2025/06/26

Apesar da “estocada” de Sócrates Marques Mendes resiste, resiste…

“Eu não quero que o PSD mude, por mim está bem assim” – disse o primeiro-ministro no debate mensal de anteontem, na Assembleia da República, no meio de um diálogo crispado com o líder social-democrata, a propósito da Ota. Esta frase indignou a direcção política do maior partido da oposição e foi sublinhada pelos críticos internos, dizendo que se tratou de uma “estocada” mortal para Marques Mendes. E dizem mais, que até agora, nenhum primeiro-ministro em funções ousou ir tão longe numa apreciação interna da vida de um partido com vocação de poder.

Ninguém diria, perante o modo desabrido e violento do ponto de vista da linguagem utilizada com que se confrontaram no Parlamento que Marques Mendes e José Sócrates são os mesmos dirigentes que volta e meia se encontram para negociar ou para trocar impressões sobre a política portuguesa nos mais diversos patamares, não havendo notícia de qualquer altercação entre ambos nesses encontro, no âmbito da política quotidiana. Com efeito, são muitos e frequentes os contactos entre o primeiro-ministro, o líder do PSD, porventura muitos deles nem são noticiados. Mas, por exemplo, a última edição do “Povo Livre” refere, a certa altura: “No passado dia 6 o líder do PSD Marques Mendes elogiou o esforço da Comissão Europeia para criar um mercado europeu de energia e adiantou que o Governo português terá o seu apoio se seguir a linha defendida por Bruxelas.” A esta notícia acrescenta-se o seguinte: “As declarações de Marques Mendes foram proferidas após ter sido recebido pelo primeiro-ministro José Sócrates, em S. Bento, encontro que durou hora e meia e que se destinou a preparar a próxima cimeira europeia.”
Evidentemente que há divergências de fundo, que uma coisa é a liturgia parlamentar, o comportamento público sob o escrutínio atento da comunicação social e do público em geral, outra é o tratamento das questões de Estado dentro dos gabinetes.
Como quer que seja, em termos públicos, nunca, nem nos célebres e confrangedores (para Durão Barroso) entre António Guterres e o hoje presidente da Comissão Europeia, ao tempo líder do PSD, se tinha ido tão longe no confronto entre dois dirigentes políticos com tão elevado grau de responsabilidades.
O facto poderia ser meramente conjuntural, não fora a circunstância, penosa, de uma luta sem quartel que círculos do PSD desencadeiam contra Marques Mendes e as crises, que repercutem, objectivamente na vida dos social-democratas, ou seja, a situação de indefinição que se vive na Câmara de Lisboa, onde rumores não confirmados, informações cruzadas e os mais variados boatos se misturam nos últimos dias com muita insistência. Por outro lado, a crise do CDS acaba por ser seguida com alguma apreensão, ainda que seja um factor externo à vida do PSD.

Os cenários de Lisboa

É sempre difícil fazer a abordagem de assuntos que, pela sua própria natureza, estão sob investigação judicial e, nesse âmbito, sob segredo de justiça. Mas não é possível fugir a eles, quando se dá conta de que estão outra vez a inquinar relações e a contribuir para paralisar ainda mais o funcionamento da maior autarquia do País.
Garantem alguns meios que os próximos dias, até meio da próxima semana, muita informação (boatos, rumores ou conhecimento antecipado de factos ainda ocultos) será deslindada, e então se saberá se o actual quadro se mantém ou se há alterações de fundo e de que teor.
Vale a pena, em todo o caso, referir que o SEMANÁRIO pôde comprovar um desconforto em várias forças políticas pela situação que se vive na Câmara de Lisboa, ao ponto de voltar a reequacionarem-se alguns cenários que podem ocorrer perante desenvolvimentos resultantes de conclusões perante as investigações em curso.
Por exemplo: o cenário da queda de Carmona Rodrigues voltou a ser referenciado em vários círculos, nomeadamente pelo PSD. É certo que tal cenário só poderia resultar de uma de duas razões: a demissão voluntária (ou induzida…) do autarca ou a demissão forçada por qualquer facto eventualmente resultante das investigações em curso. Num caso ou noutro, pelo menos num primeiro momento, e tal como o SEMANÁRIO escreveu, há já algum tempo, a Presidência da Câmara de Lisboa seria assumida por Marina Ferreira, vereadora e recém-vice-presidente, logo após a saída de Fontão de Carvalho. O PSD aposta neste cenário de contingência, para evitar eleições intercalares. Do ponto de vista legal isso é absolutamente possível, sendo que também legitima a opção política e essa parece tomada. Ainda assim, o Executivo camarário pode cair…

A importância de Maria José…

A crise que se vive no seio do CDS/PP pode, por ironia do destino, ter uma enorme repercussão na Câmara de Lisboa, sobretudo perante o cenário (que alguns meios, de várias forças políticas, julgam provável para muito breve) de saída de Carmona Rodrigues. Vale a pena uma explanação sucinta sobre este tema.
Maria José Nogueira Pinto anunciou que pode estar iminente a sua saída do partido em face dos acontecimentos do último Conselho Nacional. Saia, ou não saia, em qualquer caso o seu protagonismo no interior do CDS tenderá a diminuir, por força da exposição sofrida e das atitudes que assumiu e que não foram do agrado das partes em litígio. Apesar de defender Nogueira Pinto, pelos ataques e vexames de que terá sido alvo no interior do último Conselho Nacional, Ribeiro e Castro não se coibiu de dizer que “nem sempre concordou com as decisões tomadas pela ainda presidente do Conselho Nacional”.
Ora Maria José Nogueira Pinto é vereadora da Câmara Municipal de Lisboa. Foi efémero o acordo que celebrou com Carmona Rodrigues, mas nada impede Marina Ferreira, se ascender à presidência da Câmara, voltar a negociar um acordo político com Maria José Nogueira Pinto, partindo do princípio de que, deixando o CDS, continuará como vereadora, na situação de independente. Tal acordo permitiria que o Executivo da Câmara voltasse à situação de maioria absoluta e, nesse sentido, o PSD blindaria a hipótese de recurso a eleições intercalares que não deseja e que tudo fará para evitar.
Permanece, porém, o cenário simétrico, isto é, PSD e Marina Ferreira (ou ainda Carmona Rodrigues, se se mantiver) não conseguirem um acordo político com Maria José Nogueira Pinto, então é a oposição que detém maioria absoluta, como neste momento e nesse caso, a ponderação política dos outros partidos será determinante para manter ou fazer cair o Executivo da Câmara. Dito de outra maneira: se os vereadores do PS, do PCP, do Bloco de Esquerda e Maria José Nogueira Pinto, em nome do CDS ou dele desvinculada, se demitirem em bloco, tal obriga a eleições intercalares, apenas para a vereação.
É claro que podem introduzir-se subcenários. Por um lado, a manifesta indisponibilidade do PS, uma vez que o PSD tem maioria absoluta na Assembleia Municipal, as próprias divergências internas que atravessam os vereadores socialistas e a eventual incapacidade de uma coligação de esquerda, tudo isso pode tolher iniciativas e favorecer as pretensões, afinal de todos, os quais, por razões diversas, apostam na manutenção da vereação, sem recurso a eleições. Uma coisa parece certa: a degradação chegou ao limite dos limites e só um milagre poderá inverter a situação. Aguardem-se, por isso, os respectivos desenvolvimentos.

Marques Mendes e as “pilhas”
De (muito) longa duração…

Apesar dos contratempos sofridos no debate parlamentar de anteontem, Marques Mendes quer seguir o seu percurso e vem adoptando, de há algum tempo a esta parte, uma estratégia de afirmação de liderança em voz alta. Até agora, o líder social-democrata ouvia imperturbavelmente as críticas que lhe eram feitas. A partir das críticas que lhe fez Manuela Ferreira Leite, mudou de atitude, passando a dizer: “Respeito as opiniões divergentes, mas sou eu quem lidera o partido. Disse-o no Conselho Nacional, reafirmou-o anteontem várias vezes durante o controverso diálogo travado com José Sócrates.” Esta diferença qualitativa comprova aquilo que se diz que Marques Mendes vem afirmando no interior do partido: “Sou um osso duro de roer e vou à luta.”
Um célebre barrosista terá dito recentemente a um deputado que se procurava aproximar dos santanistas, desencantado com Marques Mendes, qualquer coisa como isto: “Tem calma, porque quando chegar o momento haverá quem saia a terreiro para se candidatar à liderança, com muitas hipóteses de afastar o ‘gajo’.”
Nos meios “oposicionistas” do PSD existe a convicção de que não será fácil desalojar Marques Mendes e por isso atribuem-lhe as seguintes intenções: voltar a ganhar a liderança, escolher os deputados europeus, fazer a lista de deputados às próximas legislativas e ter uma palavra decisiva nas autárquicas. E depois com um conjunto de fidelidades à sua volta sentar-se-á no Parlamento, mesmo que seja substituído por outro líder na sequência da “inevitável derrota do PSD, se o rumo dos acontecimentos não for mudado”, como dizem esses adversários internos.
A questão magna subsiste porém: quem “saltará”, para disputar com Marques Mendes, a liderança do partido. Que apoios recolherá? Que hipóteses tem de vitória?
Para além do desgastado nome de Luís Filipe Menezes, há um conjunto de dirigentes aparentemente disponíveis, sobretudo se os seus apoiantes potenciais lhe estenderem a passadeira vermelha. Rui Rio é o mais citado, sendo que Aguiar Branco, António Borges e Nuno Morais Sarmento também são falados. É duvidoso porém que tenham a capacidade para vencer Mendes ou sequer que desejem afrontá-lo. Há um nome mais consensual que pode unir, mas que, por força das circunstâncias, se manterá no mais discreto dos recatos: chama-se Manuela Ferreira Leite e pode congregar consensos surpreendentes.
Por enquanto, o PSD continuará a ter na liderança Luís Marques Mendes. Este segue o percurso que se impôs e agora vai dar primazia à revisão do programa do partido e “cavalgar” a onda da Ota e da eventual baixa de impostos. Como diz com alguma irritação um deputado crítico: “Ele é como aquelas pilhas… dura, dura, dura…”

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