Com a crise económica e social no topo do debate parlamentar, esta quarta-feira, o caso que mais animou a sessão foi o processo disciplinar a Lopes da Mota, numa sessão também marcada pela discussão da insegurança no Bairro da Bela Vista.
Crispação nas ruas de Setúbal contagia intervenções no debate quinzenal
Com a crise económica e social no topo do debate parlamentar, esta quarta-feira, o caso que mais animou a sessão foi o processo disciplinar a Lopes da Mota, numa sessão também marcada pela discussão da insegurança no Bairro da Bela Vista.
O pano de fundo e as personagens do debate quinzenal, esta quarta-feira, foram as mesmas de sempre, numa película em tudo igual às de tantas outras semanas. Sócrates mantém as críticas de que a oposição não tem uma alternativa de governação e a oposição contra-ataca com os casos que mais tinta têm feito correr na última semana. Nesta película, só o argumento mudou, com a insegurança na Bela Vista e o processo disciplinar a Lopes da Mota a marcarem o ritmo das intervenções do governo e da oposição. No centro do debate, a mesma estratégia de sempre, o primeiro-ministro e a oposição a jogarem “ao gato e ao rato”, com a oposição a exigir a cabeça de Lopes da Mota e com José Sócrates a passar o ónus de uma eventual demissão ao PGR. Colocando a demissão de Lopes da Mota em cima da mesa, o líder parlamentar do PSD perguntou ao primeiro-ministro se o presidente do Eurojust continuava a merecer “a confiança” do Executivo, “ao ponto de o Governo não diligenciar no sentido da exoneração deste magistrado”. O líder da bancada laranja sustentou que, “mesmo que não venha a ser punido por pressões [Lopes da Mota], admitiu um comportamento completamente contrário à ética e à deontologia de um magistrado, que é falar sobre o caso com as pessoas que estão a investigar e no sentido de influenciar uma certa decisão”. Na resposta, José Sócrates defendeu que uma eventual exoneração seria da competência do procurador-geral da República, Pinto Monteiro, passando para o PGR a responsabilidade de tal acto. Rangel prontamente replicou, e na resposta ao primeiro-ministro falou em “competência partilhada”, na qual “o Governo tem a palavra principal”. Sócrates defendeu outra metodologia, segundo a qual a eventual exoneração “compete à iniciativa do senhor procurador e a confiança é do senhor procurador”, pelo que “tudo o que diz respeito às competências do membro nacional do Eurojust em território nacional é da dependência do senhor procurador”. “Por favor, senhor deputado, não me faça agora sugestões para pressionar o senhor procurador-geral da República”, respondeu Sócrates ao líder parlamentar laranja. O outro tema quente da sessão foi a situação no bairro da Bela Vista, em Setúbal, com Francisco Louçã a assumir o comando do debate. O líder bloquista considerou que “a população [da Bela Vista] está sequestrada pela violência e pela pobreza”, e desafiou o Governo a apresentar um “programa de emergência que possa trazer segurança, pão e emprego, para acabar com os guetos no País inteiro”. Na resposta Sócrates foi curto mas eficiente, acusando Louçã de “demagogia irresponsável e básica”. “As populações do bairro não estão sequestradas pela pobreza e pela miséria, mas pela violência que alguns membros exercem sobre essa população e eu não sou dos políticos que quando vejo pessoas a disparar sobre a polícia me lembro da pobreza, o que me lembro é da segurança das pessoas e de considerar inadmissível que alguém num regime democrático dispare sobre a polícia.” Para Sócrates a insegurança nas ruas de Setúbal não são um caso de política, mas de polícia. “A polícia tem que fazer o que deve ser feito, mas não pense que [a polícia] resolve este problema”, respondeu o secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa. CDS-PP exige demissão do ministro da Agricultura Paulo Portas não deixou passar em claro a ida do primeiro-ministro à Assembleia da República para voltar a insistir na demissão do ministro da Agricultura, Jaime Silva. “Se tivesse o mínimo de respeito pela agricultura, já tinha substituído a calamidade para a agricultura que é o ministro Jaime Silva”, afirmou Paulo Portas, o que originou por parte do ministro dos Assuntos Parlamentares o pedido da palavra para defesa da honra. Augusto Santos Silva afirmou então que “calamidade” foi o Estado que o Governo encontrou quando tomou posse, nomeadamente ao nível da suborçamentação no Orçamento para 2005. No entanto, o líder popular não recuou nas críticas, sublinhando a “sucessão de incompetências” do actual Governo no sector da agricultura, relembrando a não utilização dos fundos comunitários disponíveis para o sector, “800 milhões” nos dois últimos anos, de acordo com o líder centrista, acusado pelo ministro da Agricultura de ser “perito em retórica a enganar os agricultores”. Ecologistas recordam episódio Magalhães “Os Verdes” acusaram José Sócrates de tratar “com ligeireza” a utilização das imagens de crianças numa escola de Castelo de Vide para um tempo de antena dos socialistas. Para a deputada ecologista Heloísa Apolónia, a questão não se esvazia com um pedido de desculpas. Defendendo que é necessário “saber quais são as responsabilidades do Governo” nesta questão, a deputada quis saber “como é que as imagens foram parar do Ministério da Educação ao PS”. Reconhecendo responsabilidades do seu partido neste episódio, José Sócrates admitiu que “no tempo de antena do PS houve imagens captadas na escola de Castelo de Vide que não tinham a devida autorização das crianças para serem emitidas”, retorquindo que o próprio assumiu a responsabilidade “escrevendo uma carta à escola, pedindo desculpa a todos os pais”, não deixando de lamentar que “tentar aproveitar este incidente para atacar o projecto Magalhães é que parece muito disparatado” BPP: “uma grosseira fraude” diz Sócrates Depois de a ala esquerda, BE e PCP, terem acusado o primeiro-ministro de ter entrado no comboio da direita, no que concerne às matérias de segurança, José Sócrates voltou às matérias que têm sido cavalo de batalha da esquerda nos últimos meses: as fraudes na banca. O primeiro-ministro assumiu que as irregularidades detectadas no Banco Privado Português (BPP) constituem “uma grosseira fraude” e foi mais longe ao apelar à Justiça para que aja contra os responsáveis. Para o chefe do Governo, “tanto o BPN como o BPP são dois casos de polícia” que “fizeram muito mal à economia portuguesa”, afectando a estabilidade do sistema financeiro do País. Reportando-se à situação do BPP, José Sócrates afirmou que a anterior gestão do banco, liderada por João Rendeiro, realizou práticas que “apontam para indícios de ilegalidade grave”: criou “veículos e títulos fictícios”, imputou “à carteira de clientes os prejuízos do próprio banco” e enganou os clientes, “vendendo produtos de retorno absoluto como depósitos”. “As notícias são arrepiantes”, desabafou à saída do Plenário, acrescentando: “Espero que as entidades judiciais persigam os responsáveis.” Sobre o futuro do banco, o primeiro-ministro foi parco em palavras. À saída do debate apenas confirmou que o Ministério das Finanças recebeu ontem o plano do Banco de Portugal. “Vamos estudar esse relatório”, explicou, sublinhando que o Executivo decidirá “em função do interesse geral e em função dos depositantes”. Questionado sobre a hipótese de o Estado não salvar as aplicações dos clientes com produtos de retorno absoluto, José Sócrates assegurou que “não excluirá ninguém”. Estado quer Cosec José Sócrates revelou também que o Estado está a negociar a compra da companhia de seguros de risco Cosec. O objectivo do Governo é poder intervir de forma “mais directa” nesta área, garantindo “às empresas exportadoras nacionais um acesso aos seguros de crédito”. “Fizemos uma proposta de aquisição e os principais accionistas estão dispostos a vender”, explicou o primeiro-ministro, sem contudo avançar com o valor do negócio. José Sócrates anunciou ainda a criação de mais duas linhas de crédito. A primeira, a PME Invest IV que terá uma taxa de juro de 1,05%, “com prazo de três anos e com o Estado a cobrir 75% do risco”. A segunda, dedicada ao sector da exportação, terá um valor de 200 milhões de euros, uma taxa de juro de 1% e o Estado a cobrir 50% do risco.