José Tribolet, professor do Instituto Superior Técnico, considera que, na educação e formação, pais, professores e Estado parecem “ter medo de insistir que é preciso ser disciplinado e saber disciplinar”. Para ele, a crise do nosso país “não é económica, mas, sim, uma crise moral e cultural”.
O Instituto de Defesa Nacional (IDN) destinou três dias em Outubro próximo (7, 8 e 9) para fazer um seminário sobre “Educação da Juventude: Carácter, Liderança e Cidadania”, que tem o patrocínio do Presidente da República. A comissão de honra incluirá os ministros da Defesa, da Economia, da Educação e da Ciência.
Abriu uma página na Internet, já online, http://idnjuventude.tagus.ist.utl.pt para envolver e obter o contributo de particulares, instituições educativas do básico, secundário e superior, associações de pais, professores, estudantes, patronais e laborais, para se obterem “conclusões plurais sobre resultados práticos da introdução, no processo educativo, daqueles três vectores”.
José Tribolet, professor do Instituto Superior Técnico, faz parte da Comissão Executiva do evento e acedeu a responder a perguntas sobre o tema base das seis sessões do seminário de Outubro.
Qual o papel do Estado para cuidar, apostar e investir na formação dos jovens?
A forma como a Nação cuida, aposta e investe na formação dos seus jovens determina, em larga medida, o nosso futuro colectivo. Pensar nela é muito mais do que discutir os conteúdos das disciplinas, a carreira dos professores e funcionários, o estatuto das instituições educativas, os regulamentos e os procedimentos administrativos! É, em primeiro lugar, decidir que tipo de cidadãos queremos que os nossos filhos sejam; qual o quadro de valores que queremos promover na nossa sociedade; que comportamentos e atitudes de liderança, cooperação e solidariedade queremos instituir. O processo educativo de um jovem, só com intervenções múltiplas da família, escola, trabalho e sociedade. E tem de ser desenhado para promover estes atributos éticos e, depois, avaliado em termos dos resultados alcançados nestes domínios.
Que políticas públicas para co-responsabilizar pais e professores?
Há que conciliar, na educação, os objectivos para promover: a excelência individual, apostando no desenvolvimento máximo de cada indivíduo e com o objectivo de valorizar/optimizar o todo social; a capacidade de trabalho em grupo; a solidariedade; e o sacrifício individual em prol do colectivo. Disciplina, rigor, trabalho, método, persistência, lealdade, sacrifício, honra, amizade, competição, liderança, cooperação, coragem e autocontrole são atributos que têm de ser experimentados no dia-a-dia de cada jovem. O processo educativo deve concentrar-se na formação de cada pessoa, na sua integralidade física e espiritual e não ser apenas como receptáculo de conteúdos. Importa, pois, tornar explícito, no processo educativo (nomeadamente no âmbito dos Projectos Educativos) de cada escola e demais instituições formativas, as formas concretas como aqueles atributos são vivenciados e avaliar os resultados finais alcançados.
Em que falha o nosso sistema educativo?
O estado actual do nosso sistema educativo está muito desprovido deste tipo de preocupações e, sobretudo, de práticas concretas neste domínio. Parece que temos medo de insistir que é preciso ser disciplinado e saber disciplinar. Que para ter resultados é preciso trabalhar. Que o esforço, o rigor, a competência e o conhecimento são fontes de realização pessoal, de prazer e de alegria. Que contribuir para o desenvolvimento dos outros, ser solidário e saber ser ajudado nos enriquece pessoal e colectivamente. Que a competição leal é fonte de progresso e não é incompatível com a cooperação. Que há que assumir as consequências das nossas acções. Que há que promover a diferença. Que cada um tem o seu nicho de excelência. Que há vocações!
Se isso tem valor para a pessoa, tê-lo-á também para uma sociedade virada para a economia e as finanças?
Todos estes atributos da pessoa humana têm hoje um valor económico, social e cultural cada vez maior. A formação do capital humano de uma sociedade não é matéria que compete apenas ao Estado, ao Ministério da Educação, aos seus agentes. É, sim, o cerne da aposta do futuro de uma Nação. É, sim, a possibilidade de cada um dos actuais adultos (pais, professores, patrões, gestores, profissionais) moldarem o nosso País, a nossa realidade daqui a umas gerações. A educação dos jovens é uma responsabilidade de cada um de nós, adultos.
Será que os adultos acreditam nesse motor de mudança?
O estado do País deriva, directamente, do laxismo comportamental dos actuais adultos, da nossa descrença no valor da educação, como o tal motor de transformação social. Se é verdade que as nossas capacidades, como indivíduos, não ficam a dever nada em comparação com a dos de outras nacionalidades, também é um facto, lamentável, que o nosso comportamento colectivo — nas estradas, no trabalho, nas obrigações sociais e fiscais, no nosso gozo da violação das leis mais elementares, na nossa inveja endémica perante o progresso e o sucesso dos outros, na nossa defesa da igualdade na mediocridade — explica e perpetua, todos os dias, o nosso atraso social e cultural.
Está a dizer que a crise não é económica…
A crise da nossa Nação não é económica. Não é uma questão política, de esquerda ou de direita. É, sim, uma crise moral. É uma crise cultural!
Então…
… então é imperativo romper com este estado de coisas. Há que debater, frontalmente, este tipo de atitudes e problemas e não nos refugiarmos na culpabilização dos outros, do Estado, do ministério, dos professores, dos jovens, de todos menos de nós próprios.
No segmento educativo, o que fazer?
Há que defender e promover toda a excelência. Há que preservar e multiplicar todos os modelos educativos de sucesso. Estatais ou privados. E assim se deve entender a organização desse debate nacional sobre “Educação da Juventude: Carácter, Liderança e Cidadania”, que agora começa e que culmina em Outubro. É isso que o seminário de Outubro e, agora, o debate, propõe.