Depois de um longo período de silêncio, que já dura desde Julho, Manuela Ferreira Leite vai à Universidade de Verão do PSD, em Castelo de Vide, anunciar o regresso de férias dos social-democratas e dizer ao País quais os temas que marcarão a agenda do partido em vésperas do calendário eleitoral. A intervenção da líder é aguardada com grande expectativa, mas já há quem vá dizendo que será um “flop”.
A universidade PSD, que tem início dia 1 de Setembro, é o evento que simboliza, actualmente, a rentrée política dos social-democratas. Tradicionalmente, era a Festa do Pontal – que agora é em Portimão – o palco da retoma da actividade política dos laranjas depois do verão. Porém, celebração do PSD/Algarve perdeu a importância de outros tempos. A Universidade social-democrata, da responsabilidade há alguns anos do eurodeputado Carlos Coelho, é aguardada com grande expectativa porque encerra um período de silêncio prolongado de Manuela Ferreira Leite.
A líder, desde que foi eleita, tem optado por uma estratégia de gestão muito cuidada das suas intervenções. Sendo, inclusivamente, acusada por algumas figuras do seu partido de um silêncio excessivo acerca das questões nacionais e até internacionais – como a guerra do Cáucaso.
Como escreveu esta semana Pedro Santana Lopes no semanário Sol “a opção tomada [por Ferreira Leite] significa subir muito as expectativas para quando falar”. Para além intervenção da líder, os alunos do PSD poderão ouvir Pedro Passos Coelho falar sobre questões relacionadas com a cidadania, António Vitorino sobre a Europa e Leonor Beleza sobre as fundações em Portugal. O comentador e militante do PS e o ex-candidato à liderança social-democrata, que defrontou a actual presidente do partido, vão ser os dois professores da iniciativa que tem por missão a formação de jovens quadros do partido.
A iniciativa, que terá lugar entre 1 e 7 de Setembro, em Castelo de Vide, contará com a presença de cem jovens, seleccionados entre trezentos candidatos, que constituem uma média de idades de 22 anos, “a mais baixa de sempre”, segundo a organização. “A selecção foi feita de forma a termos um equílibrio de idades, de sexos e regional”, afirmou Duarte Marques, garantindo que estarão representados “todos os distritos”. A Universidade de Verão do PSD/JSD estará dividida entre aulas, que ocuparão a manhã e a tarde, e jantares-conferência, que terminarão sempre com uma intervenção.|
A Universidade do desespero
Em vésperas da sua rentrée, na Universidade de Verão do PSD, depois de uma longa espera e um silêncio quase mortal durante o mês de Agosto, a líder laranja enfrenta tempos muito difíceis. A Universidade de Verão tem tudo para ser um grande “flop”, consequência de uma estratégia errante. O tempo estival de espera não serviu para criar suspense e só debilitou a líder. Por outro lado, Ferreira Leite não se pode dar ao luxo de tentar criar hiatos, suspense e dramatização, já que não tem trunfos para jogar. Até os oradores da Universidade de Verão a desfavorecem. Passos Coelho é um deles. O ex-candidato a líder escolheu a semana anterior ao início da Universidade de Verão para criticar a estratégia de a política de Ferreira Leite, sendo este homem que é apresentado pela direcção laranja para a rentrée laranja, onde Ferreira Leite tem de mostrar tudo o que vale. Outro dos oradores é, imagine-se, António Vitorino. Ferreira Leite deve ter achado que metia uma lança em África com o convite ao ex-comissário europeu, incomodando Sócrates e fomentando a divisão no seio do PS. O primeiro-ministro deu-lhe um primeiro sinal com os elogios feitos a Leonor Beleza. Só para a troca. Agora está perto de lhe aplicar o correctivo a sério. Vitorino vai primeiro participar na Universidade de Verão e depois, logo a seguir ao 7 de Setembro, quando Ferreira Leite fizer sua entrada triunfal na Universidade de Verão, a 8 de Setembro, há o perigo de António Vitorino pode vir a ser ser entronizado no papel todo-poderoso de presidente da Respublica, a nova estrutura que o PS vai formar para preparar o programa e a estratégia para as eleições legislativas de 2009. Ou, pelo memos, ter um papel de destaque na estrutura. Se Manuel Alegre tiver dito que não a Sócrates.Aos socialistas deve dar vontade de rir. Ao PSD de Ferreira Leite o que há a fazer é chorar e, enquanto não expiam os pecados do passado, aprender a ter mais humildade.
Por outro lado, Ferreira Leite não deve ter uma novidade ou uma ofensiva marcante para apresentar no seu discurso de rentrée, marcado para o final da Universidade de Verão. A cavalgada política, súbita e sem consistência, contra a criminalidade, pedindo mesmo a cabeça do ministro da Administração Interna, Rui Pereira, parece ter sido esvaziada pela promulgação de Cavaco Silva da Lei de Segurança Interna e da Lei de Investigação Criminal. O que deixa novas interrogações sobre o papel de Cavaco. Ferreira Leite bem tem dado sinais políticos prévios do que Cavaco vai fazer, de forma a colar-se ao Presidente da República. Foi assim tanto com o veto ao Estatuto dos Açores como com o veto da lei do divórcio. Recorde-se, porém, que Marques Mendes fez exactamente a mesma coisa, tentando colocar-se por baixo do esplendor presidencial e teve o fim que se sabe, até com uma condecoração no 10 de Junho para defuntos políticos. Ferreira Leite tem tudo para ser outra desiludida com Cavaco, como aconteceu com Eurico de Melo, Miguel Cadilhe e Fernando Nogueira.
Face ao aumento da criminalidade, o PS tem agora o argumento, e o álibi, de considerar que, com a promulgação das leis de segurança interna e de investigação criminal, tem as condições para inverter a situação ao nível da criminalidade que tem assolado o país . Invocando, aliás, como trunfo político, o facto de o PS ter sido o único partido a aprovar as leis referidas, que reforçam os poderes estatais no combate à criminalidade, tendo o PSD feito criticas às leis por poderem ferir o principio da separação de poderes e os direitos dos cidadãos. Perante esta situação, o líder parlamentar laranja, Paulo Rangel, veio terça-feira dizer o óbvio, que o PS deixa de ter desculpas para a luta contra o crime. O curioso é que para se defender, a direcção laranja abre brechas. Se para o futuro, fica com estes meios legislativos, parece óbvia a conclusão que os socialistas anteriormente não tinham esses meios. Então, se não tinham os meios, parece que o PSD pediu gratuitamente a demissão de Rui Pereira. Tantos pergaminhos que a direcção laranja gosta de carregar, de coerência e rectidão, e dá nisto, nestas contradições lógicas, o que mostra bem as dificuldades por que passa Ferreira Leite. Também esta semana, num artigo de opinião de José Pedro Aguiar Branco, mais uma prosa vinda do do staff de Ferreira Leite enquanto a líder parece amordaçada, o ex-ministro da Justiça caia na mesma esparrela. Escrevia que os inimigos de Ferreira Leite a atacavam por estar calada porque sabiam a importância da sua voz. Pois, se a voz de Ferreira Leite é tão importante por que é que a líder laranja já vai para dois meses que está calada. A falta de sensibilidade e perspicácia política do staff de Ferreira Leite começa a ser gritante.
De repente, Ferreira Leite parece ter ficado sem quaisquer armas para jogar. É certo que tem o Orçamento de Estado para 2009, que vai estar na agenda política já daqui a duas semanas. Marcelo Rebelo de Sousa já alertou que pode ser a oportunidade da líder, o que pode ser a confirmação de que a líder vai atravessar outro mau bocado. Ferreira Leite podia brilhar com António Guterres mas dificilmente faz farinha com um José Sócrates que, em muitos aspectos, é mais liberal e mais austero do que Ferreira Leite. Assim, também do debate do Orçamento não devem vir boas novas para Ferreira Leite. Sócrates, para além de respeitar a sua cartilha, é muito hábil e já fez saber que a contenção é para manter, esvaziando a estratégia de Ferreira Leite. A líder laranja pode, aliás, sair esmagada do debate orçamental. Sócrates joga em várias frentes. Deve aumentar as despesas educação, o que é politicamente correcto, neutralizando Ferreira Leite, curiosamente ex-ministra da Educação. Deve aumentar algumas despesas sociais, o que também é politicamente correcto e muito útil para o ano de todas as eleições, entrando no discurso ideológico do cavaquismo, que sempre teve um forte pendor social.|PG