2023/06/01

Francisco Assis: “Responsável pela tragédia chama-se Durão Barroso”

Francisco Assis, líder do PS/Porto e deputado, diz a verdade sobre o drama dos fogos: “o grande responsável pela tragédia chama-se Durão Barroso”. Não poupando o Governo, cuja incompetência é total, Assis considera que o comportamento do ministro-adjunto, José Luís Arnaut, ao procurar desviar as atenções com os cabeças-de-lista para as europeias, roça os limites da obscenidade.

A acção do Governo no combate aos incêndios foi muito pouco eficaz…

Isso parece-me evidente. De qualquer modo, neste momento o que importa é combater eficazmente os incêndios e prestar, de imediato, todo o auxílio possível às vítimas dos mesmos. No rescaldo desta operação, há um debate político muito sério a realizar e há responsabilidades políticas que têm que ser imputadas e assumidas.

Responsabilidades políticas imputadas a este Governo…

Como é óbvio. Creio que há aqui responsabilidades políticas a dois níveis distintos: uma responsabilidade de carácter genérico que tem a ver com uma opção política fundamental deste Governo, que foi a de, em nome de um fundamentalismo no plano do equilíbrio orçamental, ter procedido a cortes de verbas feito de uma forma cega e irracional, sem atender às consequências que daí poderiam resultar. Hipervalorizou-se o equilíbrio orçamental e esqueceu-se por completo o País. Uma das consequências, porventura a mais trágica no imediato, foi precisamente esta dos incêndios. Poupou-se na prevenção, agravou-se uma catástrofe. Há uma segunda responsabilidade de natureza mais sectorial e que tem a ver com a total incompetência demonstrada no âmbito da coordenação do combate aos incêndios. Há pois um debate a realizar e ilações a retirar do mesmo.

O ministro da Administração Interna, Figueiredo Lopes, ficou bastante “chamuscado”…

Creio que esse é o entendimento geral do País neste momento, mas o problema não se circunscreve meramente à actuação do ministro, é mais lato e mais grave e também não pode, por isso mesmo, ser resolvido pela simples escolha de um bode expiatório.

Estão, de facto, a transformar o ministro da Administração Interna num bode expiatório…

Mas não foi só o ministro da Administração Interna que falhou. Foi todo o Governo, quer porque tomou medidas que objectivamente diminuíram a eficácia da prevenção, como porque não foi capaz, no momento da eclosão da tragédia, de compreender a verdadeira dimensão da mesma.

O grande responsável é o primeiro-ministro, que é o chefe do Governo…

Em última instância, é óbvio que o primeiro-ministro é sempre o responsável máximo pelas insuficiências patenteadas pelo seu Governo. Ainda mais, como é o caso, não se trata apenas de um falhanço sectorial e conjuntural, mas sim de um falhanço que resulta e reflecte o absurdo de uma opção política fundamental deste Governo, precisamente a de tudo subordinar, de forma cega e irracional, ao objectivo de alcançar o equilíbrio
Orçamental por via da adopção de uma política ultra restritiva.

Manuela Ferreira Leite é, então, a grande responsável.

O grande responsável é sempre o primeiro-ministro.

E ele fez muito mal em ir visitar as áreas ardidas com nove mercedes. É preciso não ter o sentido das coisas…

Não conheço em pormenor essa situação, estamos a falar de coisas que têm importância no plano do simbólico, mas que são também facilmente aproveitáveis pela demagogia anti-política mais primária. E por isso não quero desferir nenhum ataque ao primeiro-ministro por esse motivo.

Mas ele foi mal recebido em Mação por causa dos mercedes.

Creio que as pessoas estavam exaltadas na sequência do imenso “stress” por causa dos incêndios de que tinham sido vítimas.

O ministro do Ambiente, Amílcar Theias, foi anedótico…

Foi notoriamente infeliz na consideração que fez e creio que já o reconheceu. Aliás, penso que o debate político não se deve centrar na apreciação daquilo que, apesar de tudo, é do domínio do “fait-divers”, e deve concentrar-se no tratamento das questões essenciais. Frases infelizes todos nós as proferimos de quando em quando.

Mas pedem a cabeça dos ministros da Administração Interna e do Ambiente e já se fala em remodelação ministerial…

Como lhe disse já há pouco, tem que se fazer uma avaliação política de todo este processo e julgo que terão de ser assumidas responsabilidades.

Quais? A demissão dos ministros?

Desde logo, o reconhecimento por parte do Governo doas enormes erros cometidos, tendo em vista a adopção no futuro de políticas com uma diferente orientação.

Mas há quem diga que o Presidente Sampaio deveria censurar o Governo, o que, de certo modo, já fez…

O PR tem actuado neste processo de uma forma assinalável, contribuindo fortemente para impedir a deterioração da confiança dos portugueses nas principais instituições representativas democráticas. O PR levou o conforto e a esperança a milhares de portugueses que se sentiam abandonados. Só temos que estar reconhecidos pela forma como tem vindo a actuar ao longo deste processo.

Foi também muito infeliz o líder parlamentar do PSD, Guilherme Silva, quando afirmou que o número de vítimas foi restrito se tivermos em conta as proporções dos sinistros…

É obviamente uma frase absolutamente lamentável.

Recordo-lhe que o anterior provedor da Casa Pia afirmou que em mil funcionários da instituição só um era acusado de pedofilia e, por ter dito isso, foi demitido por Bagão Félix. Guilherme Silva também deveria ser demitido…

Como já deve ter verificado, o meu estilo não é o de andar a pedir a demissão de quem quer que seja ou promover processos de intenções, seja a quem for. E não esqueço nunca que um homem é sempre mais do que uma frase por mais lamentável que esta se revele.

Acha que esta tragédia poderá penalizar o Governo eleitoralmente?

Não queria estar a fazer nenhuma consideração sobre as hipotéticas consequências eleitorais provocadas por uma tragédia. Não seria certamente um gesto de bom tom.

Mas não julga que a incompetência deve ser punida?

Com certeza. E acho mais. Acho que esta incompetência não é meramente sectorial nem conjuntural, mas é uma incompetência de fundo deste Governo que agora se manifestou nos incêndios, que amanhã se manifestará infelizmente noutros sectores e noutras áreas. E por isso há um debate político a fazer. É bom não esquecer, por exemplo, que o dr. Jorge Coelho se demitiu do Governo na sequência de uma tragédia para a qual a sua acção em nada concorreu. Imagine-se o que é que o dr. Portas e o dr. Durão Barroso estariam agora a dizer se o Governo ainda fosse do PS e eles ainda estivessem na oposição. Mas essa também é a diferença entre o PS e o PSD e o PP, uma diferença de postura quer no Governo quer na oposição. Aliás, já verificámos todos que a incompetência desses senhores no Governo é directamente proporcional à demagogia radical que usavam quando estavam na oposição.

Na linha do que diz, acha que o Governo se deveria ter demitido na sequência da tragédia…

Eu não estou a afirmar isso. O que não tenho dúvidas é que os principais dirigentes e responsáveis do PSD e PP teriam pedido a demissão do Governo se eles próprios ainda estivessem na oposição.

Como vê as notícias que surgem sobre a Casa Pia para desviarem as atenções sobre o drama dos fogos?

Sobre isso aguardo a evolução, que desejo o mais rápida possível, de todo o processo judicial. Agora é evidente que há quem pretenda aproveitar-se deste processo, de forma obscena, para atacar o PS e, em particular, o seu líder.

E também para desviar as atenções da incompetência e da incapacidade deste Governo…

Essa é uma ilação arguta que um velho e conceituado jornalista está a retirar.

Mas não sou só eu. O professor Marcelo Rebelo de Sousa, na sua análise desta semana na TVI, disse que não lembra nem ao careca falar em cabeças-de-lista para as europeias, a um ano de distância das eleições, como fez o ministro-adjunto José Luís Arnaut, para mais quando o País esteve em chamas, mergulhado numa profunda tragédia…

É evidente que esse tipo de comportamento roça os limites da obscenidade e revela pouca preparação para o desempenho dos mais altos lugares do Estado português.

O ministro-adjunto, José Luís Arnaut, foi, assim, totalmente irresponsável…

Creio que sim.

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