninguém mais que os próprios lhes garante o bom governo.

Porque, ao fim do ano de governo da Convergência Democrática, a recessão é maior, as falências, o desemprego e a dívida pública dispararam, a confiança e o consumo caíram, as despesas públicas aumentaram, os impostos subiram, mas as receitas fiscais desceram, fazendo subir o défice público, os espanhóis tomaram mais conta dos nossos centros de decisão (até o BCP está sob ameaça do BBVA) e nenhuma das reformas estruturais foi feita (à excepção dos genéricos), a Durão Barroso resta a reafirmação da pátria, e o bom senso aconselharia a que este aniversário passasse despercebido.

Porque a Portugal não sobra margem para posição diversa da espanhola, a Barroso não resta mais espaço que o da afirmação da Nação. O discurso ideológico cobre a realidade, mostrando que Barroso intui o espaço que lhe resta nesta conjuntura difícil, sabendo bem que Portugal só recupera, se os outros recuperarem também.