2025/06/26

Nós, as vítimas!por Rui Teixeira Santos

O economista Ferro Rodrigues, para ser vítima, escusa de estar na política. Aliás, a vitimização é um processo que parece pegar. Barroso diz-se vítima da crise económica internacional e da má gestão de António Guterres.

O Presidente da Republica vai para o meio do Atlântico berrar contra a invasão dos espanhóis nas nossas águas territoriais. Leonor Beleza esteve 18 anos a dizer-se perseguida, no caso dos hemofilicos, enquanto o seu advogado conseguia a prescrição do caso. Quase igual, mas apenas acusada de corrupção e peculato, Fátima Felgueiras fugiu para o Brasil, para não ser presa e até já conseguiu voltar a receber salário. Até o procurador-geral da República se diz perseguido pela violação do segredo de justiça.
Ferro Rodrigues escreve uma carta dizendo estar em causa o regime democrático, devido às escutas telefónicas. Com efeito, é estranho que os juízes continuem a fazer escutas telefónicas, depois de ter ficado claro que, apesar do erro da lei (que vai ser revista), nunca foi intenção do legislador permitir que qualquer juiz pudesse pôr escutas aos principais responsáveis da Nação. Os juízes não estão acima da lei e são, também, órgãos políticos, ou seja, não estão acima da crítica dos cidadãos, e a violação do segredo de justiça tem sido o único instrumento para travar o abuso de poder que todo o poder dos magistrados naturalmente permite. E sobretudo quando a Procuradoria-Geral da República, que não devia ser mais que uma repartição do Ministério da Justiça ao serviço das prioridades definidas pela política criminal do Governo, é, em Portugal, um verdadeiro órgão de soberania, à medida do Bloco Central, negociado entre Fernando Nogueira e Almeida Santos, para Cunha Rodrigues.
O que Ferro Rodrigues tem de saber imediatamente é se é ou não arguido, para que se possa defender e não tenha que passar pelo calvário que Paulo Portas passou, nos últimos anos, com o caso Moderna, na altura urdido pelo PS. E se não for, então tem que combater directamente Durão Barroso e o procurador-geral, e esquecer as cabalas lúdicas de Paulo Portas, pois o País não pode estar a ser confrontado diariamente com fontes anónimas que transcrevem a totalidade do processo, levantando a suspeita que o procurador-geral de República está a fazer política, à custa do seu estatuto, atacando caluniosamente a oposição e defendendo habilmente o Governo, a quem, curiosamente, compete, exclusivamente, a decisão de propor ao Presidente da República a sua (dele procurador-geral) substituição.
Por outro lado, o facto do Ministério Público ser governado pelo “princípio da iniciativa automática” retira culpas ao procurador-geral de República, mas transforma a justiça portuguesa numa verdadeira “roleta russa”, pois nunca haverá meios para acusar todos os suspeitos e culpados. E, isso significa injustiça, senão mesmo procura de casos exemplares, o que é dramático, não para o regime democrático, mas para a coesão nacional, para a existência de Portugal como um país.
Nestes termos, não é só em matéria económica que temos que apelar ao primado da política para permitir que o País saia deste pesadelo mau em que mergulhou, desde que os socialistas, no governo de Guterres, começaram a usar o fisco, a Procuradoria e as secretas para perseguir adversários políticos.
Tudo isto leva a repensar o sistema judicial português e exigir, naturalmente, a reintrodução do primado da escolha política e ideológica, da razão de Estado, na escolha e selecção dos alvos e das prioridades de política criminal em Portugal, sancionadas em eleições livres e periódicas. Todos os portugueses estão por isso a ser vítimas deste sistema pouco transparente e, naturalmente, isso tem reflexos na economia e no nível de vida dos portugueses e, talvez, também, no acelerado assalto espanhol a Portugal.
Mas se isto são razões que até justificam o desnorte socialista, com a insensata condução do processo da Casa Pia, o certo é que o líder da oposição não pode andar a fazer trinta telefonemas por dia sobre a questão, em vez de fazer oposição. Por uma questão de sensatez, até porque desconfia que está sob escuta telefónica.
Porque o regime democrático implica a existência de uma oposição credível e capaz de ajudar à melhor governação. Os disparates e o péssimo governo de Barroso são em muito, exactamente, o reflexo de não haver nenhuma oposição e dos ministros fazerem, sem reflectir, a primeira coisa que lhes vem à cabeça.
Esta vitimização pode parecer útil, imediatamente, a políticos curtos, como aqueles que agora dirigem o PS. Mas é fatal para o regime democrático, porque induz apelos emotivos e cria o caldo de cultura do populismo e da ilegalidade, quando aquilo que está em causa é se a agenda do procurador-geral da República deve ser gerida por consenso do Bloco Central, como o era no tempo de Cunha Rodrigues, ou apenas pelo partido que domina o Governo (leia-se Durão Barroso), como aparentemente acontece, agora, com Souto Moura.
Ao contrário do que Ferro diz, o regime não está em causa porque o seu telefone está sob escuta. O regime está em causa porque ele se faz de vítima de cabalas ocultas e de poderes não eleitos democraticamente, em vez de fazer oposição clara e afrontar essas mesmas forças, que ele diz perseguirem-no. Ferro fixa-se nos famosos do costume, nos comentadores de direita, em Paulo Portas, no procurador, em vez de perceber o que está em causa e que tudo isto não é mais que o reflexo da falta de autoridade no País.
Essa falta de autoridade vem, exactamente, do mau governo que a direita está a fazer, em termos económicos e financeiros, e da ausência, ou mesmo inexistência, de política do Presidente da República, que protesta a bordo de uma traineira e provincianamente se preocupa com a calamidade em Viseu, em vez de exigir ao Governo uma política nacional de pescas ou de prevenção dos incêndios, que permita reconstruir uma moderna frota pesqueira nacional, flexível e tecnologicamente mais avançada que a megaestrutura de pescas espanhola, que já não tem possibilidade de grandes evoluções, criando assim uma oportunidade no nosso atraso, ou, por exemplo, nos fogos, propondo que se limpem os campos, antes do Verão, e se repense o Serviço Nacional de Bombeiros, onde a falta de meios e a desordem é conhecida.
O problema é que, sem Presidente e sem oposição, o País é mal governado, ou é governado pela agenda do “Expresso” e de Marcelo, que vivem de casos sórdidos dos famosos do costume, para que os poderosos deste país possam continuar a ser intocáveis.
O problema não é o facto de acharmos que Leonor Beleza até poderia ter sucedido a Cavaco e acabou fugida à justiça, ainda que muitos acreditem que tudo não foi mais que uma cabala do dr. Fernando Nogueira para assegurar que chegava a líder do PSD, o que seria muito problemático se Leonor Beleza não tivesse sido injustamente acusada de dolo na morte dos hemofílicos. No mínimo, já que foi acusada, Beleza devia ter sido julgada e absolvida, em vez de andar a dizer que não tem nada a ver com as manobras dilatórias do seu advogado, que brilhantemente conseguiu a prescrição do caso.
O problema não é que a maioria do País esteja contra o erro da Relação de Braga, que inconstitucionalmente suspendeu o mandato da Fátima Felgueiras ou a mandou sem culpa formada para a cadeia, tendo ela fugido, qual Robin dos Bosques, ao poder estúpido do “João sem Terra”, em que a magistratura se está a transformar.
O problema não é a pesada herança que o PSD diz ter que gerir e que Ferreira Leite transforma em impostos, e que depois o Dr. Morais Sarmento tem de dar ao dr. Vakil, pois o Estado já não tem credibilidade para garantir que vai honrar os compromissos.
O problema, enfim, é que por este andar isto não vai longe e somos todos nós vítimas destes que se dizem vítimas mas que vão ficando: Ferro Rodrigues, depois do que se passou esta semana, não tem condições para continuar à frente do PS, mesmo que esteja inocente, tudo não passe de calúnias e apele para Sampaio, porque está em causa o regular funcionamento das instituições democráticas. Tal como Leonor Beleza: também devia abandonar a política neste regime, depois do seu caso ter prescrito. Era o mínimo que se exigia, depois de não ter podido provar a sua evidente inocência, no quadro das instituições deste regime.
A hora da política, como dizia Sá Carneiro, está de vota. Da política e do comportamento honrado e ético dos protagonistas. De colocar em causa o regime e a falsa democracia e a mentira que é este Estado de Direito. A hora de haver uma política económica, a hora de haver uma política de justiça, a hora de haver uma política de defesa do interesse nacional. E se os políticos actuais são incompetentes, talvez tenha chegado a hora de os substituir, também. É uma questão de cidadania denunciar esta vitimização que justifica que nada mude e que alguns nos imponham uma agenda que prejudica Portugal.

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