2025/07/01

Encontro com trabalhadores de empresas em dificuldades

Carlos Carvalhas irá participar na próxima Quarta-feira em mais um encontro com trabalhadores em dificuldade e em vias de deslocalização.

O secretário geral do PCP, Carlos Carvalhas participará na próxima quarta-feira, dia 19, às 16h00, na Biblioteca Municipal de Aveiro, num encontro com trabalhadores de empresas em dificuldade e em vias de deslocalização do distrito de Aveiro nomeadamente C. J. ClarK, Bawo, Oliva, Philips, Quematextil, Yasaki Saltano, Efacec, Ecco e Fosforeira Portuguesa.

Este encontro tem por objectivo a apresentação de propostas e medidas de urgência na AR nomeadamente o projecto-lei do PCP sobre deslocalização de empresas.

A guerra já começou

A guerra no Iraque já começou. De uma forma camuflada, unidades de operações especiais norte–americanas operam em território iraquiano há mais de um mês. No seguimento do que o SEMANÁRIO avançou há duas semanas, ontem, o “Washington Post” revelava pormenores das missões em curso. Entretanto, Bush quer avançar uma segunda resolução já para a semana.

A anarquia política e diplomática não podia ser maior, no dia em que o chefe da equipa de inspectores da ONU (UNMOVIC), Hans Blix, vai ao Conselho de Segurança apresentar o seu segundo relatório sobre as inspecções que decorreram em território iraquiano.

Divergências profundas no seio da Europa quanto a um eventual ataque ao Iraque estão a escavar um fosso profundo com os Estados Unidos, e a cimentar a divisão entre uma “nova e velha” Europa, seguindo a classificação do secretário da Defesa norte-americano, Donald Rumsfeld.

Depois de confrontos de opiniões e estratégias sobre o desarmamento do regime de Saddam Hussein levadas a cabo no Conselho de Segurança das Nações Unidas e no ventre da União Europeia, esta semana, o embate estendeu-se à NATO (ver texto nestas páginas), o símbolo máximo das relações transatlânticas, manifestado, por exemplo, com a evocação do artigo 5º pela primeira vez na sua história, como resposta da solidariedade europeia ao povo norte-americano depois dos ataques do 11 de Setembro.

Hoje, Blix vai apresentar um relatório, que provavelmente dará o aval para a guerra, indo de encontro aos anseios americanos. A conselheira para a segurança nacional da Casa Branca, Condoleezza Rice, esteve na quarta-feira de manhã, em Nova Iorque, para pressionar o inspector chefe da UNMOVIC a apresentar um relatório revelador das violações do regime de Bagdad à resolução 1441.

Esta manobra política coincidiu com a proposta anglo-americana para uma segunda resolução, legitimando uma intervenção bélica no Iraque, a ser votada na próxima semana, de acordo com fontes oficias americanas ao “Washington Post”. A administração Bush mostra, assim, que pretende antecipar-se aos acontecimentos e não correr quaisquer riscos.

No entanto, a França, a Alemanha e a Rússia já disseram que não estão dispostas a aprovar esta hipótese, querendo dar lugar a uma solução pacífica, nomeadamente com o prolongamento das inspecções.
Mas, apesar do discurso político adverso, à ultima da hora, poderão haver algumas surpresas nas posições assumidas por Paris, Berlim e Moscovo. Esta eventual inflexão na política externa das três chancelarias só fará sentido se for enquadrada em dois pressupostos: o poderio militar americano e os interesses nacionais dos Estados europeus.

A primeira questão prende-se com o facto dos Estados Unidos estarem determinados a avançarem sobre Bagdad, com ou sem aval do Conselho de Segurança, com ou sem apoio dos supostos aliados. O seu poderio militar é de tal maneira avassalador que de pouco adiantaria contribuições bélicas de outros países. “Nós não precisamos de uma coligação internacional para vergar o Iraque. Conseguimos fazer isso sozinhos”, escrevia esta semana o famoso colunista do “New York Times”, Thomas L. Friedman.

Quanto à segunda questão, França, Alemanha e Rússia querem em última instância assegurar a prossecução dos seus interesses, um objectivo realista da política dos Estados. E aqui, convém distinguir os interesses franceses e russos com os dos alemães. Estes, por uma questão de sobrevivência política não se poderão dar ao luxo de eventualmente ficarem isolados, numa posição irredutível contra a guerra. Esta situação poderá assumir contornos reais se a França e a Rússia alcançarem os seus objectivos na questão iraquiana: manter os inúmeros contratos petrolíferos que actualmente as suas maiores companhias detêm com Bagdad.

Neste capítulo, convém desmistificar a ideia redutora de que os americanos querem controlar o ouro negro dos poços do Iraque. O SEMANÁRIO escrevia a 18 de Outubro de 2002 que Bush iria deixar o petróleo iraquiano para os europeus. Saddam Hussein tem tentado criar uma rede complexa com os supostos aliados dos americanos, comprometendo-os economicamente com o Iraque, chegando ao ponto de haverem 30 contratos para entrarem em vigor depois de levantadas as sanções.

Com estas teias de interesses de empresas petrolíferas europeias, chinesas, indianas e agora japonesas, no Iraque, torna-se cada vez mais provável que os americanos se “desinteressem” pelo petróleo iraquiano, querendo apenas assegurar a estabilidade dos preços no mercado internacional.

Além do mais, empresas como a russa Lukoil, ou a francesa Elf, têm pressionado os seus Governos a negociar com Washington a manutenção das suas posições num Iraque pós-Saddam. A acrescentar a isto, os Estados Unidos estão cientes dos elevados custos que teriam de suportar para, eventualmente, ter que recuperar o complexo de produção petrolífera iraquiana. Por isso mesmo, esta semana, o “Financial Times” e o “New York Times”, em artigos de análise, colocavam de parte uma guerra norte-americana contra o Iraque baseada em interesses económicos.

Unidades de operações especiais
norte-americanas no Iraque

O SEMANÁRIO já tinha avançado há duas semanas a presença de forças especiais do Exército norte-americano e da CIA no norte do Iraque. Ontem, o “Washington Post”, citando fontes próximas do Pentágono, confirmou a existência de unidades de operações especiais suas em várias partes do território iraquiano à procura de locais onde estejam colocadas armas, a estabelecer redes de comunicações e a capturar potenciais fugitivos pertencentes ao regime de Saddam.

As tropas estão divididas em duas “task forces”, com um número indeterminado de homens, que estão em operações dentro do Iraque há mais de um mês. O objectivo destas unidades é de preparar terreno para as tropas convencionais, mal Bush dê ordem de ataque.

Numa operação, que os militares do Pentágono consideram ser dramaticamente diferente daquela que ocorreu em 1991, os Estados Unidos mobilizaram, na quarta-feira mais 40 mil homens, perfazendo no total 150 mil soldados preparados para entrar em combate.
Entretanto, a crise com a Coreia do Norte mantém-se perigosamente sem solução à vista. A Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) afirmou, esta semana, que Pyongyang está a violar claramente as regras de segurança, quanto à proliferação nuclear.

Apesar dos receios norte-americanos, Washington mantém-se prudente, não tomando medidas drásticas, e a Rússia já disse que para já não pretende levar este assunto ao Conselho de Segurança. Ontem, a Coreia do Sul apelou a Pyongyang para aproveitar uma janela de oportunidade, para solucionar esta crise pacificamente.|


Aliança Atlântica
no princípio do fim?

O fim do sistema bipolar, que vigorou durante toda a Guerra Fria, conhecendo momentos de maior ou menor rigidez, deixou desenquadradas muitas das organizações internacionais que foram criadas dos escombros da Segunda Guerra Mundial. Nos tempos seguintes aos frenéticos anos de 1898-91, o debate foi lançado no seio académico, questionando-se sobre a eventuais razões que poderiam sustentar o prolongamento da vida dessas mesmas organizações.

O exemplo da NATO foi talvez o mais paradigmático do desajustamento que determinadas organizações passaram a enfrentar, quando inseridas numa nova realidade sistémica, para as quais não estavam preparadas nem tinham mecanismos de resposta às exigências impostas pelas relações internacionais dos anos 90, e que ajudaram a definir um paradigma assente numa única super potência.

É certo que a NATO, a ONU e a União Europeia tentaram, de uma forma ou de outra, adaptar-se aos tempos da globalização, livres de preconceitos e regras que as cinco décadas de confronto político e ideológico entre dois blocos impuseram. No entanto, hoje constata-se que as organizações pilares, nas quais assentaram a estabilidade do mundo ocidental durante anos, começam a ruir, como se de um arrastamento tardio se tratasse, catorze anos após a queda do muro de Berlim. Primeiro, foi o sistema que sucumbiu agora são as suas organizações.

Por exemplo, a ONU há muito que é criticada pela sua composição e funcionalidade. Os cinco membros do Conselho de Segurança continuam a ser os aliados da II GM, uma situação irrealista perante as alterações que a História tratou de fazer no mundo. Caída em descrédito, as resoluções da ONU não são mais do que meras proclamações políticas sem resultados práticos, como o conflito crónico no Médio Oriente comprova.

A questão iraquiana parece estar a provocar mais estragos nas estruturas ocidentais, do que propriamente nas do Governo de Bagdad. O Conselho de Segurança da ONU transformou-se num autêntico circo, a União Europeia numa manta de retalhos sem nenhum padrão a seguir e a NATO mergulhou, esta semana, numa crise sem precedentes, que a pode condenar à existência meramente formal, sendo o mesmo que dizer à sua extinção.

A França, a Alemanha e a Bélgica vetaram a possibilidade da NATO proporcionar meios de defesa à Turquia (mísseis Patriot, aviões AWACS, meios anti-NBQ) numa eventual retaliação iraquiana àquele país, caso os Estados Unidos avancem com uma intervenção militar sobre Saddam Hussein. O impasse em relação à defesa da Turquia até poderá ser resolvido nas próximas horas, mas as fissuras no edifício da Aliança são bastante profundas para serem tapadas com uma “simples” revisão do conceito estratégico.

O que inicialmente começou por ser uma divergência de posições nacionais, reflectindo princípios e interesses soberanos, acabou por “minar a unidade da NATO, numa altura em que surgem muitíssimas questões sobre o futuro da aliança, no pós Guerra Fria”, lia-se esta semana no “New York Times”. Ainda o mesmo jornal referia que diplomatas e analistas consideram que a divisão sobre a ajuda à Turquia exacerbou sentimentos profundos e perturbadores dos dois lados do Atlântico, derivados de muitos factores, que não exclusivamente do Iraque. “A questão da guerra ao Iraque tornou-se numa questão pessoal na disputa à liderança americana”.

O debate quanto ao futuro da Aliança reacendeu-se, indo provocar, certamente, a clivagem de posições entre aqueles que sempre defenderam a extinção desta organização desde a implosão do seu inimigo, nomeadamente do Pacto de Varsóvia, e os outros, que alinharam pelas reformas dos conceitos estratégicos, como meio de adaptação às necessidades emergentes.|

Portugal e a escolha estratégica

A NATO poderá estar a viver os dias do fim, colocando os seus Estados-membros perante alguns dilemas e incertezas quanto ao futuro. Portugal integra a NATO desde a sua fundação, em 1949, tendo este factor condicionado claramente as directivas nacionais em termos de política externa nas últimas décadas.

Nas horas críticas, a via atlântista sobrepôs-se sempre à europeísta. Hoje, o veio de ligação (NATO) entre Portugal e os Estados Unidos está em crise, podendo mesmo sucumbir. Isto não significa que a relação política esteja em perigo. Pelo contrário, Lisboa e washington poderão acentuar a suas relações diplomáticas e laços de solidariedade.

Mas seja como for, Portugal terá que fazer opções estratégicas quanto ao papel que quer assumir no futuro no sistema internacional.

Para já, o Governo português debate-se com meras conjecturas, porém, não poderá descurar os seus interesses nacionais, especialmente ao nível da segurança. Ao assinar a declaração dos oito Barroso marcou uma posição, mas não definiu necessariamente um rumo para a política externa portuguesa. |

O bom…

Por norma, costumam ser os grandes momentos que fazem os grandes líderes. A História tratou de glorificar e endeusar todos aqueles estadistas que em determinada altura da sua vida provocaram rupturas nas relações internacionais e alteraram o rumo dos acontecimentos.

Quase sempre, enfrentavam um inimigo poderoso, que tinha tanto de grandeza política, como de perversidade ideológica (Napoleão, Hitler, Estaline, etc). Com a devida distância temporal, os compêndios criaram visões maniqueístas desses líderes e colocaram-nos nos respectivos campos do bem e do mal, do bom e do vil.

A personificação de valores universais e de projectos imperiais provocaram sempre fracturas no sistema e o embate de “grandes” estadistas. Apesar de uns terem ficado na galeria dos tristemente célebres, a verdade é que todos gozavam de uma capacidade assustadora de liderança.

George W. Bush, o bom, a personificação do bem, e o imperador de uma nação baluarte da democracia e dos valores humanos, assim, como dos mercados livres, iniciou uma guerra, de novos conceitos, quanto à sua forma e quanto aos seus objectivos. A doutrina da geoestratégia e da táctica, acumulada ao longo de séculos, talvez desde Sun Tzu, foi posta de parte, para dar lugar a novos meios que permitam combater um inimigo poderoso, mas invisível.

Perante a barbárie do 11 de Setembro e a ameaça do terrorismo, poucas dúvidas restariam para colocar Bush no campo dos bons, dos libertadores dos oprimidos e nos devastadores dos malefícios da Humanidade. Porém, nem de todos os grandes momentos saem grandes líderes.

O discurso de Bush não passa, e o projecto messiânico dos Estados Unidos é visto com desconfiança.
Porquê? Talvez, pela fragilidade dos pilares em que assenta a “guerra de Bush” ou, quem sabe, pelo simples facto do Presidente dos Estados Unidos ser visto pelo mundo afora, como um autêntico cowboy, à boa imagem da série “Dallas”.

Mas, talvez a grande diferença resida no facto dos “grandes” líderes da História não terem precisado de engendrar esquemas para convencer os seus súbditos a embarcarem consigo em jornadas homéricas, por forma a conquistar o mundo e a combater o inimigo. Por convicção, milhões de pessoas ajudaram homens da política e de Estado a alcançarem um estatuto heróico. Bush dificilmente conseguirá esse feito.

…o mau

A ascensão de Saddam Hussein ao poder seguiu os trâmites que qualquer déspota que se preze teima em cumprir: eliminar fisicamente os seus opositores para depois governar isoladamente durante bons e longos anos.

Num único dia sangrento, Saddam revelou toda a sua maldade ao depor o general Ahmed Hassan Bakr, no princípio dos anos 80, e ao convocar todos os poderosos do partido Ba’ath para uma sala, revelando em voz alta os nomes dos seus rivais, tendo estes, posteriormente, sido arrastados para o exterior e abatidos pela polícia secreta.

Desde esse dia, a liderança de Saddam raramente foi posta em causa, no entanto, e curiosamente, foi também a partir desse mote, e com a “ajuda” da revolução iraniana em 1979, que o conselheiro da segurança nacional americana da altura, Zbignew Brezinski, “encorajou publicamente o Iraque a atacar o Irão e a recuperar o canal de Shatt-al-Arab”.

Hoje, mais de vinte anos passados, Saddam continua a ser um homem mau, porém, a grande diferença é que deixou de servir os interesses de Washington. De aliado dos Estados Unidos, para combater o expansionismo soviético no Médio Oriente durante a Guerra Fria, passou a “inimigo de estimação”, personificando um dos rostos do “eixo do mal”.

e o vilão.

De acordo com algumas teorias da conspiração, daqui a vinte anos documentos ultra-secretos, até então guardados nas catacumbas do Pentágono, revelarão ao mundo que Osama bin Laden, o imaginativo e líder terrorista da Al-Qaeda, morreu logo nas primeiras horas de bombardeamentos norte-americanos no Afeganistão.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, a CIA tem-se encarregado de o “manter vivo” desde então, graças à já famosa CNN árabe, Al-Jazeera. Assim sendo, bin Laden lá vai fazendo os seus “anúncios” de forma muito conveniente para os interesses norte-americano, com um “timing” perfeito para a estratégia de Bush e com um discurso imediatamente aproveitado pela Casa Branca.

Com este cenário montando, e é apenas disso que se fala, de uma teia conspirativa, talvez seja caso para dizer que assim dá muito jeito ter um bin Laden vivo…mas a monte. O vilão certo para as alturas certas.

O ultimato à Alemanhapor Rui Teixeira Santos

A carta de sete líderes europeus, chamando à responsabilidade o Conselho de Segurança das Nações Unidas, é muito mais que uma declaração de apoio às posições americanas sobre o Iraque.

É verdadeiramente um ultimato à Alemanha e sobretudo marca o fim desta Europa construída a partir dos equilíbrios da guerra fria. Portugal volta ao seu destino atlantista, depois da oportunista opção continental, que nos valeu milhões de contos em fundos e transferências ao abrigo da adesão e em nome da coesão.

Depois da China e da Rússia terem dado o seu apoio aos EUA, se porventura a França e a Alemanha votassem no Conselho de Segurança contra o mandato aos EUA para invadir o Iraque, estariam não só a excluir-se do saque que se seguirá, mas sobretudo acabariam de vez com as Nações Unidas e com a ideia da existência de um direito internacional, acima dos Estados e que limitaria o poder do império.

É claro, desde o início deste processo, que a América está disponível para assumir o papel de “imperador no mundo”, levando isso às últimas consequências. E o que mais surpreende é que a Europa continental não perceba que, com a sua oposição, só prejudica a sua relevância no mundo e nas relações internacionais.

A América, ao imergir como uma única potência mundial, após a guerra fria, é da sua própria natureza, teria sempre que tentar os limites, na defesa dos seus interesses estratégicos e de segurança. Dizer não à América pode, num primeiro momento, servir para negociar contrapartidas.

Dizer não definitivamente significava enterrar o “nado morto” que são as Nações Unidas que, mal ou bem, vão sendo um fórum para resolver e gerir os conflitos menores na comunidade internacional.

Seja qual for a posição da Alemanha, ela já perdeu, sem ter saboreado o gosto da desforra de três guerras em que foi humilhada. Se votar a favor da América no Conselho de Segurança dá o dito por não dito e aparece desacreditada politicamente, mas se votar contra, passa a ser irrelevante, porque a América vai mesmo para a guerra e modificará para sempre o mapa do mundo. Deve ser desesperante ser alemão e nunca ter tido razão, desde o fim do Sacro-Império.

O nacionalismo prussiano e a sua pax continental nunca resultaram na Europa. Foram sempre as potências marítimas que lograram levar vantagem. E, agora, que a Alemanha estava quase a conseguir, com a “Europa do Directório”, e o euro forte, que só valoriza a sua ourivesaria industrial e obriga a sua indústria intermédia a colonizar a sua quinta no leste europeu, a América vem colocar tudo em causa.

Consciente que o ultimato, mais do que sobre o Iraque é mesmo sobre a Europa, e consciente que a Europa está nesta situação de dependência porque, em vez de se armar e de ter uma política de defesa e segurança, preferiu andar a sustentar o inviável Estado social, com pensões e sistemas de Segurança Social, saúde e educação que a América jamais terá, a França, qual aldeia gaulesa, já se prepara para contemporizar, pedindo apenas que existam provas, que a América as mostre.

O pragmatismo latino dos franceses é uma herança gaulesa, que Júlio César já havia observado.

O alinhamento português com a potência marítima dominante é talvez a maior constante da nossa história diplomática. E esgotado o saque à Europa da União Europeia era normal que a nossa diplomacia voltasse à lógica tradicional, independentemente de Barroso vir de Georgetown, de Martins da Cruz ser um iberista e de Paulo Portas ser um produto da herança pró-americana da “escola SEMANÁRIO”.

Proposta cultural

Mas, porque o papel da Europa é sobretudo necessário após a intervenção, a nossa resposta deveria ser uma resposta cultural. Pode não se gostar de Manuel Maria Carrilho, mas, esta semana, na RTP2, o ex-ministro da Cultura de António Guterres, mesmo sem preocupação de enquadramento, deu a resposta adequada, quando disse que Portugal deveria aproveitar a popularidade de Lula da Silva, e reunir nesta altura o consenso dos países da CPLP.

Mas a resposta cultural pode bem ser a ideologia do pós-Iraque, para a reconstrução do “mare nostrum”, como área de paz e cooperação, que mil anos de Império Romano asseguraram.

Há um património cultural de afirmação do direito e da personalidade humana, que se traduz na herança greco-latina e que está incorporado também no ecumenismo e na tolerância judaico-cristã, que pode servir de base a um novo entendimento euro-mediterrânico, eventualmente com o alargamento da União Europeia aos países árabes, ou, pelo menos, com um acordo inicial de livre comércio e circulação, que deve a ser a base para controlar a inevitável explosão de ódio antiocidental no mundo islâmico, a sucessão de quedas de regimes moderados, a fazer lembrar o colapso da ex-União Soviética.

Vai ser necessária a Coca-Cola e o Mac, como o foi na Rússia, e também a ajuda económica e os medicamentos, para além da liberdade, que George Bush, místico, proclama ser uma dádiva de Deus.

Só quando a Europa foi germânica e eslava, só quando o Sacro-Império controlava a cristandade é que o integrismo católico levou à intolerância e às cruzadas, de que o último exemplo foi o louco rei D. Sebastião, morto em Alcácer Quibir, como mártir da cristandade, em luta contra o grande turco e louvado, na literatura alemã do século XVI, como o exemplo máximo da devoção cristã.

Pela terceira vez, agora, a América vem ajudar a Europa a colocar a Alemanha no seu sítio. Mais uma dívida, depois de duas guerras mundiais. Ainda, há duas semanas, a Alemanha alimentava o senho imperial de Bismark. A obstinação prussiana desfez o sonho e reconduz a Alemanha ao seu isolamento tradicional.

Agradecemos todos não ser necessário dividir o saque com eles…

O regresso da política

A segunda reflexão, que é urgente, tem a ver com a natureza deste conflito. É evidente que, sejam qual forem as provas que Collin Powell apresente, elas serão sempre “evidentes e suficientes” para justificar o que à partida está justificado. Não faz sentido, portanto, a argumentação de Freitas do Amaral, como se verá na próxima semana.

É uma questão de marketing político e necessidade dos Aliados, condição de sobrevivência dos equilíbrios mundiais, apesar de tudo, a primeira razão do Direito Internacional.

O problema da esquerda pacifista é que não percebe que o que está em causa não é a paz ou a guerra, mas sim a inacção ou a acção contra o Iraque. O Iraque não é uma guerra privada da família Bush. É, sobretudo, um Estado hostil ao império, que preventivamente se defende e que aproveita para redesenhar o Mapa do Petróleo, arma decisiva para controlar os mercados gigantescos da Ásia e do Pacífico, vitais para a América, mas também para o Ocidente.

Independentemente das razões de Durão Barroso, que em três dias conseguiu ter três posições diferentes sobre o mesmo assunto, variando aparentemente consoante a latitude, a posição final do governo português é aquela que é mais adequada para Portugal.

O país começava a ficar asfixiado com esta Europa de contabilistas medíocres e de recrutas prussianos. O fim dela é uma boa notícia. Ferreira Leite e o Pacto de Estabilidade e Crescimento acabam com ela. Regressa a política e com ela a tolerância latina.

Graças a Deus e à América de Bush…

A esperança venceu o medopor Ilda Figueiredo

Foi neste novo Brasil, onde a esperança venceu o medo e o Governo de Lula dá os seus primeiros passos, que se realizou, pelo terceiro ano consecutivo, o Fórum Social Mundial.

Foi neste novo Brasil, onde a esperança venceu o medo e o Governo de Lula dá os seus primeiros passos, que se realizou, pelo terceiro ano consecutivo, o Fórum Social Mundial, a que estão agregados outros eventos, designadamente o Fórum Parlamentar Mundial, em que tenho participado desde o início.

Como se sentiu bem durante todas as actividades em Porto Alegre, o triunfo de Lula representa para milhões de homens e mulheres do Brasil, da América Latina e do mundo, a esperança de se concretizar um novo modelo de governo e de desenvolvimento económico e social que prioriza a inclusão social, como ficou bem claro na forma como dezenas de milhares de pessoas reagiram ao discurso que proferiu no gigantesco auditório ao ar livre, perante muitas dezenas de milhares de pessoas, onde também explicou as razões da sua ida a Davos, dando igualmente destaque à mobilização na luta pela defesa da paz, contra a guerra.

Registe-se que este terceiro Fórum Social Mundial, realizado em Porto Alegre, no estado brasileiro do Rio Grande do Sul, que agrega muitos outros fóruns, foi o mais participado, reunindo na manifestação de abertura mais de 140 mil pessoas, de 121 países, com grande destaque para a juventude, em cujo acampamento estavam cerca de 30 mil jovens.

Neste espaço aberto e de encontro para o aprofundamento da reflexão e debate democrático de ideias, realizaram-se trocas de experiências e formularam-se propostas de articulação de acções eficazes de entidades e movimentos que se opõem ao neoliberalismo e ao domínio do mundo pelo capital financeiro e por qualquer forma de imperialismo.

Partindo do princípio de que um outro mundo é possível, o objectivo é trabalhar para a construção de uma sociedade humanizada, que dê prioridade às pessoas, ao respeito dos direitos humanos universais, ao desenvolvimento sustentado, apoiado em sistemas e instituições democráticas, ao serviço da justiça social, da igualdade, da soberania dos povos e da paz.

A luta contra a guerra teve destaque privilegiado neste terceiro fórum, incluindo no que reuniu deputados de dezenas de países. Como se diz na resolução sobre a rede parlamentar internacional e suas actividades, que tive a honra de apresentar, a primeira urgência é agir sem demora para evitar a guerra no Iraque e pôr fim à ocupação israelita nos territórios palestinianos.

Foi neste contexto que se propôs apelar à mobilização das manifestações de 15 de Fevereiro e formar diferentes delegações parlamentares que viajem ao Iraque, dentro das próximas semanas, com base numa oposição radical à guerra e solidariedade ao povo iraquiano, vítima do bloqueio económico e da ameaça militar da Administração americana, sem que isso signifique qualquer apoio ao regime do Iraque.

Uma delegação de deputados do Parlamento Europeu, nos quais se incluem os dois deputados comunistas portugueses, partirá para o Iraque no próximo dia 2 de Fevereiro. É preciso parar a guerra antes que comece.

Nova investigação de Camarate

A investigação ao Fundo de Defesa do Ultramar verificará se as Forças Armadas Portuguesas faziam tráfico de droga. Por que é que Paulo Portas não entrega os documentos da investigação dos Serviços Secretos Militares sobre o atentado de Camarate?

A investigação do Fundo de Defesa do Ultramar (250 caixas de documentos guardados no Ministério da Defesa, de um total de 9000 dossiers com registos desde 1950) poderá provar que as Forças Armadas Portuguesas estavam envolvidas no tráfico de cocaína, para financiar operações clandestinas dos serviços secretos ocidentais, contra o fundamentalismo islâmico. Mas não servem para provar nada relativamente a Camarate.

Sobre Camarate, Paulo Portas tem que autorizar o acesso aos ficheiros secretos dos Serviços de Informação Militar que, por força da lei, fizeram uma investigação competente ao acidente que vitimou Sá Carneiro, Amaro da Costa, Snu Abecassis e António Patrício Gouveia. Tudo parece indicar que não se matam primeiros-ministros, e que, a ter havido atentado, ele destinava-se ao ministro da Defesa, Amaro da Costa.

Portugal sempre foi um país de traficantes. De traficantes do tráfico do Atlântico. Desde as especiarias, ao ouro, aos escravos e à cana-de-açúcar. Era, aliás, uma prerrogativa do duque de Aveiro, o exclusivo do contrabando com Marrocos, reconhecido pelo monarca.

No século XX o grande contrabando no Atlântico foi sobretudo o do tabaco, que acabaria por reconverter as famílias “mafiosas” nacionais em distribuidores de tabaco sem impostos dos principais fabricantes internacionais, suspeitando as autoridades, que são sobretudo as fábricas da Roménia e da Turquia que abastecem esse mercado.

Mas actualmente a principal linha de tráfico do Atlântico é a droga, sobretudo a cocaína, onde as “famílias” galegas, com fortes ligações à América do Sul, têm ganho preponderância. Mas, nos anos setenta, há fortes indícios que parte significativa do tráfico de cocaína era feito com recurso ao transporte militar das Forças Armadas Portuguesas.

Suspeitas que os militares, cumprindo ordens superiores, faziam o despacho e transporte de droga, com guias de marcha e registos burocráticos, como se se tratasse de um transporte regular e normal.

Com o bloqueio a Portugal, decretado pelas Nações Unidas, o Fundo de Defesa do Ultramar serviria alegadamente para Portugal furar o embargo, numa manobra típica de um Estado pária na comunidade internacional, como é hoje o Iraque. Esse fundo seria alegadamente financiado por actividades clandestinas do Estado e por transferências do Orçamento do Estado. Algumas suspeitas que o regime usava o tráfico de droga para financiar o esforço de guerra colonial nunca passaram disso mesmo.

O Fundo de Defesa do Ultramar deveria ter sido extinto após o 25 de Abril, uma vez que as suas actividades clandestinas já não se justificariam. Porém, o Conselho da Revolução deixa-o continuar, na dependência dos militares de formação americana que integravam as chefias da revolução, e alegadamente passa a integrar o financiamento de actividades clandestinas das Forças Armadas, nomeadamente no âmbito da NATO, com particular destaque, segundo algumas teses, para o financiamento da actividade anti-islamita, tendo o auge sido atingido na operação conjunta entre a CIA e as Forças Armadas Portuguesas na desestabilização do Irão após a queda do Xá Reza Palevi, operação que levaria o nome de “Iran Contras”.

De notar que o fundo era antes gerido pelo estado-maior, cujo chefe era Costa Gomes, que viria a assumir a Presidência da República, depois do 28 de Setembro.

Nesta altura, circula em certos meios militares, o fundo era claramente financiado pelo tráfico de droga, alegadamente organizado pelas forças de contra-espionagem americana, que não tinham autorização do Congresso dos Estados Unidos para levar a cabo a política do Departamento de Estado. Portugal, com o pré-cônsul americano Frank Carlucci em Lisboa, estava no centro do Mundo.

Desta época, garantiram esta semana, ao SEMANÀRIO, fontes militares, é provável que existam nos serviços secretos militares documentos sobre as operações, mesmo que os balanços reais não constem da documentação oficial do Fundo de Defesa do Ultramar.

Alegadamente, toda esta operação de tráfico de droga, que financiava as eventuais operações clandestinas em defesa do Ocidente seria alegadamente comandada por oficiais portugueses tidos por próximos dos Estados Unidos da América ou mesmo contratados como agentes da CIA e de outros serviços secretos militares estrangeiros.

Estas operações seriam alegadamente do conhecimento dos militares que integravam os gabinetes dos ministros da Defesa sucessivos, após a revolução do 25 de Abril. Algo que nunca chegou a ser apurado até hoje, porque os ficheiros secretos do Serviço de Informação Militar das nossas Forças Armadas nunca foram investigados.

No seio da AD, após a morte de Sá Carneiro, corria o rumor que o chefe de gabinete de Amaro da Costa, Hugo Rocha, poderia ter conhecido a alegada operação de tráfico de droga e que só mais tarde é que o ministro viria a tomar conhecimento do assunto. Estamos no ano seguinte ao da queda de Somoza na Nicarágua, no tempo do tráfico de Estado.

Uma das versões nunca confirmada em todas as investigações aponta, aliás, que alegadamente Amaro da Costa teria feito chegar ao primeiro-ministro Sá Carneiro um memorando sobre o tráfico de droga através do Fundo de Defesa do Ultramar e que teria a intenção de vir a usar a informação para atacar o Conselho de Revolução.

A tese conspirativa, que não tem suporte documental até agora, para além das suspeitas e dos rumores dentro da classe política e na magistratura, admite mesmo que este poderia ser o alegado móbil do crime que vitimaria Amaro da Costa e, acidentalmente, o primeiro-ministro de Portugal, Francisco Sá Carneiro.

Com efeito, Sá Carneiro não deveria ter seguido no avião de Amaro da Costa para o comício, programado no Porto, de encerramento da campanha eleitoral em 4 de Dezembro de 1980.

Mas a tese tem algumas contradições, muito embora, nessa altura, os americanos estivessem mais ligados aos militares de esquerda e ao partido socialista, e Amaro da Costa, com ligações aos movimentos nacionalistas europeus, alimentasse o antiamericanismo tradicional na direita portuguesa salazarista, que não perdoava o facto da América patrocinar os movimentos de libertação nas ex-colónias portuguesas.

E a principal das contradições é que, pretendendo a AD estabilizar o regime democrático, a embaixada americana era e continuava a ser um dos principais apoios das forças democráticas.

Era, porém, evidente o conflito entre o Governo e o Presidente da República Ramalho Eanes. No almoço do Tavares, que antecedeu a fatídica viagem de Sá Carneiro, a 4 de Dezembro de 1980, e no qual estiveram presentes Soares Carneiro, o candidato presidencial da maioria governamental, Victor da Cunha Rego, Freitas do Amaral e Cavaco Silva, poderia não estar em cima da mesa o orçamento das Forças Armadas, mas estava seguramente a decisão de Sá Carneiro se demitir do Governo, no caso da vitória previsível de Ramalho Eanes, nas eleições presidenciais.

A dramatização era total e Sá Carneiro tinha ainda o trunfo, a lançar no comício dessa noite, do fundo gerido por Canto e Castro, exilado em Londres e casado com a sul-americana Joanita Valdera, e outros militares próximos dos socialistas e da embaixada dos EUA e tidos como próximos de Belém.

E o que é mais curioso é que Sá Carneiro acordou com os seus comensais que seria Eurico de Melo o novo primeiro-ministro de Portugal, podendo eventualmente, e já nessa altura, Cavaco Silva assumir uma pasta de Estado, ele que, no mês anterior, tinha pensado apresentar a sua demissão a Sá Carneiro e abandonar a AD.

Próximo dos americanos e não, seguramente, por causa do tráfico alegadamente monopólio do Fundo de Defesa do Ultramar, Francisco Pinto Balsemão não esteve no referido almoço do Tavares, alegadamente convocado para discutir os últimos pormenores da campanha do general Soares Carneiro, mas voaria para o Porto, onde aguardaria na gare do aeroporto das Pedras Rubras (hoje, aeroporto Sá Carneiro) pela chegada do primeiro-ministro e que horas depois, sem nunca ter abandonado o aeroporto, reembarcaria, no mesmo avião, para Lisboa para assumir a liderança do Governo como primeiro-ministro, contrariamente ao que o próprio Sá Carneiro desejaria, conforme testemunhos que o SEMANÁRIO recolheu de Cunha Rego, ainda em vida, e que nos foram mais tarde confirmados por Freitas do Amaral.

As investigações da Judiciária são rápidas e Freitas do Amaral chega mesmo a admitir como mais provável a tese do acidente em Camarate. Agora, já como ministro da Defesa da segunda AD, Freitas continuava a não ter a tutela dos serviços de informações militares, devido à autonomia das Forças Armadas, que dependiam do Conselho da Revolução, que tinha competência praticamente exclusiva sobre questões de Defesa.

Freitas do Amaral haveria, anos mais tarde, ante a evidência de algumas suspeitas, de vir a corrigir a sua interpretação sobre Camarate.

Freitas do Amaral distanciara-se de Balsemão e, intempestivamente, abandona o Governo, provocando as eleições de 1983, que abririam, depois, espaço ao bloco central, já com Mota Pinto na liderança do PSD.

Ficava, entretanto, como ministro da Defesa Interino, Ricardo Baião Horta, e no Bloco Central emergiam Jaime Gama e Ângelo Correia, na área da Defesa Nacional.

A tese do acidente tinha ganho na opinião pública e o assunto ficava arquivado nos tribunais, apesar da família das vítimas e alguns amigos continuarem a dizer que se tratou de acidente.

Eurico de Melo assume a Defesa com Cavaco Silva, mas a alegada história do desaparecimento de documentos da NATO, que viriam depois a ser encontrados nas mãos de um travesti em Almada e que alegadamente teria conduzido à sua demissão do executivo do PSD, parece uma história demasiado mal contada, segundo elementos do Ministério Público, que o SEMANÁRIO contactou.

Na magistratura, Eurico foi vítima alegadamente de uma conspiração que visava afastá-lo da Defesa e que teria surtido o seu efeito. Sucederia o homem do Bloco Central, Fernando Nogueira, que acabaria por vir a ser o número dois do aparelho laranja e a impor a sua liderança ao PSD, logo a seguir à decisão de Cavaco Silva de não se recandidatar.

A questão de Camarate morre por essa altura e só volta a emergir, já no governo socialista, com a notícia da prescrição do crime. Novas investigações são tentadas e como único documento aparece, apenas, o registo da entrada de Lee Rodrigues e José Esteves, alegadamente envolvidos no atentado, no Aeroporto da Portela, no dia do acidente.

Entretanto, António Vitorino, que viria depois a seguir para Bruxelas como comissário europeu e que, a semana passada, era indigitado como um dos mais fortes candidatos a secretários-gerais da NATO, depois de Robertson e com o apoio dos EUA, assumia a pasta da Defesa do Governo de Guterres e, como primeira decisão, liquidava com as relações de poder estabelecidas dentro do alegado tráfico e venda de armas nas Forças Armadas, que vinham desde o tempo do Bloco Central e concentraria as indústrias de Defesa Nacional no IPE, debaixo da tutela de Rui Neves, de sua confiança.

Uma situação que provocaria a falência, em série, de alguns dos conhecidos “dealers” de armas portuguesas.

Com Paulo Portas restabelecem-se os equilíbrios anteriores a António Vitorino e a indústria de Defesa volta para a esfera do Ministério da Defesa.

O revisionismo tem o seu momento. A polémica ganha novos contornos com o próprio primeiro-ministro de então, Francisco Pinto Balsemão, a admitir que Camarate não foi um acidente mas um atentado. Os livros de Inês Serra Lopes e de Sá Fernandes são “best-sellers” e a história do atentado avança mesmo para a película, com a realização do filme de Luís Filipe Rocha.

Vinte e três anos depois, a Comissão Parlamentar de Inquérito pede, pela primeira vez, a abertura dos ficheiros do Fundo de Defesa do Ultramar. O ministro da Defesa, Paulo Portas, autoriza que um grupo de auditores do Ministério das Finanças investigue as contas. Na berlinda ficam sobretudo militares ou ex-militares, afirma-se nos meios militares.

O que dá jeito a Portas, que fica com eles nas mãos, eles que são homens da América, tal como o primeiro-ministro Durão Barroso, convidado de Georgetown, a universidade jesuíta, que alegadamente forma agentes para a CIA.

Eurico de Melo afastou-se, com Durão Barroso no Poder, da política, definitivamente, mas não falta quem, alegadamente, o queira envolver em histórias do quotidiano, na intriga política-judiciária de Lisboa.
Não podendo haver julgamento judicial, poderá ainda haver julgamento político.

Mas nos meios da magistratura, o acto de Portas de dar acesso ao Fundo de Defesa do Ultramar a auditores das Finanças tem mais a ver com ajustamentos internos, que propriamente com Camarate, cuja comissão parlamentar é presidida pelo centrista Rui Melo.

Porque ao mesmo tempo que correu a investigação judicial, que nada concluiu e até chegou ao cúmulo de destruir ou negligenciar provas, o certo é que decorreu, por imposição da lei, uma outra investigação, também dos Serviços de Informação Militares. Serviços controlados pela esquerda, mas totalmente operacionais naquela época e que herdaram a competência do tempo do Exército Colonial, profissional e bem preparado, embora enfraquecido moralmente.

São esses papéis que Paulo Portas não deixou ver. São esses os papéis, os ficheiros secretos onde tudo deverá estar registado, que estão à guarda das Forças Armadas e que, no dia em que forem abertos, poderão revelar a dimensão da conspiração que poderá ter conduzido ao crime de Camarate.