Ou Cavaco se adapta aos novos tempos e diminui o nível
de cooperação estratégica com Sócrates, ou não é liquido que o PSD de Menezes lhe dê um apoio efectivo
à recandidatura
Luís Filipe Menezes parte de expectativas muito baixas, o que faz com que os seus resultados futuros sejam muito promissores. Além do mais, tem a experiência de Santana Lopes para aprender com os erros passados. A receita passa por Menezes fazer quase tudo diferente de Santana. Seguir o seu próprio caminho, não se deixar levar por amiguismos, não fazer viragens de 180 graus nem concessões abissais.
A história de Santana não é a de Menezes. Se, no futuro, com as muitas vicissitudes que o tempo costuma trazer, o acaso permita que Santana ajuste contas com a história, Menezes até pode estar lá para dar um empurrãozinho. Mas nada deve fazer para forçar as coisas. Os santanistas mais significativos, como Rui Gomes da Silva e Helena Lopes da Costa, estão com Menezes. Este é um valor acrescentando que o novo líder deve gerir cuidadosamente. Impedindo que se forme a impressão de que Gomes da Silva e Lopes da Costa são uma espécie de mandatários de Santana, quaisquer que sejam os seus cargos futuros. De forma a virar a página…
Os tempos correm de feição a Menezes. O próprio facto de não ser deputado e não poder ser líder parlamentar pode ser utilizado a seu favor. No Parlamento, agora com debates de quinze em quinze dias, Menezes não precisa de se expôr, de ficar sujeito a avaliações com Sócrates, na posição sempre ingrata de quem está na oposição. O palco pode ser dele noutro local. Menezes não tem se preocupar com o que foi a vida infernal de Ribeiro e Castro. O autarca de Gaia sempre teve direito aos holofotes.
Até uma nova “gaffe” de Mário Soares veio revelar-se feliz para Luís Filipe Menezes. O ex-presidente da República considerou uma “desgraça” o que se passou no PSD. Depois sentiu-se no dever de emendar a mão. No final, Menezes já era muito amigo dele, o autarca de Gaia até tinha proposto Soares para nome de rua e o velho líder socialista contrapôs Cal Brandão.
Se fizer as coisas bem, Menezes até pode ser um caso de sucesso. Mesmo se perder para José Sócrates nas eleições legislativas de 2009, até com maioria absoluta do PS, a sua liderança pode não ficar em causa. Imagine-se que Menezes alcança um “score” muito acima dos 30 por por cento, beneficiando do efeito novidade, do voto de descontentamento com Sócrates, do voto útil do PP no PSD. Menezes ficaria a grande distância do resultado de Santana Lopes em 2005, o que contribuiria mais para o fortalecer. Recorde-se o caso de Ferro Rodrigues nas legislativas de 2002, em que o hoje embaixador na OCDE ficou a apenas dois pontos percentuais de Durão Barroso, acabando por continuar na liderança do PS (depois hipotecada por causa do caso Casa Pia).
Para além da disputa que fará com Sócrates em 2009, Menezes tem muitos outros trunfos para jogar. Apesar da sua promessa de serem as bases a decidir, é ele quem vai escolher ou dar luz verde aos candidatos às eleições europeias e às municipais, pelo menos no que se refere às grandes cidades. Também é ele, naturalmente, quem vai referendar as listas de deputados nas legislativas de 2009. Nas presidenciais de 2011, é igualmente Menezes quem vai ter uma palavra a dizer na recandidatura de Cavaco Silva.
O papel de Cavaco. Uma mistura paradoxal entre a necessidade de ajudar Marques Mendes e o excesso de confiança na sua vitória, fez Cavaco Silva não ter algumas precauções. A luz verde que teve que dar para Alexandre Relvas ser o mandatário da candidatura de Marques Mendes (depois de ter sido seu director de campanha) expôs a Presidência da República desnecessariamente. O mais surpreendente é que esta atitude nem se enquadra no estilo de Cavaco, muito sensato e prudente.
Cavaco tem tido, na Presidência da República, encargos excessivos. Quase como se tivesse de expiar alguma coisa. A sua coabitação de sonho com Sócrates é muito castrante e está na base, aliás, de boa parte dos problemas que Marques Mendes sentiu durante o seu mandato. O envolvimento de Cavaco nas directas, através de Relvas e de outros cavaquistas insuspeitos, pode ser visto, até, como uma forma de compensação política e psicológica face aos danos provocados a Mendes. Ora a ciência política e a sua estratégia não se compadece, muitas vezes, com mecanismos que lhe são exteriores.
Cavaco apresentou-se às presidenciais, em 2006, com o objectivo de fazer dois mandatos. Voluntária ou involuntariamente, o desempenho de Cavaco em Belém foi até hoje no sentido de ser reeleito com os votos do PSD e a não oposição do PS, passando pela não apresentação de um candidato próprio dos socialistas, como aconteceu com a reeleição de Mário Soares em 1991. Ora, a eleição de Menezes faz com que o que parecia seguríssimo há uma semana, deixe de o ser. Ou Cavaco se adapta aos novos tempos e diminui o nível de cooperação estratégica com Sócrates, ou não é liquido que o PSD de Menezes lhe dê um apoio efectivo à recandidatura. Se tal acontecesse, era ingrato para Cavaco apresentar-se em 2011 com o PS como o único entusiasta da sua reeleição.
Por sua vez, caso decida dar sinais de distanciamento de Sócrates, a posição do Presidente da República também pode não ser agradável, porque a vitória não é certa (e Cavaco gosta de coisas quase garantidas). No entanto, se ganhar o segundo mandato, o triunfo será mais gratificante e o PSD poderá ter finalmente um Presidente da República em Belém. Verdadeiramente seu.
A eleição de Menezes veio tornar tudo possível. Até com Santana Lopes. Para líder parlamentar do PSD, Santana não faz sentido. Só ofuscaria Menezes e podia levar, quase inevitavelmente para o Parlamento, a carga do seu passado. Santana está mortinho há dois anos para confrontar Sócrates. Ora esta guerra pessoal e política ficou lá atrás e interessa a Menezes afastar-se dela a sete pés. Mas já a hipótese de Santana ter uma luz intermitente do PSD para cumprir um dos seus sonhos e ser candidato a Belém, não deve ser descartada (mesmo com a candidatura ao lado de Cavaco). Ora, na perspectiva de Menezes, a candidatura de Santana em 2011 pode cumprir, se for caso disso, dois desideratos. Dar uma bofetada de luva branca a Cavaco e compensar Santana. Se Cavaco voltasse a ganhar Belém, tudo como dantes em relação ao actual PR. Por sua vez Santana teria, neste cenário, a sua prova dos nove em matéria de derrotas. Já se Santana ganhasse, Menezes ficaria como padrinho desse sonho realizado.