2025/07/22

Repensar a maioria depois da censurapor Rui Teixeira Santos

Quando a oposição apresenta uma moção de censura ao Governo quer significar que, caso tivesse condições parlamentares, a oposição desejaria o derrube do Governo.

É a censura máxima em democracia e só deve ser colocada quando a acção do executivo é de tal maneira insuportável para a oposição que justifica a sua demissão.

Mas essa não era a intenção do PS, ao apresentar a moção esta semana no Parlamento, todos percebemos. Bem pelo contrário, o PS, que se estivesse no poder faria provavelmente o mesmo que Barroso, ou seja, ficar-se-ia pela retórica e apenas disponibilizaria ajuda humanitária findo o conflito e provavelmente legitimada por um voto nas Nações Unidas, o que pretendeu foi marcar o terreno de liderança da oposição, testando nomeadamente uma solução de Frente Popular, eventualmente a construir sob a égide do sampaísmo juntando, numa coligação pré ou pós-eleitoral, eventualmente PS, PCP e BE, e que, até agora, era impensável.

O que ficou claro é que a oposição não quis ir até ao fim, pois de outro modo teria pressionado Sampaio a demitir Barroso, em face da evidente oposição entre ambos em matéria de política externa. Sampaio e o PS não quiseram transformar num conflito institucional o que era um evidente conflito de orientação política, numa matéria onde a opinião do Presidente é decisiva e se espera exista consenso nacional.

E a oposição não quis ir mais longe, nem o Presidente da República quis colocar entraves por agora à estabilidade política, já não por qualquer “diktat” de Bruxelas, como acontecia quando, a contragosto, Sampaio sustentava o governo de Guterres, mas porque os sampaístas estão convencidos que é a partir de meio do mandato que o desgaste de Barroso mais se fará sentir, e que a situação económica arrastará o governo para níveis de popularidade de tal maneira insuportáveis, que o Presidente não terá outra alternativa que não seja demitir o Governo e provocar eleições antecipadas.

E esse é, aliás, na óptica do PS, o “timing” ideal para preparar as presidenciais. Porque a esquerda sabe bem que perderá as presidenciais, se Barroso e a direita estiverem no governo quando elas se realizarem.

A esquerda espera por 2004

Por outro lado, a esquerda espera que, apesar da política a contraciclo do governo de Barroso, a partir de meados de 2004, a retoma da economia internacional poderá proporcionar condições para a retoma interna e que, portanto, nessa altura, tudo deverá fazer para assegurar o seu regresso ao poder. Porque, pensam os estrategas da esquerda, esse será o momento, e também aquele em que Barroso estará mais fragilizado, pois permite fazer coincidir a retoma económica com o regresso do PS ao Governo.

Dentro deste tacticismo político, aliás, bem ao nível do que António Guterres nos habituou, movem-se agora os interesses da esquerda. E, ninguém tenha ilusões quanto à tentação de Jorge Sampaio fazer, como o próprio Guterres fez, que foi o de trair a sua base social de apoio, na esperança da direita, que não votou nele, o apoiar depois. Sampaio, embora seja o Presidente de todos os portugueses, sabe que já não volta a votos e que a História julgará a sua coerência pela herança que deixar.

Quem conhece Sampaio sabe que ele jamais fará como Guterres, que desejou o caos para a esquerda, depois da sua saída. Sampaio tem, aliás, provas dadas, no modo como conduziu a Câmara de Lisboa e como, inclusivamente, assegurou a vitória seguinte da esquerda, com João Soares que, por conta própria, falharia para Santana Lopes a sua reeleição.
Isto quer dizer que, no momento oportuno, Jorge Sampaio não deixará de jogar de acordo com os seus princípios e o seu entendimento do interesse nacional, ou seja, não deixará de criar condições para que depois da sua saída de Belém a esquerda fique no poder. Só isso vale a pena repetir, é coerente com a sua maneira de estar na política.

Assim sendo, a oportunidade destas moções de censura deveria servir à maioria para reflectir sobre o que tem andado a fazer no Governo. Se a aplicar o seu programa ou, pelo contrário, se a cumprir a agenda do PS que, em face da situação económica, abandonou o poder, mas continua a mandar nos Ministérios principais como nas Finanças ou na Segurança Social, enquanto a crise não passa?

Reformas prometidas e não cumpridas

Porque não basta ter agido com inteligência em política externa, jogando do lado do obviamente vencedor e acautelando protagonismo para consumo interno e advertência à Espanha. Passada a crise internacional, demorada apenas, não por falta de poder de fogo da Coligação Internacional, mas porque se pretende evitar efeitos colaterais e a destruição de Bagdad, regressam os problemas nacionais, a necessidade das reformas elencadas no programa eleitoral do PSD, que o País sufragou, mas que infelizmente não vê concretizadas.

Porque não se pode esperar que na insensatez de políticas de contraciclo promovidas pelo Governo, como o aumento de impostos e a venda de activos simbólicos e estratégicos do Estado, o País se reveja, quando as despesas públicas continuaram a aumentar e a recessão económica é mais grave em Portugal que nos outros países. Porque há alternativas e elas ainda por cima estão no programa de governo do maior partido da coligação.

Um ministro que anuncia um conjunto de reformas e, seja por que razão for, não consegue fazer aprovar nenhuma, faz sucessivamente leis inconstitucionais ou vetadas pelo Presidente da República, num Estado democrático e civilizado, no mínimo demite-se.

Mas, coitado, andou o homem uma vida a querer ser ministro e vai agora demitir-se, quando está a adorar sê-lo. Bem pelo contrário, não podendo fazer o que prometeu, põe-se a inventar reformas que não constam do plano do Governo, que são mesmo contraditórias com as políticas do mesmo Governo, e ninguém lhe chama a atenção.

A aldrabice de Bagão

O caso desta semana de Bagão Félix, que mais uma vez viu chumbado o diploma do rendimento mínimo que anunciou como basilar da sua política e que não fez, mas, pelo contrário, anunciou a criminalização dos empresários e o impedimento dos gestores de empresas com dívidas à Segurança Social, medida que jamais Ferro Rodrigues proporia e que nem Lourdes Pintasilgo se lembraria, demonstra bem a nível de insensatez e incompetência a que chegou a falta de coordenação política dentro do Governo.

Estes indivíduos da esquerda católica sempre foram bem mais perigosos que os comunistas, já o sabíamos, desde o tempo dos Governos provisórios. Mas, a maioria não pode estar a querer promover o investimento e a confiança (com o plano Tavares e a dedicação de Cadilhe, Talone ou Líbano Monteiro) e a fazer aos empresários o mesmo que Pina Moura lhes fez (e que justificou uma fuga de capitais de cerca de dois mil milhões de contos de Portugal arruinando de vez a economia de Portugal).

Se, no plano externo, Durão Barroso está a demonstrar o seu profissionalismo, como aliás ficou provado no debate das moções de censura, a maioria governamental está nitidamente com um défice de coordenação política e estratégica, no plano interno, à mercê de ministros incompetentes e que se agarram aos expedientes de uma Administração Pública corrupta e incapaz, infiltrada pela esquerda, e que se aproveita das suas fraquezas e vaidades.

A maioria não pode anunciar umas reformas e depois fazer outras, como o está a fazer Bagão Félix, porque isso é uma aldrabice política. Ferreira Leite ainda teve a desculpa do Plano de Estabilidade e Crescimento. Bagão, ou é incompetente, ou é desonesto, e não percebe que um Governo de centro-direita só perde se começar a governar mais à esquerda que a própria esquerda. Porque, para isso, pensará a esquerda, antes o autêntico, porque pelo menos é coerente.

Porque não foi para isso, pensará o eleitorado de direita, que elegemos este governo. E não basta nomear uns “boys”, como fez Bagão, ou algumas figuras notáveis, como fez Tavares, para se ter uma política.

Portas na hora da verdade

A hora da verdade aproxima-se. Esta maioria tem mais um ano. E Barroso tem que estar consciente que será julgado, não pelo seu protagonismo internacional mas pelo que conseguir fazer da economia nacional e no plano interno.

Ainda por cima o melhor ministro do Governo está manietado, por inveja, culpa própria ou simplesmente interesse táctico. Mas, que o PSD tem que estar consciente desse cenário, nada impedirá, depois, Paulo Portas de se ver livre de Bagão e até do PSD, que sempre o ameaça, para fazer o acordo com o PS, evitando uma alegada Frente Popular, que se viu nas censuras ao Governo desta semana. Uma jogada política ao nível do que Portas já uma vez fez a Monteiro, sempre justificável pela chocante incoerência ideológica da actual maioria e até porque, quer se queira, quer não, o PP esteve sempre mais à vontade no governo com o PS, do que com o PSD.

Uma solução, aliás, que ainda por cima poderia resolver a questão da autonomia estratégica do CDS/PP, que passaria a ser o “partido de charneira” que os seus fundadores sempre defenderam, agora que, pela importância que Portas deu à Nova Democracia de Monteiro e pela resposta de José Luís Arnault contra a fusão dos partidos da maioria, o CDS/PP só pode esperar, no quadro da actual coligação, ver reduzir-se, qual “beijo da morte”, a sua base social de apoio.

Estamos no plano dos cenários e não da irresponsável instabilidade política, que nesta conjuntura só prejudicariam o interesse de Portugal. Mas Barroso tem que começar a desenhar já os contornos da sua defesa, consciente que, até agora, tem estado no poder, não apenas porque está legitimado pelos votos da maioria, mas porque Jorge Sampaio lhe deu e manteve a confiança política.

Petróleo pode atingir 60 a 80 dólares o barril

O preço do barril de petróleo pode atingir entre 60 a 80 dólares em caso de uma guerra prolongada no Iraque, indica um estudo realizado pela União Europeia e divulgado quarta-feira pela comissária europeia dos Transportes e Energia, Loyola de Palacio.

Segundo a Infobolsa, a União Europeia entende que a guerra não constitui uma ameaça para as reservas petrolíferas da União Europeia e caso o conflito no Iraque seja rápido o preço do petróleo pode permanecer entre os 25 a 30 dólares o barril.

No cenário de a guerra ser mais prolongada, durante dois a três meses, o preço do petróleo pode subir para 50 dólares e que o mercado será dominado pela volatilidade, mais por especulação do que por efeitos reais da guerra.

Os estudo revela que apesar de os países europeus apenas importam do Iraque 3,5 por cento do petróleo consumido, mas as reservas do país de Saddam Hussein são as segundas maiores do mundo.

A UE considera que a interrupção na exportação de petróleo por parte do Iraque pode ser compensada pelo aumento na produção por outros países da OPEP, mas Loyola de Palacio quer que os países aumentem a capacidade das reservas para consumo, passando de 90 para 120 dias.

FMI admite recessão com guerra longa no Iraque

O Fundo Monetário Internacional (FMI) admite a possibilidade de recessão económica global, caso a guerra no Iraque seja prolongada, impulsionando os preços do petróleo e afectando a confiança dos consumidores, reconheceu o director da instituição em entrevista à revista alemã Wirtschaftswoche, citada pela Infobolsa.

Horst Koehler referiu que em caso de um conflito prolongado, não podemos excluir a possibilidade de uma recessão global.

Esperamos um crescimento económico global de cerca de 3 por cento este ano, o que pressupõe uma guerra curta no Iraque e uma recuperação gradual na segunda metade do ano, referiu ainda o responsável, para quem mesmo um conflito curto funcionará como um obstáculo ao crescimento económico. Além disso, o FMI considera que existe espaço para baixar mais as taxas de juro.

No panorama da economia europeia, o responsável afirmou que infelizmente, tivemos de baixar as estimativas para a Europa e adiantou ainda que a Alemanha, a maior economia do Velho Continente, deverá registar um crescimento significativamente inferior ao 1 por cento previsto pelo Governo.

Koehler afirmou ainda não estar preocupado com a valorização do euro nas exportações alemãs, já que isso será a consequência lógica do elevado défice dos Estados Unidos, apesar de ressalvar que um dólar em queda livre seria indesejável e que, a acontecer, os bancos centrais teriam de tomar as medidas necessárias para reparar a situação.

Um Governo de combatepor Pedro Cid

A guerra segue o seu caminho. Mediática na amplitude que os contendores entenderem conveniente.

Seguramente muito restrita na informação substantiva do ponto de vista militar. Apesar da pressão das parabólicas e da vontade dos jornalistas, nunca saberemos com exactidão, ou com absoluto rigor, o que se passa, em cada momento, no teatro da guerra.

Só conheceremos o desfecho final, quando ele ocorrer. Haverá quem possa dar mais ou menos informações de acordo com as conveniências dos beligerantes. Contudo, haverá, sempre, a face oculta da guerra.

Basta dizer que, de certa forma, os jornalistas, correspondentes de guerra ou não, correndo maiores ou menores riscos, estão sempre dependentes dos aparelhos militares. O que, como se compreende, é fortemente limitativo do ponto de vista jornalístico.

Em Portugal, a guerra inquinou o ambiente político. O PS e o PSD divergiram em pontos essenciais da política externa, fazendo tábua rasa de um consenso tão velho quanto os 29 anos que levamos de democracia. Houve uma aproximação tácita de todos os partidos de esquerda, com uma liderança difusa, mas onde o Bloco de Esquerda surge claramente como locomotiva, perante a incomodidade do sector moderado do Partido Socialista.

Este é um facto novo na política portuguesa, que já se vinha desenhando com certa nitidez, mas agora assumido plenamente por Ferro Rodrigues, para surpresa de muita gente. A questão está agora em saber como vai funcionar essa coligação de esquerda em termos de poder. Fica, de momento, por esclarecer, se esta convergência na censura ao Governo é uma mera manobra táctica do PS, ou se se insere numa estratégia de médio prazo, num empenhamento colectivo para derrubar o actual Governo, de preferência antes do termo da legislatura, contando, eventualmente, com a cumplicidade discreta do actual Presidente da República.

Cumpre reconhecer que os tempos não são fáceis para o Governo, nem para Durão Barroso e mais difíceis se tornarão se a guerra se prolongar muito para além do previsto. Há duas frentes políticas muito exigentes diria quase absorventes – a política externa e a situação interna do País. O primeiro-ministro não pode perder de vista o que se passa dentro deste pequeno rectângulo continental e das duas regiões autónomas.

Infelizmente, para Durão Barroso o seu Governo original não é um supermodelo de competências, e há ministérios onde as tensões de topo são já indisfarçáveis. O Governo deve apurar, agora, mais do que nunca, a sua sensibilidade social. O aumento de desemprego origina gastos muito vultuosos no subsídio do desemprego. Então, talvez seja justo e oportuno repensar como é que essas verbas podem ser utilizadas, não para subsidiar desempregados mas para criar mais emprego.

Apesar da rigidez da ministra das Finanças, em épocas de crise, as obras públicas são um pilar essencial, como fonte de emprego. E nessa área ainda temos muito para fazer.

Há conceitos inovadores na política do Governo, como a chamada diplomacia económica. Mas como entender que se projecte encerrar o consulado português de Porto Alegre, onde estão sediadas empresas portuguesas, e que se situa estrategicamente, de tal modo que há quem a apelide Porto Alegre a capital do Mercosul?

E o consulado português de Hong-Kong, também não tem justificação o seu encerramento. É uma visão redutora falar-se da sua proximidade com Macau – é diferente a todos os títulos, desde a génese até à sua vocação como ponto nuclear de representação dos interesses portugueses.

E já se analisaram, com rigor, os efeitos desastrosos da política junto das comunidades portuguesas que está a ser seguida pelo secretário de Estado, José Cesário, de quem aliás sou amigo e por quem tenho uma enorme consideração pessoal? Que ideia é essa de criar dois Conselhos das Comunidades – um de eleitos e outro de nomeados? E que dizer das questões relativas aos Transportes Marítimos, que tanto preocupam o Secretário de Estado, Vieira de Castro, e que revelam, porventura, má informação e deficiente coordenação?

Situações excepcionais podem justificar decisões excepcionais. É o primeiro ministro que tem a responsabilidade de fazer a avaliação das situações decorrentes da conjuntura internacional. Em todo o caso, creio poder dizer que o País precisa de um verdadeiro Governo de combate, onde a negligência e sobretudo a incompetência não possam ter lugar.

Se a guerra se prolongar e com isso for retardada a retoma da economia por que todos ansiamos, talvez se justifique a adaptação da estrutura do Governo à própria crise, com uma antecipada remodelação, avalizada por uma moção de confiança.

O primeiro-ministro precisa de ter a capacidade para recrutar três ou quatro grandes figuras da vida portuguesa, mesmo independentes, reduzir as secretarias de Estado, eliminar alguns parasitas que já se sentam à mesa do Orçamento.

A situação excepcional justificará, porventura, a indicação de um vice-primeiro-ministro político, com especial sensibilidade para as questões sociais e económicas.

Durão Barroso já enfileira nos estadistas que a democracia forjou. Muitos se admiram com a sua coragem, sentido de determinação, capacidade de decisão e de liderança. Seria injusto que fosse a guerra a derrotar os seus objectivos de implantar o novo modelo que idealizou para o País.

“Primavera” curda à espera de desabrochar

Há treze anos que os curdos iraquianos vivem uma espécie de “primavera” na sua sociedade. Depois de décadas sob o jugo de Bagdad, o “protectorado” da ONU no norte do Iraque permitiu aos curdos desenvolverem um “oásis” político, económico e social, numa região composta por regimes autoritários.

Treze anos depois da implementação de uma zona de segurança no norte do Iraque, os curdos voltam a enfrentar a potencial ira vinda de Bagdad. Hoje, os 5 milhões de curdos que habitam naquela região encontram-se literalmente entalados entre as forças de Saddam Hussein e as tropas governamentais de Ancara.

Mas, se as primeiras poderão ficar inoperativas assim que o ditador de Bagdad caia aos pés da coligação anglo-americana, já o mesmo não se poderá aplicar aos soldados turcos. Estes poderão estar na iminência de invadir o curdistão iraquiano, naquilo que poderia ser visto pela Turquia como uma forma de resolver um problema de décadas e que tem provocado ondas de terrorismo naquele país.

Aliás, tem sido esta incógnita que estará a complicar a estratégia de Washington e alimentar os piores receios dos dirigentes e populares curdos. Conscientes do perigo que correm perante os intentos de Ancara, os curdos parecem estar dispostos a defender o seu pedaço de território a todo o custo. Como escrevia há uns anos na revista “Grande Reportagem”, Peter Strandberg classificava o curdistão como a “terra da insolência”, que jamais se vergaria às vontades do Governo turco.

Foi neste espírito de resistência que em 1978 Abudllah Ocalan, um antigo estudante da Universidade de Ancara, fundou o PKK (antigo partido de inspiração marxista) para, seis anos mais tarde, iniciar uma campanha terrorista contra a Turquia. Ocalan tornou-se a partir de 1984 o inimigo público número um de Ancara, mas também o símbolo de libertação do povo curdo. Conotado como uma organização terrorista, o PKK foi estabelecendo relações com outras organizações curdas como o ARGK (Exército Popular do Curdistão), o ERNK (Frente Popular do Curdistão), entre outras.

Também no exterior o PKK foi estabelecendo ligações, nomeadamente no Médio Oriente, mais especificamente no Líbano, no vale de Beka, controlado pelo exército sírio. Finalmente, no ano passado, o PKK mudou o nome para KADEK (Congresso para a Libertação e Democracia no Curdistão), numa estratégia de reformulação do partido, depois do histórico líder Ocalan ter sido preso em 1999 no Quénia.

Na arena política, o KDP e o PUK são os partidos de maior relevo no curdistão iraquiano, tendo o primeiro vencido as eleições legislativas de 12 de Março de 1992, as primeiras depois daquele território ter adquirido autonomia face a Bagdad, com a aplicação da resolução 688 das Nações Unidas, em 1991.

Actualmente, o KDP e o PUK partilham o mesmo número de lugares no parlamento curdo e são as frentes políticas das reivindicações independentistas do curdistão iraquiano.

Há mais de meio século que os curdos do norte do Iraque se têm tentado libertar do jugo de Bagdad, no entanto, esses esforços revelaram-se sempre infrutíferos e foram muitas vezes castigados com duras represálias pelas forças de Saddam, como foi exemplo o massacre de Halajba, em 1988, no qual morreram 5 mil curdos.

Com a invasão iraquiana do Kuwait, em 1990, e a consequente guerra do Golfo, os curdos beneficiaram de uma espécie de “protectorado” das Nações Unidas, que lhes permitiu na última década desenvolver um país dentro de outro país, onde, na verdade, se distinguiu dos outros “curdistões”, por seguir uma linha democrática, com liberdade de expressão e tolerância religiosa e às minorias étnicas.

Este pequeno “oásis” começou a ser criado numa primeira fase em 1991, com a Frente Unida do Curdistão (coligação de seis partidos), e depois das eleições de 1992, nas quais o KDP de Barzani obteve 51 assentos do parlamento, contra os 49 do PUK de Talabani. Em Julho de 1992 é então formado um Governo de unidade nacional, que provocou imediatamente reuniões trimestrais dos ministros dos Negócios Estrangeiro de Damasco, de Teerão e de Ancara para “vigiar a situação no norte do Iraque”.

Pela primeira vez depois de mais de um século, os curdos administram, por um tão longo período de tempo, uma parte do seu território histórico. Na verdade, os últimos anos foram benéficos para a sociedade curda iraquiana, nos campos político, económico e cultural. “E, no conjunto, eles saem-se bem.

Esta primavera curda suscita bastantes esperanças junto dos 25 a 30 milhões de curdos que vivem dispersos na Turquia, Irão e Síria”, escrevia Kendal Nezan, Presidente do Instituto Curdo de Paris, no “Le Monde Diplomatique”, em Agosto de 2001.