Alguns dirigentes social-democratas tinham a secreta esperança de que, no debate mensal de ontem com o primeiro-ministro, se registasse uma “vitória” ou um “destaque especial com alguns louros políticos” para Marques Mendes. Sobretudo, porque o PSD recebeu durante esta semana um conforto do Presidente da República, em relação à Ota. Recorda-se que Cavaco Silva pediu debate, nomeadamente, no Parlamento, para que se possa gerar um consenso tão alargado quanto possível sobre, como, quando, onde e se se avançará para a construção de um novo grande aeroporto em Portugal. Afinal, José Sócrates pôs K.O. Marques Mendes. E na bancada social-democrata, mesmo entre os que se opõem internamente ao actual líder, o ambiente era bastante denso. O PSD saiu quase humilhado desse debate… Sobretudo, a partir do momento em que o líder da bancada do PS, Alberto Martins, veio tornar público um documento assinado por Durão Barroso (então primeiro-ministro) e pelo próprio Marques Mendes, que se referia a uma resolução do Conselho de Ministros sobre a continuação do apoio à futura construção do aeroporto na Ota.
Ontem, no debate mensal, e em relação a Marques Mendes, o primeiro-ministro foi absolutamente implacável na humilhação política. Acresce até que José Sócrates abriu, por parte do PS, a campanha eleitoral em Lisboa. E isso, de acordo com opiniões recolhidas em cima do debate, “pode ser uma faca de dois gumes”, mas, de acordo com as mesmas fontes, faz do novo aeroporto (ou do fim do aeroporto de Lisboa) um tema incontornável da próxima campanha eleitoral para a Câmara Municipal da nossa capital.
Quer Fernando Negrão, ao declarar, há poucos dias que, em seu entender, era impensável que Lisboa ficasse sem um aeroporto de proximidade, quer Helena Roseta, ao afirmar que os lisboetas não foram consultados sobre a desactivação da Portela, tiveram a “arte” de colocar, como tema fulcral a “deslocalização” (como ontem lhe chamou Paulo Portas, no já aludido debate mensal) do aeroporto de Lisboa, na campanha eleitoral que se avizinha.
O próprio António Costa já se sentiu “tocado” com esta questão ao manifestar a opinião que os candidatos devem preocupar-se com os problemas da cidade de Lisboa, em vez de debaterem questões nacionais (citação literal), o que levou já o PSD a dizer qualquer coisa como “então Lisboa ficar sem aeroporto de proximidade não é um problema de Lisboa?”…
Não se conhecem, pelo menos para já, posições do PCP e do Bloco de Esquerda sobre esta matéria e da sua disponibilidade para a debaterem na campanha que se avizinha. Ontem, no Parlamento, ficou claro que o CDS/PP defende a manutenção da Portela, com novos investimentos e com um plano de reagrupamento aéreo que envolvessem, as instalações de Figo Maduro e do Montijo. Está encontrado o grande tema para os debates que se avizinham.
Voltando ao líder do PSD…
Hoje, à noite, Marques Mendes vai estar em Leiria para presidir a mais uma sessão dedicada à reforma do programa do PSD, nas suas múltiplas vertentes. O tema é “Economia e empresas: Portugal competitivo?” com duas intervenções de anteriores ministros das Finanças, com posicionamentos diferentes, ainda ambos ligados ao PSD – João Salgueiro (ministro das Finanças de Pinto Balsemão no início dos anos 80) e Eduardo Catroga (titular da mesma pasta em meados dos anos 90). Esta semana, diversos ex-ministros e outros responsáveis pelo sector da Educação também debateram estes temas, para a mesma finalidade, ou seja, para uma reflexão sobre o futuro programa do partido. Um dos participantes disse-nos que, apesar de não ter havido “nada de especialmente apelativo, havia bastante gente”.
Prossegue, assim, com tranquilidade, uma acção relevante que foi inscrita como um dos objectivos do mandato de Marques Mendes. Cumpri-lo-á até ao fim?
O seu destino político está, neste momento, dependente do resultado que o PSD obtiver nas eleições intercalares de Lisboa. Um mau resultado desencadeia os mecanismos para novo confronto eleitoral no principal partido de oposição (ontem à tarde, depois do “massacre” sofrido por Marques Mendes e infligido por José Sócrates no Parlamento, alguns deputados social-democratas disseram ao SEMANÁRIO que é “chegada a hora de encontrar uma alternativa ao actual líder,” acrescentando mesmo que “é difícil fazer pior”. A pensar nisso está já Luís Filipe Menezes, que em cada crónica semanal que escreve no “Correio da Manhã” não esconde o seu desejo de ascender, tão depressa quanto possível, à liderança dos social-democratas. Consegui-lo-á em breve?
A pergunta tem razão de ser, uma vez que uma nova liderança é tema que é resolvido exclusivamente intramuros, isto é, pelo universo dos militantes do PSD com capacidade eleitoral. Ora, a contagem de espingardas ainda não começou e, ao longo destes quase dois anos, Marques Mendes soube estabelecer relações de muita proximidade com os militantes. Chega para garantir a sua blindagem contra aqueles que o querem desalojar?
“Pelo menos ajuda alguma coisa – comentário irónico de um dirigente próximo de Marques Mendes…
É que o actual líder desdobra-se em presenças, junto das bases e em todas as suas intervenções não lhe escapa a crítica azeda ao modo como o PS e José Sócrates estão a governar o País. Ainda há dias proclamava, em reunião com militantes, “que é preciso encontrar um novo modelo de governação, sob pena de o País não nos levar a sério e não sairmos da cepa torta”. Ao mesmo tempo aconselhava os seus críticos a abandonar “ruídos internos” para que se não diga “se eles não se entendem dentro do partido, como é que os eleitores podem confiar no PSD para governar o País”.
Este é conselho que os seus críticos não querem assumir, exceptuando-se o núcleo barrosista que tem preferido o silêncio ou uma intervenção discreta, melhor dizendo, uma oposição de bastidores, com uma ou outra excepção e colaboração com Marques Mendes, sem perder o contacto e a solidariedade em relação aos seus membros. Fazer esta anotação tem algum relevo, já que os barrosistas (os notáveis e os militantes que lhes são afectos) podem ser determinantes na escolha do futuro líder do PSD, que vier a ser eleito antes das eleições de 2009, seja, num processo desencadeado a seguir ao escrutínio de Lisboa, seja depois de terminado o actual mandato de Marques Mendes. Este grupo, onde se aconchegam muitos antigos membros do Governo, pode fazer sair do seu seio uma personalidade que se abalance a candidatar-se à liderança do partido e os seus membros dizem, embora à boca pequena, que sabem isso e querem ser determinantes nas soluções de direcção que tenham de ser esclarecidas.
Marques Mendes parece aceitar que, depois de 15 de Julho, os acontecimentos se vão precipitar no PSD e agitar o partido num novo “Verão Quente”, com tradução prática em Setembro ou Outubro. Será assim? É o que estamos para ver. Mas o que já vimos é que Marques Mendes não só tem o campo de acção absolutamente minado pelos seus adversários (os internos e os externos), como o seu espaço de intervenção se assemelha (como se viu ontem na Assembleia da República) a um verdadeiro calvário. Resistirá?!…