A guerra segue o seu caminho. Mediática na amplitude que os contendores entenderem conveniente.
Seguramente muito restrita na informação substantiva do ponto de vista militar. Apesar da pressão das parabólicas e da vontade dos jornalistas, nunca saberemos com exactidão, ou com absoluto rigor, o que se passa, em cada momento, no teatro da guerra.
Só conheceremos o desfecho final, quando ele ocorrer. Haverá quem possa dar mais ou menos informações de acordo com as conveniências dos beligerantes. Contudo, haverá, sempre, a face oculta da guerra.
Basta dizer que, de certa forma, os jornalistas, correspondentes de guerra ou não, correndo maiores ou menores riscos, estão sempre dependentes dos aparelhos militares. O que, como se compreende, é fortemente limitativo do ponto de vista jornalístico.
Em Portugal, a guerra inquinou o ambiente político. O PS e o PSD divergiram em pontos essenciais da política externa, fazendo tábua rasa de um consenso tão velho quanto os 29 anos que levamos de democracia. Houve uma aproximação tácita de todos os partidos de esquerda, com uma liderança difusa, mas onde o Bloco de Esquerda surge claramente como locomotiva, perante a incomodidade do sector moderado do Partido Socialista.
Este é um facto novo na política portuguesa, que já se vinha desenhando com certa nitidez, mas agora assumido plenamente por Ferro Rodrigues, para surpresa de muita gente. A questão está agora em saber como vai funcionar essa coligação de esquerda em termos de poder. Fica, de momento, por esclarecer, se esta convergência na censura ao Governo é uma mera manobra táctica do PS, ou se se insere numa estratégia de médio prazo, num empenhamento colectivo para derrubar o actual Governo, de preferência antes do termo da legislatura, contando, eventualmente, com a cumplicidade discreta do actual Presidente da República.
Cumpre reconhecer que os tempos não são fáceis para o Governo, nem para Durão Barroso e mais difíceis se tornarão se a guerra se prolongar muito para além do previsto. Há duas frentes políticas muito exigentes diria quase absorventes – a política externa e a situação interna do País. O primeiro-ministro não pode perder de vista o que se passa dentro deste pequeno rectângulo continental e das duas regiões autónomas.
Infelizmente, para Durão Barroso o seu Governo original não é um supermodelo de competências, e há ministérios onde as tensões de topo são já indisfarçáveis. O Governo deve apurar, agora, mais do que nunca, a sua sensibilidade social. O aumento de desemprego origina gastos muito vultuosos no subsídio do desemprego. Então, talvez seja justo e oportuno repensar como é que essas verbas podem ser utilizadas, não para subsidiar desempregados mas para criar mais emprego.
Apesar da rigidez da ministra das Finanças, em épocas de crise, as obras públicas são um pilar essencial, como fonte de emprego. E nessa área ainda temos muito para fazer.
Há conceitos inovadores na política do Governo, como a chamada diplomacia económica. Mas como entender que se projecte encerrar o consulado português de Porto Alegre, onde estão sediadas empresas portuguesas, e que se situa estrategicamente, de tal modo que há quem a apelide Porto Alegre a capital do Mercosul?
E o consulado português de Hong-Kong, também não tem justificação o seu encerramento. É uma visão redutora falar-se da sua proximidade com Macau – é diferente a todos os títulos, desde a génese até à sua vocação como ponto nuclear de representação dos interesses portugueses.
E já se analisaram, com rigor, os efeitos desastrosos da política junto das comunidades portuguesas que está a ser seguida pelo secretário de Estado, José Cesário, de quem aliás sou amigo e por quem tenho uma enorme consideração pessoal? Que ideia é essa de criar dois Conselhos das Comunidades – um de eleitos e outro de nomeados? E que dizer das questões relativas aos Transportes Marítimos, que tanto preocupam o Secretário de Estado, Vieira de Castro, e que revelam, porventura, má informação e deficiente coordenação?
Situações excepcionais podem justificar decisões excepcionais. É o primeiro ministro que tem a responsabilidade de fazer a avaliação das situações decorrentes da conjuntura internacional. Em todo o caso, creio poder dizer que o País precisa de um verdadeiro Governo de combate, onde a negligência e sobretudo a incompetência não possam ter lugar.
Se a guerra se prolongar e com isso for retardada a retoma da economia por que todos ansiamos, talvez se justifique a adaptação da estrutura do Governo à própria crise, com uma antecipada remodelação, avalizada por uma moção de confiança.
O primeiro-ministro precisa de ter a capacidade para recrutar três ou quatro grandes figuras da vida portuguesa, mesmo independentes, reduzir as secretarias de Estado, eliminar alguns parasitas que já se sentam à mesa do Orçamento.
A situação excepcional justificará, porventura, a indicação de um vice-primeiro-ministro político, com especial sensibilidade para as questões sociais e económicas.
Durão Barroso já enfileira nos estadistas que a democracia forjou. Muitos se admiram com a sua coragem, sentido de determinação, capacidade de decisão e de liderança. Seria injusto que fosse a guerra a derrotar os seus objectivos de implantar o novo modelo que idealizou para o País.