2003-07-10
Depois da controvérsia lançada pelas desajustadas e inadmissíveis afirmações do presidente em exercicio do Conselho, em Estrasburgo na semana passada, a União Europeia procura agora a imprescindível normalidade.
Semanário
Esta semana foi particularmente concorrida pois correspondeu à apresentação no Parlamento Europeu, por parte dos ministros italianos, dos programas de acção para os próximos 6 meses.
Aguardava-se com particular interesse a reunião do Ministro da Economia e Finanças junto da correspondente comissão parlamentar, porque estava em causa desenvolver e compreender melhor o programa de trabalho da presidência para o importante Conselho de Ministros da Economia e Finanças (ECOFIN).
Recorde-se que, em matéria económica e financeira, a Itália anunciara que pretende combater a situação de estagnação da Europa através de um generoso plano de investimentos em infraestruturas e transportes, propondo-se, de igual modo, reabrir o debate sobre a flexibilidade para a aplicação dos critérios de política fiscal que constam do Programa de Estabilidade e Crescimento.
Foi com elevadas expectativas que se organizou o debate com o Sr. Tremonti na Comissão Parlamentar de Assuntos Económicos e Monetários do Parlamento Europeu.
É incontestável que nos últimos 3 anos a Europa teve um crescimento económico significativamente mais baixo que o seu potencial.
Esta situação coexistiu com políticas fiscais (orçamentais) fortemente controladas pelas regras do PEC (que favoreceram contudo indiscutivelmente a sustentabilidade das finanças públicas) e com uma política monetária do Banco Central Europeu, junto dos países que integram a zona euro (moeda única), que assegurou uma continuada sustentabilidade dos preços.
O nível de inflação atingiu de resto, na Europa e nos últimos anos, o seu nível histórico mais baixo.
Acresce que foi precisamente há 3 anos que se fixou em Lisboa um objectivo extremamente ambicioso ou seja o de promover, no espaço de uma década, a economia europeia à condição de economia com maior crescimento e maior competitividade no Mundo.
Verifica-se, portanto, sem margem para dúvidas que, quer as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento (responsáveis, apesar do seu recente aligeiramento, por dificuldades enormes no plano do investimento público) quer a natureza da política monetária do Banco Central (excessivamente restritiva e pouco ajustada ao crescimento potencial da economia europeia) sendo necessárias, foram manifestamente insuficientes para promover o desenvolvimento da Europa.
Uma conclusão parece, desde já, possível e incontornável e essa é a de que se para haver crescimento é preciso estabilidade, também é certo que a estabilidade só se mantém e consolida se houver crescimento.
Este é um momento chave para a Europa e para os decisores em matéria de política económica.
Importa restaurar a confiança dos investidores, lançar as bases de um comércio mais activo, desenvolvido e justo e, sobretudo, olhar para o espaço europeu, como um verdadeiro espaço único do ponto de vista económico, reforçando a coordenação dos instrumentos e a harmonização das políticas que se orientem para a oferta de bens e serviços.
Talvez tenha sido isto, de resto, que quis dizer o Sr. Duisenberg (actual Presidente do Banco Central Europeu) que, naquela que pode ser interpretada como a sua intervenção de despedida do cargo que ocupa (será substituído a curto prazo nas suas funções pelo francês Trichet), afirmou que a política monetária já tinha feito o seu trabalho, competindo agora aos Governos a sua (significativa) parte nas responsabilidades pela recuperação.
É, assim, neste quadro, que a Presidência italiana vai lançar uma nova fase na condução da política económica acentuado enfaticamente a prioridade do crescimento.
Nos últimos 10 anos o investimento público na Europa, em infraestruturas e transportes, diminuiu cerca de 0,5% do PIB, passando de 1,5% para 1%. Nos Estados Unidos (a pátria do liberalismo e da iniciativa privada) a percentagem de investimento público manteve-se inalterável e representava cerca de 6% do PIB, em média, na última década.
Existe ainda um grande espaço para a intervenção pública e uma almofada significativa para o apoio ao crescimento económico e ao desenvolvimento.
O objectivo italiano é precisamente esse; mas ao lançar a proposta de um ambicioso Programa de Acção para o Crescimento, mais não faz do que retomar o Plano Delors de 1993 que, infelizmente, os governos europeus não souberam ou não puderam concretizar.
Temos, portanto, de novo, uma proposta para um plano “europeu”, ou seja um plano de investimentos que encara todos os países da União, como um espaço único, que pode contribuir para o crescimento económico de imediato e, sobretudo, traduzirá uma forte e positiva mensagem de confiança junto dos europeus e, nomeadamente, junto dos agentes económicos.
Só que, tal como em 1993, não são claras as condições de financiamento do Plano.
Recentemente a presidência italiana recuou da sua posição de partida e já não fala na possibilidade de propor a aceitação de “regra de ouro” que, como sucede na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, exclui do cálculo do défice, os investimentos públicos. A esperança dirige-se agora para a capacidade do Banco Europeu de Investimentos em alocar os recursos financeiros necessários à concretização do objectivo, ainda que tenha que recorrer aos mercados europeus.
Mas isto não será suficiente, nem se adivinha como podendo ser eficaz, até porque o BEI mantém uma dimensão reduzida para as funções que já exerce e para a ambição que agora se lhe atribui.
Os bons propósitos da Presidência da União correm, pois, o risco de esbarrar na intransigência financeira da Comissão e do Conselho quanto às políticas fiscais dos Estados-membros, conduzindo a uma nova frustração e a um acrescido desalento.
A direcção política europeia tarda a perceber que não se pode ter “chuva no nabal e sol na eira” e que, bem vistas as coisas, o actual Pacto de Estabilidade e Crescimento já está morto e só falta que apareça alguém com força e vontade para lhe fazer o enterro.