2025/09/10

“As notícias sobre a crise no Bloco são manifestamente exageradas”

Luís Fazenda, em entrevista ao SEMANÁRIO, afirma que as notícias sobre “a crise interna no Bloco são manifestamente exageradas”. Em relação à revisão do regime do subsídio de desemprego, o parlamentar do BE considera que “este acordo não favorece, como devia, a parte mais fraca da equação, que são os desempregados”

O Governo liderado por José Sócrates enfrenta uma crise interna?
O problema deste governo não é a existência de uma eventual crise interna, que se desconhece, mas sim a continuação de uma política recessiva que agrava as condições da economia, aprofunda as desigualdades sociais e aumenta o desemprego.

Como vê o Bloco de Esquerda a revisão do regime do subsídio de desemprego?
Este acordo não favorece, como devia, a parte mais fraca da equação, que são os desempregados. Como se já não fosse suficientemente difícil a sua situação, aproveita-se da sua fragilidade para os obrigar a aceitar um emprego para o qual não podem não estar habilitados, com um corte no ordenado e a milhas da sua residência. Prejudica, também, os direitos dos mais jovens que passam a receber uma espécie de subsídio de desemprego sazonal.

Qual a opinião do Bloco sobre o primeiro mês de Cavaco Silva como Presidente da República, designadamente em relação à sua visita ao Hospital D. Estefânia, em Lisboa?
O mandato de Cavaco Silva é para cinco anos. Não há nenhuma razão para fazer um balanço ao fim de um mês.

Romano Prodi é o líder que a Itália precisa?
Berlusconi era o líder que a Itália não precisava. Um governante que se candidatou a um cargo com o fito de se livrar dos seus problemas com a justiça, governando em proveito pessoal e que afundou o país numa grave crise económica e social. Esperamos, agora, que Prodi confirme aquilo que disse quando era presidente da Comissão Europeia, quando considerou que o Pacto de Estabilidade e Crescimento é mesmo estúpido e que opte por políticas inteligentes.

Não estamos, hoje, perante uma profunda crise da esquerda, quando os partidos emanados desse campo político, ao encontrarem-se no poder, governam maioritariamente através de políticas próprias da direita?
Ao estender a generalização de um comportamento particular a toda a esquerda essa leitura é um pouco abusiva. Estamos, isso sim, perante uma crise dos partidos que assim procedem. Em todo o caso, estes partidos não esgotam o campo da esquerda.

Como analisa o Dr. Luís Fazenda a actual crise interna existente no Bloco, nomeadamente em relação à crispação criada pela participação de Joana Amaral Dias na campanha de Mário Soares para a presidência da república?
As notícias sobre a crise interna no Bloco são manifestamente exageradas. O exemplo que refere, aliás, já foi respondido pela própria Joana Amaral Dias em duas entrevistas concedidas na semana passada. Foi a própria que esclareceu que foi bem recebida na Mesa Nacional do Bloco. Nem podia ser de outra forma, a Joana Amaral Dias é uma militante e dirigente do Bloco no pleno exercício dos seus direitos.|
Duarte de Albuquerque Carreira

“Durão Barroso será o nosso homem na Europa”

Em entrevista ao “SEMANÁRIO, Daniel Estulin, que investiga o clube de Bilderberg há treze anos, fala sobre os portugueses que têm participado nas suas reuniões, na crise política de 2004 em Portugal
e da influência de Bilderberg na escolha de Durão Barroso para presidente da Comissão Europeia. Estulin diz que as suas fontes lhe confirmaram que Henry Kissinger, um membro permanente de Bilderberg, terá dito o seguinte sobre Durão: é “indiscutivelmente
o pior primeiro-ministro na recente história política.
Mas será o nosso homem na Europa”. Daniel Estulin lançou recentemente em Portugal o livro “Clube Bilderberg, os Senhores do Mundo”, com chancela da Temas e Debates.

Quais os portugueses que participaram na reunião de Bilderberg de Stresa, em 2004?
Francisco Pinto Balsemão, Pedro Santana Lopes, José Sócrates. A lista de participantes portugueses ao longo dos anos é bastante extensa, se considerarmos o tamanho do país.

Nessa reunião, face ao poderio e influência de Bilderberg e ao facto de ser um clube predominantemente europeu e americano, alguém defendeu Durão Barroso para presidente da Comissão Europeia? Recordo–lhe que Durão foi escolhido para a Comissão dias depois da reunião de Bilderberg.
Torna-se importante compreender que é irrelevante quem ocupa a cadeira de presidente da Comissão Europeia. Durão Barroso representa os interesses do “governo mundial”. Tanto Kissinger como Rockefeller apoiaram energicamente a candidatura de Durão Barroso para aquele posto.
Barroso também foi amplamente apoiado pelos bilderbergers americanos em Stresa, por este ter apoiado a intervenção americana no Iraque. No entanto, Durão foi resguardado. Recorda-se da tão criticada cimeira dos Açores, justamente antes da Guerra do Iraque? O consenso na altura foi no sentido de não considerar Durão Barroso um verdadeiro participante na cimeira. Agora, começa tudo a fazer sentido. Ele foi afastado para tornar a sua nomeação para a Comissão Europeia mais apelativa. Desta forma, ele não fica ligado ao fiasco iraquiano.
Outro dos apoiantes de Barroso foi John Edwards, candidato a vice-presidente dos EUA, com John Kerry, que também esteve presente nas reuniões de Bilderberg. Como nota de referência, tenho relatórios de várias fontes internas da reunião de Bilderberg que referem a fraca capacidade oral e a fraca personalidade de Barroso. Decidiu-se mesmo limitar as suas aparições em público ao mínimo. Kissinger, um membro permanente de Bilderberg, chegou ao ponto de o chamar, “off the record”, “indiscutivelmente o pior primeiro ministro na recente história política. Mas será o nosso homem na Europa”.

Santana Lopes esteve presente em Stresa e um mês depois era primeiro-ministro. Há alguma relação nestes dois factos?
Aprendi ao longo dos anos a seguir de perto todos os passos dos bilderbergers nas semanas que se seguem à sua reunião anual. Por exemplo, logo a seguir à reunião anual de Stresa, Itália (3-6 deJunho), gerou-se uma crise política em Portugal, que teve o seu fim no final do mês. Durão Barroso, primeiro ministro (agora presidente da Comissão Europeia), demitiu-se oficialmente a 29 de Junho. O rumor à volta do nome de Santana Lopes como futuro primeiro-ministro é lançado por volta de 28 de Junho. Curiosamente, é nesse dia que ele afirma não ser verdade que tenha sido convidado para participar na reunião anual de Bilderberg. Isso foi até alguém mostrar-lhe uma foto que eu tirei em Stresa.
Muito tem sido dito acerca de Barroso ter escolhido o seu companheiro do PSD, Santana Lopes, para seu sucessor. Essa escolha foi intencional, como toda a confusão que se seguiu. O que as pessoas não sabem é que a falsa noção de democracia é suposto ser isso mesmo – um truque. A esquerda e a direita são propriedade dos bilderbergers, não só em Portugal como em todos os países. Barroso é um bilderberger, assim como Sampaio, Lopes, Sócrates, etc. Na Alemanha, tanto Merkel como Schroeder, estavam presentes na conferência deste ano. Da Espanha, Rato, presidente do FMI e ex-ministro das Finanças de Aznar, esteve presente em Rottach-Egern, este ano. O conselheiro económico-chave de Zapatero, Miguel de Sebastian, também lá esteve. Blair é um bilderberger, assim como Kenneth Clarke, um dos membros-chave dos conservadores britânicos e, supostamente, um dos seus maiores inimigos.
Em relação a Santana Lopes, pude confirmar junto de três fontes independentes que a conversa de final de tarde a 4 de Junho de 2004 (durante a reunião de Bilderberger em Stresa), andou à volta do plano de Santana em mudar a Constituição portuguesa, para criar um nova instituição de poder, um Senado, em que o governo poderia nomear senadores vitalícios. O que conduziu à resposta sarcástica de Richard Haass, presidente da CFR (Trilateral): “Não soa muito a uma tentativa genuína de reforma democrática.”

À semelhança de Santana, Sócrates também participou na reunião de Stresa e menos de um ano depois também era primeiro-ministro…Tive acesso a informação contraditória pelas minhas fontes, algumas delas a dizer que Sócrates foi colocado para criar ainda mais descontentamento dentro das suas próprias fileiras. Outros dizem que o seu verdadeiro propósito ainda está por ser determinado.

Quem levou Santana e Sócrates para a reunião de Bilderberg de 2004?
Pinto Balsemão, o homem mais poderoso em Portugal e um membro-chave do todo poderoso comité de decisão da Bilderberg. Pinto Balsemão é o mais importante bilderberger português. Desde o início dos anos noventa que é um um membro permanente do comité de decisão (steering) de Bilderberger, significando que pertence a um grupo de pessoas que tomam as decisões finais acerca dos proponentes, temas de agenda, etc. Ele é o “homem bilderberger em Portugal”. Nenhuma decisão pode ser tomada sem o seu selo de aprovação. Presidentes e primeiros-ministros vão e vêm, mas Balsemão permanece. É a solitária sombra do poder.

O ex-ministro Morais Sarmento participou na reunião deste ano de Bilderberg. Também foi Balsemão quem o convidou?
Também foi Pinto Balsemão quem o levou.

Paulo Portas, um ex-ministro do Partido Popular, nunca esteve em Bilderberg?
Portas nunca esteve presente em nenhuma reunião de Bilderberg. Não sei porquê. Balsemão nunca me disse (irónico). No entanto, pelo que pude apurar das minhas fontes, Portas não oferece garantias aos próprios bilderbergs.

O clube tem mesmo influência política a nível mundial ou foi já um mito que se criou?
Para além do que já referi, até sobre Portugal, gostaria de usar como exemplo da influência de Bilderberg as eleições alemãs de 2005. Na conferência de Bilderberger em Rottach-Egern, os bilderbergers queriam mudar a imagem enfadonha de Angela Merkel, a “futura líder” da Alemanha nas eleições alemãs a 18 de Setembro. Um homem bilderberger deu a opinião que para que os eleitores alemães pudessem aceitar Merkel como chanceler seria importante dar uma nova definição do termo valores de família. Bilderbergers alemães bem versados na psique colectiva bavariana acreditavam que a imagem de Merkel, uma divorciada com um doutoramento em física, não seria considerada de “confiança”, por forma a atrair votos suficientes nesta firme área conservadora do país. Seria, então, importante enfatizar a importância do conceito de família. E esta estratégia foi aplicada nas eleições.
Sobre Merkel, recordo, ainda, que com os Bilderbergers a colocar de parte Schroeder a favor de um novo candidato, isto poderia significar que após três anos de guerrilha entre bilderbergers americanos e europeus em torno da guerra do Iraque, o clube estaria pronto para colocar em marcha uma política mais coesa. Lembre-se que Schroeder, assim como o Presidente Chirac, eram dos mais vociferantes críticos da intervenção americana no Iraque. Schroeder, representando a esquerda, e Merkel, representando a direita, são propriedade dos Bilderbergers. Apesar de Bush junior não estar presente pessoalmente na reunião secreta em Rottach-Egern, o governo americano estava bem representado por William Luti, Richard Perle e Dennis Ross do Instituto de Washington de Near East Policy.

Os participantes de Bilderberg não falam que estiveram presentes nas reuniões e muitas vezes desmentem mesmo que tenham lá estado…
Os participantes do clube estão explicitamente proibidos de discutir Bilderberg em público.

O que foi discutido em Stresa, em 2004?
Para além do que já disse, outro dos items de Stresa esteve relacionado com a “liberalização dos mercados mundiais”. Os bilderbergers sempre estiveram a favor de extremo liberalismo. Estamos a chegar a um nível profundo de liberalismo com tendência a ser restaurado em máxima força nas suas crenças e credo. Historicamente, o liberalismo sempre reivindicou três liberdades: liberdade de mão de obra. Isso não significa que os trabalhadores serão livres, mas que o povo será livre de se mover de um país para o outro, uma região para outra. Para os bilderbergers isso é muito importante. Significa que os patrões terão um livre acesso a uma grande massa de mão-de-obra. Quanto mais global for, melhor. Liberdade de solo: significando que o solo é tão importante como qualquer outra mercadoria. Liberdade de moeda. Em que o dinheiro também é uma mercadoria como qualquer outra. Recordo que a primeira vaga de liberalismo desvaneceu-se entre 1920-1930, após ter feitos muitos estragos nas sociedades americanas e europeias. O seu sistema afirmava que se tudo for livre e as empresas não efectuarem cartéis ou monopólios, com nenhum trabalhador a pertencer às centrais sindicais, o sistema irá enriquecer toda a gente. Isto é uma perfeita utopia, mas baseados nas obras de economistas laureados com o Prémio Nobel da Economia, bem como desenvolvimentos matemáticos, isto parece aos seus olhos verdade. O sistema exige que cada país do mundo seja incluído, e que cada indivíduo seja eficaz. É por isto que o liberalismo e a globalização trabalham tão bem juntos. Como é por isto que existe o grupo Bilderberg.

Portugal recebeu, em 1999, uma primeira reunião de Bilderberg, que teve lugar em Sintra. O que foi aí discutido?
Um dos itens principais teve a ver com o comércio de ouro e a posição da Inglaterra na União Europeia. Em Sintra os bilderbergers decidiram castigar a Inglaterra pela sua contínua resistência em relação ao espírito federal europeu. O método que estavam preparados a utilizar contra os inocentes britânicos seria o de um ataque frontal ao comércio de barras de ouro. Um grupo restrito de Bilderberg, onde estavam Rockefeller, Kissinger, Victor Halberstadt, professor de economia da Universidade de Leiden, Etienne Davignon e Umberto Agnelli, reuniu com os governadores dos Bancos Centrais da Europa. A seguir à reunião de Sintra, a maioria dos Bancos Centrais, em Setembro de 1999, fizeram uma supreendente declaração em que estariam a adiar, por cinco anos, o dumping de ouro, que previamente teriam feito, supostamente porque já não gostavam de ter ouro nas suas reservas. O anúncio causou um tendência de subida nas barras de ouro. O Banco de Inglaterra organizou um leilão de ouro de algumas supostas reservas. O mais impressionante para alguns de nós, não familiarizados com o comércio do ouro e a sua realidade, é que, na realidade, uma barra de ouro quase nunca é comercializada. Dessa forma o Banco de Inglaterra estaria a oferecer ouro “teórico” (apenas em papel), não o verdadeiro ouro que tinha em sua posse. Quando o bilderberger George Soros descobriu, lançou um ataque ao Banco de Inglaterra, causando que o preço do ouro aumentasse para quase 330 dólares a onça.|

Todos os portugueses de Bilderberg

O SEMANÁRIO publica, em exclusivo, a lista de todos os portugueses que já estiveram em reuniões de Bilderberg, um clube que é considerado uma espécie de governo-sombra a nível mundial. Uma das principais tarefas dos jornalistas que investigam o clube é não só saber quem participa nas reuniões mas, sobretudo, acompanhar o seu percurso nos tempos seguintes. Quase todos, ascendem a altos postos. Na reunião que teve lugar de 3 a 6 de Junho, em Stresa, em Milão, Santana Lopes e José Sócrates estiveram presentes, juntamente com Pinto Balsemão. Curiosamente, Santana seria primeiro-ministro dois meses depois e nem passaria um ano para José Sócrates chefiar o Governo. Outros três intervenientes na crise política de 2004, o Presidente da República, Jorge Sampaio, Durão Barroso, então primeiro-ministro, e Ferro Rodrigues, então líder do PS, também estiveram em reuniões de Bilderberg. Sampaio esteve presente em 1999, na reunião
de Sintra. Durão é um velho conhecido de Bilderberg, tendo estado presente em 1994, 2003 e já este ano, na Alemanha, na qualidade de presidente da Comissão Europeia. Já Ferro esteve presente na reunião de 2003.

Francisco Pinto Balsemão – É um membro permanente do Clube de Bilderberg desde 1988, tendo participado em quase todas as reuniões anuais desde essa data. Pertence mesmo ao comité restrito, denominado “Steering”. É ele quem tem convidado muitas personalidades portuguesas a estarem presentes no clube. Em 1988, Pinto Balsemão tinha abandonado o cargo de primeiro-ministro há 5 anos e estava dedicado aos seus negócios, mantendo também o “Expresso”. Anos depois abriria a SIC, aproveitando a liberalização da televisão feita pelo governo de Cavaco Silva. O processo conturbado, com divisões no próprio Conselho de Ministros, tendo o grupo televisivo de Proença de Carvalho sentido-se desfavorecido. Pinto Balsemão é hoje presidente da Impresa. Falado como potencial candidato presidencial, nunca se concretizou esta hipótese.

Mira Amaral – Ministro da Indústria de Cavaco Silva. Participou na reunião de Bilderberg em 1995, no final do governo de Cavaco Silva, numa altura em que o professor rumava à corrida a Belém e Fernando Nogueira e Durão Barroso disputavam a liderança do PSD. O facto de ter estado presente pode significar que o seu nome esteve fadado para mais altos voos, que depois não se concretizaram. É especialista em energia e tem-se dedicado à sua actividade de administrador de empresas. Foi administrador da Caixa Geral de Depósitos, tendo saído do banco num processo político conturbado. Só participou em Bilbderberg na reunião de 1995.

Joaquim Ferreira do Amaral – Ministro das Obras Públicas de Cavaco Silva, uma das cartas mais importantes do governo, artíficie das auto-estradas portuguesas. Tem mostrado disponibilidade para combates difíceis, tendo perdido Lisboa para João Soares. Participou na reunião de Bilderberg que ocorreu em Sintra, em 1999, uma das que teve mais participantes portugueses. A sua presença é significativa, tanto que dois anos depois seria candidato à Presidência da República, defrontando Jorge Sampaio. Só esteve presente em 99.

António Barreto – Este investigador esteve presente na reunião de 1992, em pleno cavaquismo, um ano depois de Cavaco obter a sua segunda maioria absoluta. António Barreto foi ministro da Agricultura nos primeiros governos PS, tendo deixado o seu nome associado à Lei Barreto, massacrada pelos comunistas por traduzir o primeiro desmantelamento da reforma agrária. Teve um papel essencial na candidatura presidencial de Soares em 1986, sendo o seu porta-voz. Foi ele quem apelou ao “povo de esquerda” para a segunda volta de Soares contra Freitas do Amaral. Nos últimos anos tem-se dedicado à investigação e a comentários e análises nos jornais. É uma mente brilhante, o género de pessoa que os bilderbergs políticos gostam de ver no seu seio. Só participou na reunião de 92.

Durão Barroso – Participou na reunião de Bilderberg de 1994, quando era ministro dos Negócios Estrangeiros de Cavaco Silva. Não por acaso, um ano depois estava a candidatar-se à liderança do partido. Perdeu para Fernando Nogueira, mas a sorte acabou por o bafejar, porque Nogueira foi derrotado por Guterres (num ciclo político muito desfavorável ao PSD). Durão ficou como reserva e tornou-se líder social-democrata em 1999, quando Marcelo Rebelo de Sousa saiu. Apesar de ter perdido as legislativas de 99 para Guterres não se deu por vencido, ficando célebre a sua frase “tenho a certeza que serei primeiro-ministro, só não sei é quando.” O seu vatícinio acabou por confirmar-se, tornando-se primeiro-ministro em 2002. Em 2003, voltou a estar presente no clube de Bilderberg, na qualidade de primeiro-ministro. Em meados de 2004 era designado presidente da Comissão Europeia. Voltou a participar na reunião deste ano de 2005 de Bilderberg, que teve lugar na Alemanha, na qualidade de presidente da Comissão.

António Borges – É o homem português da Goldmam Sachs, curiosamente uma empresa com ligações a Bilderberg. Esteve presente na reunião do clube em 1997, o que mostra que o seu nome é badalado para altos voos há muito tempo. Se estava na calha para a liderança laranja, acabou por ser Durão a tomar o lugar de Marcelo. Em 1998, escapou, miraculosamente, ao acidente fatal da TWA, que não deixou sobreviventes. Chegou a ter bilhete mas não embarcou. Na reunião de 2003 do clube voltou a estar presente. Em 2004, foi um dos principais critícos da solução Santana Lopes para suceder a Durão Barroso. Actualmente, está posicionado para suceder a Marques Mendes. É um homem muito próximo de Cavaco Silva, ainda que o professor não favoreça as amizades e às vezes até as discrimine.

Maria Carrilho – Investigadora, sempre esteve ligada ao PS, tendo sido deputada à Assembleia da República e ao Parlamento Europeu. Hoje é vice-presidente da Assembleia da República. É especialista em assuntos de defesa, uma área prioritária nas discussões de Bilderberg. Esteve presente na reunião do clube em 1995, o ano da chegada ao poder de António Guterres.

António Guterres – Esteve presente na reunião deste ano na Alemanha, já na qualidade de Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados. O seu nome continua a ser uma hipótese para outros voos, designadamente o Palácio de Belém, em 2011 ou 2016.

Roberto Carneiro – Ministro da Educação de Cavaco Silva. Esteve presente na reunião de 1992, no auge do cavaquismo. Chegou a ser-lhe vaticinada uma importante carreira política mas, depois da queda de Cavaco, os seus interesses viraram–se para outras áreas. Envolveu-se no projecto inicial da TVI, como profundo católico que é, e tem-se dedicado à investigação universitária e a algumas iniciativas empresariais.

Vitor Constâncio – Esteve presente em Bilderberg em 1988, quando era secretário-geral do PS. Nunca mais participou em nenhuma reunião depois desta data. Afastou-se das lides mais activas do PS e dedicou-se ao que sabe fazer muito bem: os assuntos económicos. O Partido premiou-o com o Banco de Portugal.

Vasco Pereira Coutinho – Um dos maiores empresários portugueses, tendo enriquecido com o negócio da AutoEuropa. Esteve presente na reunião de 1998, numa altura em que Marcelo Rebelo de Sousa liderava o PSD. Durão Barroso fez uma viagem de férias ao Brasil, no avião dele e na sua casa, quando era primeiro-ministro, provocando grande polémica. É apoiante de Cavaco Silva.

João Cravinho – Esteve presente na reunião de 1999, no auge do guterrismo, sendo ministro do Planeamento e da Administração do Território. Alia um pensamento interessante a uma excelente preparação técniva, devendo ter participado no clube como um dos “cérebros” que os políticos gostam de ouvir. Atacou bastante Guterres no fina dos seus dias, sendo um homem próximo de Jorge Sampaio (mas muito senhor do seu nariz).

José Cutileiro – O embaixador português esteve presente na reunião de Bilderberg em 1994, tornando-se presidente da estrutura de defesa da União Europeia, a UEO, logo nesse ano. É um homem culto, brilhante, com opiniões geoestratégicas muito auscultadas por qualquer governante.

José Manuel Galvão Teles – Advogado, homem muito próximo de Mário Soares, de quem é amigo e vizinho. Esteve presente na reunião de Bilderberg de 1997, no auge do guterrismo. É conselheiro de Estado.

Teresa Patrício Gouveia – Fez parte do governo de Cavaco, como secretária de Estado da Cultura e como ministra do Ambiente. Esteve presente na reunião de Bilderberg em 2000.Foi ministra dos Negócios Estrangeiros de Durão Barroso.

Marçal Grilo – Ministro da Educação de António Guterres, de quem era amigo. Esteve presente na reunião de Bilderberg de 1999, em Sintra. Há quem diga que é uma mente brilhante.

Miguel Horta e Costa – Esteve presente na reunião do clube em 1998, no tempo da liderança laranja de Marcelo, sendo vice-presidente da Portugal Telecom. Já no tempo de Durão Barroso ascendeu à presidência da empresa, mantendo-se com Santana Lopes e José Sócrates, todos bilderbergs. Deverá sair da PT já em Janeiro.

Margarida Marante – É um dos dois jornalistas que marcaram presença em Bilderberg, tendo estado presente em 1996, no auge da sua carreira na SIC, onde conheceu Emídio Rangel e contraiu matrimónio. É próxima da área do PSD.

Vasco de Mello – Um dos grandes empresários portugueses. Esteve presente na reunião de Sintra, em 1999. Tem tido um percurso discreto, mantendo pontes com o poder político mas não dando azo a conversas.

Carlos Monjardino – Homem da área do PS, que participou no governo de Macau. Grande empresário, com ligações fortes ao Oriente, sobretudo a Stanley Ho. Presidente da Fundação Oriente. Há muito que é falado para candidato presidencial mas nunca conseguiu concretizar essa aspiração. Esteve presente na reunião de Bilderberg de 1991, no auge do cavaquismo e da reeleição de Mário Soares, de quem é muito próximo.

Murteira Nabo – Ministro fugaz de António Guterres, tendo de se demitir por causa de um caso de sisa. Esteve presente na reunião do clube em 1999, já era presidente da PT há três anos.

Faria de Oliveira – Ministro do Turismo de Cavaco Silva, esteve presente na reunião de Bilderberg em 1993, sendo uma peça essencial na ligação entre o então primeiro-ministro e o mundo dos negócios, quer público, quer privado.

Carlos Pimenta – Ministro do Ambiente de Cavaco, um dos mais activos de sempre. Chegou a ser-lhe vaticinando um futuro político risonho. Esteve na reunião de Bilderberg de 1991. Nos últimos anos, afastou-se da política.

Francisco Lucas Pires – O malogrado líder do CDS, que depois se aproximou do PS, era uma mente brilhante, a quem pareciam reservados altos voos. No entanto, só esteve presente na reunião do clube de 1988.

Ricardo Salgado – Um dos grandes banqueiros portugueses. Esteve na reunião de 1997, quando Marcelo era líder do PSD e voltou a estar na reunião de 1999, em Sintra. É um homem com relações privilegiadas com o poder político à direita. Santana Lopes chegou a chamá-lo para uma reunião privada. Viu o seu banco, o BES, ser alvo de buscas judiciais este ano.

Jorge Sampaio – Presidente da República. Participou na reunião de Bilderberg, em Sintra, na qualidade de primeiro magistrado da Nação portuguesa, uma presença, sem dúvida, polémica.

Nicolau Santos – O outro jornalista que participou em Bilderberg, tendo estado em Sintra em 1999. É especialista em assuntos económicos. Curiosamente, os jornalistas que estiveram no clube eram ambos profissionais no grupo de Balsemão, Nicolau Santos no “Expresso” e Margarida Marante na SIC.

Artur Santos Silva – Um dos grandes banqueiros portugueses, com o seu BPI. Tem relações privilegiadas à esquerda e é um homem culto, de uma família espiritual. Esteve presente na reunião de 1999. Curiosamente, nesta reunião só acabou por faltar um banqueiro do BCP, um banco com outra estratégia, mais europeia.

Marcelo Rebelo de Sousa – Esteve presente na reunião de 1998, quando era líder do PSD e ainda julgava que era possível fazer renascer a AD com Paulo Portas e ganhar as eleições legislativas de 1999 a António Guterres. As coisas correram-lhe mal, metendo o caso da Universidade Moderna pelo meio (afectando Portas). Regressou ao comentário político. A entrada na corrida de Belém também falhou, porque tudo correu bem a Cavaco.

Miguel Veiga – Advogado nortenho, um histórico do PSD, com relações fortes com a ala soarista do PS. Esteve em Bilderberg em 1994, no fim do cavaquismo. Tornou-se um dos piores inimigos de Santana Lopes, sendo a voz mais forte contra a sua indigitação para primeiro-ministro, sucedendo a Durão Barroso.

António Vitorino – Era a eminência-parda do guterrismo, tendo estado na reunião de Bilderberg de 1996, quando era vice-primeiro-ministro e ministro da Defesa. Por causa de um caso de sisa, acabou por se demitir. Foi comissário europeu e o seu nome chegou a estar na calha para presidir à Comissão. Rejeitou ser candidato à Presidência da República.

Oliveira Martins – Participou na reunião de 2001, quando era ministro da Presidência do governo Guterres, já no ocaso do guterrismo, depois da queda da ponte de Castelo de Paiva. Se não fosse independente, tinha sido um nome possível para a corrida à liderança do PS. Tornou-se presidente do Tribunal de Contas este ano, numa nomeação polémica, face à natureza das funções do órgão, que requerem independência e imparcialidade.

Vasco Graça Moura – Deputado ao Parlamento Europeu pelo PSD, poeta e erudito. Esteve presente na reunião de 2001 de Bilderberg. É um intelectual brilhante, que os políticos gostam de ouvir.

Ferro Rodrigues – Esteve presente na reunião de 2003, quando era líder do PS, pouco depois de ter deflagrado o caso Casa Pia no partido. Depois de Jorge Sampaio ter dado posse a Santana Lopes, demitiu-se, tomando a decisão presidencial como uma derrota pessoal. É hoje embaixador português da OCDE em Paris.

Santana Lopes – Esteve presente na reunião de 2004, que ocorreu de 3 a 6 de Junho em Stresa, Milão. Curiosamente, pouco mais de um mês depois era primeiro-ministro de Portugal. A vida, contudo, não lhe correu bem. Ao ponto de Jorge Sampaio ter dissolvido o Parlamento e convocado eleições legislativas.

José Sócrates – Tal como Santana Lopes, esteve presente na reunião de Stresa de 2004. Curiosamente, menos de um ano depois seria primeiro-ministro de Portugal, parecendo estar no cargo de pedra e cal. Malgré Cavaco Silva.

Nuno Morais Sarmento – Esteve presente na reunião de Bilderberg deste ano, tendo sido convidado por Pinto Balsemão, um facto que pode ter significado nos próximos tempos.

A corporação socialista

A lei sobre política criminal que vem aí, prevista na Constituição mas nunca concretizada pelos governos, é mais um invento simples de Sócrates que só tem um
pequeno problema:
confunde-se muito com o caso Pedroso

A lei sobre política criminal que vem aí, prevista na Constituição mas nunca concretizada pelos governos, é mais um invento simples de Sócrates, uma espécie de bricolage para juntar à liberalização da venda de medicamentos e à redução das férias judiciais.
É evidente, porém, que as engenhocas de Sócrates não podem ser vistas fora do contexto. O primeiro-ministro é produto das suas circunstâncias. Sem o caso Casa Pia, sem a prisão de Paulo Pedroso, sem o abraço amigo de Sócrates a Ferro, sem o sexto sentido do próprio António Guterres, muito cedo convencido que o caso Casa Pia era uma horrenda conspiração contra o PS, certamente que o dogma da autonomia (puxada para a independência) do Ministério Público ainda dava cartas a esta hora, provavelmente com António Costa e Alberto Costa a gritarem crime de lesa-majestade a quem se atrevesse a tocar no poder do MP. Ainda em 1997, era António Costa ministro da Justiça e, contra a vontade do PSD, que era a de esvaziar mais os poderes do MP, o PS recusou-se a ir mais longe. O que mudou de então para cá?
As circunstâncias do caso casapiano têm um lado e o seu reverso. Induzem, porventura, a uma determinada política e, estando lá, são uma marca ou uma mácula incontornável. Que se presta a diferentes interpretações, a más línguas. Esta pode ser a maior arma das magistraturas contra a política da Justiça do Governo. E, inversamente, claro está, a maior fragilidade da parte do executivo.
Hoje parece mais do que provado que o PS reagiu como uma corporação no caso Casa Pia, quando Pedroso foi preso. O que torna pertinente a questão de saber se o PS, dois anos depois do caso Pedroso (agora encerrado pela esgotamento dos prazos de recurso em relação à não pronúncia do ex-ministro socialista) não continua corporativista nesta matéria? E, se não está cada vez mais cioso de saber o porquê de tudo? E se, não encontrando resposta para esta matéria, nem podendo exercer “vindicta” contra desconhecidos, no âmbito de uma responsabilidade subjectiva, não terá a tentação (ou já caído no pecado) de resolver as coisas com base na responsabilidade objectiva. O que, neste cenário, se traduziria mais ou menos nisto. Não interessa se o Ministério Público teve culpa ou foi negligente no caso Pedroso. Interessa que Paulo Pedroso e Ferro Rodrigues viram o seu nome enlameado e, como alguém tem de pagar (popularmente diz-se que quem anda à chuva molha-se), que se apliquem as regras da responsabilidade pelo risco e que pague o Ministério Público. Não com a vida mas com a sua autonomia.
É essencial uma lei de política criminal mas, feita neste contexto, todos os cuidados são poucos para acautelar a autonomia do Ministério Público. Uma coisa são critérios de racionalidade e eficiência na aplicação da lei penal. Outra coisa, bem diferente, é condicionar politicamente a açcão do MP no futuro.
Curiosamente, esta solução de resolver as coisas pelo lado da responsabilidade objectiva está inserida num projecto do cada vez mais influente director do Observatório da Justiça, Rui Pereira, um autêntico ministro sombra da área sob a capa de um cargo com contornos institucionais. Há pouco tempo, numa entrevista à SIC-Notícias, Rui Pereira dizia que dentro de pouco tempo vai haver uma lei em que um preso preventivo que venha a ser absolvido do crime de que é acusado deverá ser indemnizado pelo Estado, independentemente de se apurar erro ou negligência grosseira dos magistrados. Ou seja, estamos no campo da responsabilidade objectiva (o que pode ser o início do puxar do cordelinho…). O Estado paga em nome dos deveres e direitos de cidadania. Parece justo e correcto (ainda que o dinheiro para pagar as indemnizações suscite outro tipo de problemas, ao nível do défice público). No entanto, uma questão se suscita. Porque é que só agora, curiosamente com Pedroso a pedir uma indemnização ao Estado por ter estado preso preventivamente, o PS se lembrou de tal iniciativa?
As águas mornas em que navegou Alegre com Cavaco fazem sugerir que os candidatos da esquerda podem ser umas pestezinhas com o professor na campanha mas que dentro do recinto televisivo se portam como “gentlemen”.
A esquerda não anda nada bem. O debate de Alegre com Cavaco, que este ganhou distanciado, parece indicar que, depois de tanta falatório com os encontros televisivos, ainda é Cavaco que vai ficar a rir-se dos quatro candidatos de esquerda. Por outro lado, desconfia-se que o tão falado “caso” que a esquerda procura desesperadamente para entalar Cavaco, ainda vai estoirar… em casa.
Com o tempo a passar, quanto mais Cavaco resistir às armadilhas da esquerda, mais Alegre e Soares devem ficar com os nervos em frangalhos…
A tragicocomédia da esquerda nestas presidenciais já chegou ao ponto de Mário Soares e Manuel Alegre disputarem a amizade de Jerónimo de Sousa, para ver a quem toca mais o voto comunista. O primeiro disse há duas semanas que não dormia descansado com a eleição de Cavaco, parafraseando o líder do PCP. O segundo declarou na semana passada que não se resigna, tal como disse o amigo Jerónimo. O poeta fez ainda saber que pode chamar amigo a Jerónimo porque privou com ele na Assembleia da República, dando a entender que Soares anda a apregoar o líder comunista mas não o conhece verdadeiramente, o que mostra bem o ridículo em que a esquerda anda metida. Em suma, já faltou mais para Soares e Alegre darem uma volta por Pirescoxe, competindo por um “boneco” com Jerónimo de Sousa no café central da localidade. Não é, aliás, por caso que Jerónimo, transformado num novo ícone, não pára de dar ar o da sua graça. Conta adivinhas, anedotas, lembra António Aleixo, os ditos da Dona Olímpía, sua mãe, e ainda se dá ao luxo de inaugurar um discurso comunista messiânico, fazendo uma excelente condensação de todo o material etnográfico português.
Cavaco Silva, por feitio, formação e estratégia tem falado pouco mas, com uma campanha de esquerda assim é natural que o professor fale ainda menos. Nestas circunstâncias, falar seria, em gíria futebolística, beneficiar o infractor. Por exemplo, se Cavaco denunciasse a disputa de Soares e Alegre pelo voto comunista, estava a dar um tiro ideológico no pé, arriscando que a esquerda corresse a gritar que ele era um perigoso anticomunista.

PS dividido no ataque à Igreja Católica

António Guterres não deixou. E, depois de José Sócrates,fragilizado com as sondagens e o fracasso da sua política económica em ciclo eleitoral, ter permitido o regresso da questão do aborto,
o Aparelho socialista decide voltar ao ataque à Igreja Católica, como pretexto para desviar as atenções da derrota eleitoral. Curiosamente, a linha maçónica
do PS tem Vera Jardim a dar a cara na Igreja Católica, no mesmo dia em que Jorge Sampaio ataca o ministro da Justiça e diz que o descrédito dos políticos decorre da corrupção. Em 2005, houve duas comemorações da República.

Depois do aborto, o discurso jacobino contra a Igreja Católica vai subir de tom. Na quarta-feira, o dia da República, no “Diário de Notícias”, o Aparelho socialista e Vera Jardim deram o tom do novo discurso do Aparelho socialista contra a Igreja Católica. Mais que o Estado laico, pretende-se o Estado “ateu”. Contra os crucifixos nas escolas e o lugar honorífico que particularmente se dá à Igreja Católica nas cerimónias oficiais. Depois do Governo da coligação PSD/PP, aliás, com o empenho de Jaime Gama e de Almeida Santos, ter finalmente assinado com o Vaticano a nova Concordata, a questão religiosa ficou pacificada em Portugal. No PS, a ala católica controlada por Guterres não permitia veleidades à Maçonaria, numa altura em que os velhos maçons republicanos e laicos sentiam estar a viver os últimos dias, com a entrada para a sociedade secreta de “gente sem qualidade intelectual, social e moral”, nas palavras de um antigo maçon apoiante do actual grão-mestre.

Transformar a Igreja no inimigo
para atenuar as críticas ao PS

Vive-se o sentimento que estes são os últimos momentos da velha maçonaria que sempre esteve presente na República, diz fonte maçónica. Agora, a agenda parece começar a ser feita apenas dentro do PS, pelo Aparelho socialista. E, nesta altura, com a derrota previsível nas autárquicas e a difícil conjuntura económica, a estratégia do PS, segundo meios do Aparelho, deveria definir um novo inimigo público. Para o Aparelho a exploração dos sentimentos anticlericais ainda pode ter um papel decisivo, embora se reconheça que a estratégia socialista seguida por Zapatero, em Espanha, de ataque directo à Igreja Católica, para desviar as atenções da crise institucional e constitucional espanhola, possa não resultar em Portugal e virar-se mesmo contra o Governo socialista.
A situação é tão mais caricata quanto actualmente a maioria dos bispos católicos é de esquerda e próximo das posições do PS, tendo ajudado a derrubar Santana Lopes.
Mas, a necessidade de lançar outro tema para fixação do eleitorado e venda nos telejornais, como aconteceu com o aborto, está presente nos socialistas, sobretudo depois do discurso do Presidente da República, Jorge Sampaio, no 5 de Outubro, na sala de jantar do Palácio da Ajuda.

Ataque aos católicos para desviar
atenções da corrupção

Para o Aparelho socialista, o ataque à Igreja Católica pode funcionar como alternativa ao tema da corrupção proposto no dia da República pelo Presidente da República. O PS evitaria discutir a questão do financiamento dos partidos políticos e sobretudo numa altura em que está instaurada a guerra entre as magistraturas e as polícias na instrução do processo, a situação poderia tornar-se perigosa para alguns dirigentes nacionais e autárquicos.
Com efeito, depois do novo estatuto do Ministério Público e das Polícias Judiciárias refeito por António Costa, o ministro da Justiça e Guterres, a Polícia Judiciária, com base nas razões de ordem técnica, passou a ter um instrumento para conduzir o inquérito judicial à margem do Ministério Público, podendo, querendo, fazer assim uma verdadeira agenda política. Foi, aliás, esta a sensação que alguns tiveram no caso da Casa Pia, bem como no caso do Apito Dourado.
Esta situação, aliás, deverá ser alterada pelo actual Governo socialista, Foi, aliás, a consciência que, nos casos limites, pode haver desentendimentos entre o Ministério Público e a Polícia Judiciária, o primeiro uma magistratura independente e a segunda dependente do ministro da Justiça, que leva exactamente o Governo a ponderar a revisão da lei por um lado e por outro cria algum preocupação no PS, sobretudo depois de Jorge Sampaio ter vindo esclarecer, no discurso da Ajuda, que o descrédito da classe política tem a ver com a corrupção.

Sócrates poderá opor-se à agenda do Aparelho

Mas, nos meios parlamentares próximos do primeiro-ministro, admite-se que, embora o primeiro-ministro tenha aceite recolocar a questão do aborto, provavelmente não alinha numa campanha contra a mudança do estatuto privilegiado da Igreja Católica em Portugal. Portugal, apesar de ser um Estado laico, não é um Estado ateu, e historicamente, a sua independência só teve estatuto internacional depois do reconhecimento feito pela Igreja.
A questão do aborto ajudará o Governo socialista a aguentar o efeito do desastre eleitoral previsível para o próximo domingo e as más notícias do Orçamento do Estado para 2006, que, já na próxima sexta-feira será entregue no Parlamento. Sócrates tentará a todo o custo evitar a remodelação, deixando-a para depois das presidenciais. E a questão do aborto poderia ser uma oportunidade para desviar as atenções e o aumento da contestação social, sobretudo tendo em atenção que uma derrota humilhante de Soares nas presidenciais vai obrigar a uma nova postura dos socialistas na governação.
Porém, herdeiro de uma tradição guterrista de cordiais relações com a Igreja Católica, dizem fontes parlamentares, o primeiro-ministro dificilmente alinhará com a agenda de Jorge Coelho e de Vera Jardim de ataque à Igreja Católica.
José Sócrates poderá impedir mesmo o ataque, ainda que numa próxima remodelação não consiga sequer segurar as investigações sobre corrupção na classe política e o próprio ministro Alberto de Costa, sob o fogo cruzado das magistraturas e dos oficiais de justiça, e acabe por ter que gerir a sua agenda política ao sabor dos acontecimentos e da contestação social.