2025/11/18

“Os polacos vieram cá e ajoelharam”

Na biografia de Sócrates, esta semana lançada, fica-se a perceber porque é que o “não” da Irlanda ao Tratado de Lisboa foi uma derrota pessoal para o primeiro-ministro e advinha-se a estratégia portuguesa futura: depois de ter ajoelhado os polacos, como disse Sócrates, há que ajoelhar os irlandeses. O livro, da autoria de Eduardo Maio, editado pela Esfera dos Livros, intitula-se “O Menino de Ouro do PS” e nele também se diz que Sócrates pensa em política vinte e quatro horas por dia. Talvez porque não seja mulher, como disse Manuela Ferreira Leite esta semana.

Na biografia de Sócrates, esta semana lançada, fica-se a perceber porque é que o “não” da Irlanda ao Tratado de Lisboa foi uma derrota pessoal para o primeiro-ministro e advinha-se a estratégia portuguesa futura: depois de ter ajoelhado os polacos, como disse Sócrates, há que ajoelhar os irlandeses. O livro, da autoria de Eduardo Maio, editado pela Esfera dos Livros, intitula-se “O Menino de Ouro do PS” e nele também se diz que Sócrates pensa em política vinte e quatro horas por dia. Talvez porque não seja mulher, como disse Manuela Ferreira Leite esta semana. O SEMANÁRIO publica extractos da obra:
“O primeiro-ministro pôs, no entanto, toda a sua ambição e empenho, nessa presidência. A sua costela transmontana fez o resto. José Sócrates começou a desenhar a sua estratégia de sucesso para a presidência na noite em que a presidência alemã obteve o mandato para abrir as negociações entre os Estados-membros com o objectivo de aprovar o novo tratado: “Nessa noite eu pensei: agora vou lá dentro e vou dizer aos meus colegas que nós vamos aprovar o tratado. Vou abrir a Conferência Intergovernamental já em Julho e vamos aprovar o tratado em Outubro. Não vai ser em Dezembro, vai ser em Outubro!”, conta José Sócrates, explicando a seguir que a sua intuição política lhe dizia para correr esse risco, “quanto mais tempo lhes desse mais tempo havia para aparecerem propostas criativas. Além disso, se falhássemos a aprovação em Outubro ainda podíamos tentá-la em Dezembro. Então, fui lá dentro e disse-lhes: quero que saibam uma coisa. Tenho esta presidência toda clarinha no meu espírito. Isto vai passar-se assim – vamos abrir a CIG no dia 21 de Julho e vamos fazer a CIG mais pequena de toda a história europeia. Tudo isto vai terminar não em Dezembro, como estão a pensar, mas em Outubro, e em Outubro vamos ter um acordo. Um silêncio! E de repente: toda a gente a bater palmas. Isso é que é atitude!”, descreve o socialista. “Foi aproveitar o momento”, explica. “Porque é que eu queria em Outubro? Porque se aprovasse o tratado em Outubro ainda o assinávamos cá, durante a presidência portuguesa, como assinámos.”
A Polónia foi o país que mais dificuldades trouxe aos planos de José Sócrates: “Tínhamos ali uma questão crítica com a Polónia. Eu fiz assim. Primeiro tirámos toda a gente da frente para isolar a Polónia. Depois eu fui à Polónia e disse ao Presidente e ao primeiro-ministro: eu estou aqui muito disponível para ajudar a construir uma solução que proteja os interesses polacos. Sou sensível a isso. Mas quero que saibam de uma coisa: a cláusula de Ionina não figurará no tratado. Não é esse o meu entendimento do que está no tratado. E o presidente polaco perguntou-me: mas isto não é já para o conselho de Outubro, pois não? Porque esse conselho é dois dias antes das eleições polacas. E eu respondi: eu sei. Mas quem marcou as eleições foram os senhores, depois do conselho já estar marcado. A seguir tentaram convencer-me dos argumentos deles”, recorda José Sócrates, “e eu rematei: sabe, senhor presidente, eu nasci em 57, fui eleito para o Parlamento nacional em 87, um ano depois do meu país ter aderido à Europa. Dediquei toda a minha vida ao ideal europeu. Eu gosto demasiado da Europa para ser durante a minha presidência que vou alterar um conselho europeu por causa de uma questão interna e de uma agenda de um país membro. Não faço isso! Tenho a maior consideração pela Polónia mas isso, eu não faço. Eu não adio! Não quero olhar para trás e dizer: há aqui um acto de que me envergonho e desse acto eu tenho vergonha. E não o fiz. E eles vieram cá e ajoelharam. Assinaram o acordo dois dias antes das eleições na Polónia”, remata José Sócrates. “Aqueles seis meses foram infernais. Em trabalho e em tensão”, relembra. “Conciliar a agenda política interna e a agenda política internacional. Estava muita coisa em jogo. Eu sentia que tinha uma especial responsabilidade. Isso tirava-me o sono. Algumas vezes acordava a pensar nisto. Como resolver? Porque até aos momentos decisivos há uma grande ansiedade. Não calcula a alegria que eu e aquela gente toda tivemos no dia em que assinámos o acordo, porque são meses a pensar nisto, foi desde Outubro de 2006. A partir de Janeiro todas as sextas-feiras reunimos o grupo da presidência (…)

“Uma intensidade louca”

Noutra parte da biografia, sobre a dedicação de Sócrates ao cargo, pode ler-se: “Estudioso e trabalhador José Sócrates dedica-se ao governo praticamente o tempo todo. “Vive para aquilo com uma intensidade louca!”, afirma em tom de pasmo um dirigente do PS. “Ele dedica agora vinte e quatro horas do dia à governação”, confirma Edite Estrela, “Isso é o que mais lhe deve ter custado, ao decidir ser líder do PS, foi deixar a sua vida pessoal, deixar de ter tempo para ele e para a família.”
Desde que está no governo, José Sócrates vê os filhos ao fim-de-semana, mantendo com eles, no resto dos dias, o contacto por telefone. As férias em conjunto, em vários momentos do ano ajudam a diminuir as saudades (…)
Quando António Guterres se afastou da liderança, no final de 2001, ficou mais claro para Sócrates, e para muitos socialistas, que, muito provavelmente, o poder do partido se abriria, um dia, para ele. O socialista foi exímio na gestão dos seus passos desde então “avec son faux air de Dustin Hoffman sous des cheveux poivre et sel coupés court”, escreveu a “Le Point” a 19 de 007 – “com um certo ar de Dustin Hoffman, debaixo do cabelo grisalho de corte curto, com os seus fatos Armani ou Hugo Boss que irritam a ala esquerda do seu partido este socialista iconoclasta nunca prometeu a Lua a ninguém”. Como o próprio diz “não estou no governo para facilidades nem para vender simpatias”. José Sócrates gere o governo do país doseando a esperança e a confiança com as fortes dificuldades que o atravessam. No final do primeiro ano no poder, o primeiro-ministro avisou os portugueses que o pior ainda estava para vir.” (…)

O tabu

Sobre o tabu da recandidatura de Sócrates a PM, o livro aflora o seguinte: “José Sócrates vive a nostálgica lucidez de que a sua passagem pelo governo do país é efémera. Ainda antes de ser líder do PS, conversando com o seu amigo Joaquim Valente, o socialista reflectia sobre a mudança do poder em Espanha, o fim abrupto da longa governação de José Maria Aznar, e interrogava-se sobre se valia a pena tanto sacrifício pessoal e tanto envolvimento em nome de um projecto político que, inevitavelmente, acabaria abreviado à simples escuma dos dias, com a erosão do tempo. José Hermínio, seu amigo da Covilhã, tem razão, a comunicação da política foi-lhe rarefazendo o riso: “Sou muito obcecado com o meu trabalho, muito concentrado”, começa José Sócrates, em busca das razões, “esta governação foi uma governação muito difícil e muito exigente. Nunca passei por momentos de facilidade. Foram sempre momentos muito exigentes. Três anos…”, Sócrates arrasta a frase, como quem avalia o fardo que carregou, “três anos de dificuldades, de combates, de luta, de obstáculos, e talvez isso…”. Deixe as suas marcas?” (…). Apesar de ter no horizonte a possibilidade dos socialistas se revalidarem no poder, Sócrates recita constantemente o destino: “um político termina sempre com uma derrota”, preparando-se para o enfrentar, um dia.”|

“O PS teria de fazer uma ruptura com as políticas que tem há 30 anos”

Agostinho Lopes, em entrevista ao SEMANÁRIO, avisa que, face à “política de direita” do Governo de José Sócrates, é “inevitável que a luta de resistência e de contestação aumentem de dimensão e volume”. O deputado comunista destaque, ainda, que os socialistas teriam de “fazer uma ruptura com as políticas que estão em cima da mesa há trinta anos” para existir uma coligação com o PS em 2009.

O senhor e o secretário-geral Jerónimo de Sousa foram recebidos, na terça-feira, pelo primeiro-ministro. Um dos temas que esteve em cima da mesa foi o Tratado de Lisboa. Com que impressão saiu da reunião?
A impressão que fiquei é que o Governo de Portugal, em sintonia com outros governos da UE, quer ultrapassar uma decisão democrática de um povo, violando as mais elementares regras da democracia.

Mas se o Tratado de Lisboa não for aprovado a Europa terá de funcionar a 27 com as regras que estipulou para Quinze.
Desde o Tratado de Nice verificou-se algum impasse assim tão significativo? Alguma decisão tão importante que não tenha sido tomada? Há uma questão de fundo que julgo que ainda não foi ultrapassada: a soberania dos Estados. A UE é uma união de Estados independentes e soberanos, o que significa que nada pode ultrapassar esta questão de fundo. Cada um dos países que compõem a UE, para além da cooperação e da articulação de políticas comuns, não entregam a sua soberania de decisão. De facto, o Tratado de Lisboa, como o chumbado Tratado Constitucional, argumenta que uma questão de boa funcionalidade dos órgãos da UE exige uma alteração das regras de funcionamento. O que se trata, no entanto, é de justificar, numa situação onde a decisão das grandes potências (particularmente o eixo França-Alemanha) poderia ser posta em causa por uma maioria de outros países, a imposição, de facto, da institucionalização de um directório das grandes potências, para acautelar qualquer sobressalto desse ponto de vista.

Um bloqueio do eixo Berlim-Paris.
Que até ao momento tinha funcionado sem a necessidade de outras alterações institucionais. Isto é a ideia de que no quadro de uma Europa alargada a 27 se exige, do ponto de vista institucional, as alterações que garantam sempre que o directório das grandes potências vinga a sua vontade. Daí as alterações introduzidas.

Então, na opinião do PCP, o quadro funcional da UE deve manter-se?
Não, o quadro deve ser alterado. O Tratado de Lisboa propõe a alteração das regras da UE, com o estabelecimento de uma assimetria clara no exercício do poder, atribuindo a alguns países a capacidade de decidirem em questões centrais. Aspecto que já estava presente em Maastricht.

E é a esse aspecto que o PCP se opõe?
Essa é uma das vertentes: a configuração do poder político. A situação de uma grande potência, por si só, conseguir bloquear a opinião da grande maioria dos outros países. A configuração federal da UE, que tem, ainda por cima, associada a si a inexistência de um Orçamento eficaz. Na UE existe um reforço brutal dos comandos federais e, depois, um orçamento comunitário reduzido a menos de um por cento do PIB.

Que mais aspectos são criticados pelo PCP? Na Irlanda falava-se da ameaça da liberalização da IVG ou do casamento entre homossexuais…
No Tratado de Lisboa há todo o problema da institucionalização das orientações neo-liberais. Em grande parte pode dizer-se que algumas dessas orientações já vigoram como políticas comuns, como directivas ou regulamentos. Mas agora transformam-se essas regras em direito institucional. De facto, um Tratado neo-liberal em contraposição absoluta com a Constituição Portuguesa. Este Tratado consagra a concorrência não-falseada como critério decisivo na regulamentação da vida económica dos países da UE. Outra vertente que não é pouco criticável é o claro reforço de toda a perspectiva da UE como potência militar, como um pólo imperialista dotado de capacidades militares próprias que lhe possibilitam intervir no mundo – coisa com a qual estamos profundamente em desacordo.

Em conclusão, posso interpretar que o PCP defende menos Europa?
Não defendemos menos Europa porque não confundimos a UE com a Europa. Se me pergunta se defendemos menos UE, digo-lhe que defendemos outro rumo para UE. No sentido de uma Europa de cooperação entre Estados soberanos, independentes e iguais em direitos. E essa cooperação não pode violar os limites inalienáveis das soberanias nacionais.

Qual o objectivo da Jornada de Informação e Esclarecimento contra o aumento do custo de vida, que o PCP vai promover?
Em primeiro lugar, a ideia de dar voz, através de um partido político, a gravíssimos problemas que atingem inúmeras camadas de portugueses. Não apenas trabalhadores ou reformados, mas também muitos milhares de pequenos empresários que estão a viver uma situação angustiante do ponto de vista dos seus rendimentos, com dificuldades em fazerem frente ao dia-a-dia das suas famílias.

Acha que a sociedade do bem-estar em que hoje vivemos está em crise? A tal sociedade capitalista…
Não acredito que a sociedade Portuguesa, para os desempregados do Vale do Ave ou para os reformados com pensões de 200 ou 300 Euros, seja de bem-estar. Tenho dúvidas que para milhares de portugueses que olham para o futuro com grande inquietação – estão desempregados, continuam com um posto de trabalho precário ao fim de muitos anos de vida laboral, jovens portugueses que tiraram um curso superior e vêem milhares desempregados licenciados, até nas áreas técnicas – a sociedade portuguesa seja de bem-estar ou animadora.

A sociedade de bem-estar nunca existiu, é uma ideia falsa?
A sociedade portuguesa tem tido períodos em que conseguiu responder, minimamente, ao conjunto das necessidades fundamentais. É uma evidência que a sociedade portuguesa, naqueles anos subsequentes ao 25 de Abril, deu resposta a um conjunto muito importante de necessidades dos cidadãos. Ao nível da educação, da alimentação, da saúde, até do ponto de vista das férias – aquilo que milhares portugueses só descobriram depois do 25 de Abril. Mas desde aí, com excepção de períodos muito curtos onde existiu uma ligeira recuperação do poder de compra, somos confrontados com uma sociedade profundamente desigual. E a desigualdade social agravou-se significativamente nos últimos anos.

Mas as causas desta crise em que hoje vivemos são externas, não existe uma responsabilidade, pelo menos directa, do Governo.
Não tenho essa ideia. Não podemos deixar de reflectir sobre as consequências da crise financeira, dos preços do petróleo, do preço dos bens alimentares – muito ligados à especulação -, que estão a cair em cima do País. Outro problema é esta conjuntura externa encaixar-se numa situação de dificuldades estruturais, como a desigualdade social, o País de baixos salários, de precariedade laboral, de profundas assimetrias regionais, de fragilidades no tecido económico, que são consequência de trinta anos de uma política errada.

Mas este Governo, dentro da margem das Contas Públicas controladas, poderia ir mais longe?
Poderia ir muito mais longe. Portugal tinha todas as razões para não cumprir o Plano de Estabilidade e Crescimento. Desde logo, a sua própria fragilidade estrutural, que não foi vencida com estes vinte anos de UE. Tínhamos todas as razões para colocar aos nossos parceiros comunitários a necessidade de um período suficientemente longo para que o País pudesse vencer todos esses défices estruturais.

Mas as Finanças Públicas fortalecidas não é algo de saudável para o País?
É um objectivo. Mas a questão é como atingimos esse objectivo. Desde que se começou a perspectivar a nossa entrada para a moeda única que a redução do défice é um objectivo. Mas o espantoso é que sucessivos governos, desde Cavaco Silva a Santana Lopes, foram colocando esse objectivo, e cada um que sai do Governo deixa o Orçamento de Estado pior do que o encontrou. E repete-se o filme: nova avaliação independente do défice, subidas dos impostos…

Há uma falsa obsessão pelo controlo das Finanças Públicas?
Há um problema estrutural: nós não respondemos ao aumento das Finanças Públicas sem antes aumentarmos a produção. Ou antes, nós respondemos, mas sacrificando grande parte da população portuguesa, a começar pelo seu principal capital que são os trabalhadores. A actual situação tem alargado o leque das camadas sacrificadas, começando a atingir as camadas médias, sectores com elevadas qualificações e, mais do que nunca, a generalidade das pequenas empresas.

A contestação nas ruas, que o PCP tem liderado, é a estratégia para ganhar aos socialistas e 2009?
Não é propriamente uma estratégia nova contra este Governo. É evidente que quando a situação política, a ausência de respostas e as medidas do Governo penalizam generalizadamente a população, o inevitável é que a luta de resistência e de contestação aumentem de dimensão e volume. Nós estamos a assistir – e isso é um facto novo – ao alargamento muito significativo da luta para lá dos trabalhadores e reformados, para sectores de pequenos empresários.

Como os transportadores?
Sim, que uma parte significativa são pequenos empresários. Os agricultores. Todo o sector do comércio, que é provavelmente um dos sectores que mais dificuldade enfrenta neste momento.

A contestação nas ruas é para manter?
Nós consideramos – e dizemo-lo muitas vezes – que as soluções políticas nascem da luta, Nós, pela nossa parte, dinamizaremos, tanto quanto for possível, essa luta em torno das reivindicações que consideramos justas e da contestação a medidas do Governo que achamos altamente criticáveis, basta lembrar o pacote laboral.

Tudo aponta no sentido do PS não ter maioria nas legislativas de 2009. Veria com bons olhos uma coligação composta por comunistas e socialistas?
Ao longo destes trinta e quatro anos que o regime democrático leva de vida, o PCP colocou sempre com muita clareza uma questão: para nós o mais importante não é estar no governo nem ter ministros no governo – o que não quer dizer que não nos consideramos com direito a governar, quando o povo português assim o decidir, nós governaremos. A nossa questão fundamental é de políticas. Se olhar para a nossa abordagem crítica, para a nossa intervenção, verificará que não somos daqueles que transformam os problemas da governação em problemas dos homens ou das mulheres que a exercem em cada momento. Não vê o PCP a pedir a demissão deste ou daquele ministro.

Depreendo que se houver um concerto de políticas, o cenário de uma coligação poderá ser real?
Isso significa que o PS teria de fazer uma ruptura com os eixos centrais das políticas que estão em cima da mesa há trinta anos. Os problemas do País exigem uma ruptura com políticas que há trinta anos são guiadas pela direita. Uma questão muito concreta: todo o problema do chamado sector público e das políticas de privatização e liberalização de mercados que o Governo continua a colocar em cima da mesa. Veja-se o caso da Galp. Não é possível que bens e serviços essenciais estejam dominados por uma lógica de lucros e especulativa: a banca, a EDP, os combustíveis…

Por que razão a esquerda, em Portugal, não se consegue entender?

Primeiro, hoje é difícil considerar o PS, pela sua prática políticas, pelas suas orientações políticas fundamentais, como um partido de esquerda. Julgo que o problema central é um problema de escolhas políticas, de funções do Estado, do ponto de vista sobre a UE, da estrutura económica da sociedade portuguesa…

Há quem diga – por exemplo Baptista Bastos num artigo publicado no DN na quarta-feira – que a esquerda está presa a uma matriz ideológica e não soube acompanhar a evolução do mundo. Partilha desta visão?
Há aqui um problema do Baptista Bastos e de muitos articulistas que vão comentando, um bocado afastados da luta política diária – cada um tem a vida que quer e pode. Mas julgo que fazem uma leitura muito superficial daquilo que as diversas forças políticas – e não apenas o PCP – fazem, produzem e escrevem. Não é verdade que os comunistas não leiam, não estudam, não reflictam sobre os problemas e as novas questões que vão sendo apresentadas ao mundo e à sociedade portuguesa.

As soluções que o PCP hoje apresenta não são as mesmas que apresentava há trinta anos?
Não. Temos naturalmente em linha de conta um fim ideológico que permanece, uma estrutura de reflexão marxista-leninista – não temos dúvidas em o afirmar. Mas essa leitura nunca cristalizou sob formas estabelecidas na análise ou na resposta. Pelo contrário, procuramos fazer as leituras que julgamos adequadas à solução. Não por julgarmos ser moda e ser necessário mudar; mas por julgarmos adequadas. Nenhum partido realiza tantos debates específicos, sectoriais, regionais, nacionais sobre os mais diversos temas da sociedade portuguesa como o PCP. Têm todo o direito de estar em desacordo connosco e discordar das nossas propostas. Mas é uma profunda injustiça dizer que o PCP não estuda, não aprofunda, não procura reflectir as novas situações e problemas que o Mundo coloca.|

“Com o apoio de Jardim ficou claro que Santana vai ganhar”

Rui Gomes da Silva, vice-presidente do PSD e apoiante de Santana Lopes, diz em entrevista ao Semanário que se antes da declaração de Alberto João Jardim, Santana Lopes era já um candidato com grandes hipóteses de vitória, com o apoio do presidente do Governo Regional da Madeira “ficou claro que Santana Lopes será o próximo líder do PSD.”

Rui Gomes da Silva, vice-presidente do PSD e apoiante de Santana Lopes, diz em entrevista ao Semanário que, se antes da declaração de Alberto João Jardim, Santana Lopes era já um candidato com grandes hipóteses de vitória, com o apoio do presidente do Governo Regional da Madeira “ficou claro que Santana Lopes será o próximo líder do PSD”. O dirigente social-democrata refere também, no âmbito da política geral, que a revisão em baixa sobre o crescimento económico para 2008, confirma que as previsões do governo de José Sócrates eram falsas e irrealistas. Sobre a reforma do mapa judiciário, implicando o encerramento de muitos tribunais, Rui Gomes da Silva refere que “se vai agravar a situação de desertificação do país”, constituindo mais “uma machadada no interior do país”. Por último, em matéria de política externa, Rui Gomes da Silva critica a acção de Sócrates na Venezuela. Em primeiro lugar porque as relações próximas com Hugo Chávez podem prejudicar as relações com alguns países europeus. Basta ver as críticas que o presidente venezuelano fez recentemente a Ângela Merkel. Em segundo lugar pelo facto de descentrar a política externa portuguesa das relações com o Brasil.

Depois do apoio de Alberto João Jardim a Santana Lopes como vê as perspectivas para a candidatura do ex-primeiro-ministro?
Acho que com o apoio do Dr. Alberto João Jardim está defendido o quadro de apoios partidários das maiores estruturas do PSD do país, e isso leva a que o Dr. Santana Lopes seja neste momento, e a partir desse apoio, o melhor candidato para vir a vencer as eleições directas. Se antes era uma possibilidade com grandes hipóteses de obter vencimento, acho que a partir da declaração do Dr. Alberto João Jardim ficou claro que o Dr. Santana Lopes será o próximo líder do PSD.

Qual é a posição do PSD sobre o mapa judiciário? E a sua posição pessoal?
Achamos um erro este braço de ferro que o Governo faz sobre o mapa judiciário. Tive oportunidade de ouvir todas as partes envolvidas na questão do mapa judiciário, o Bastonário da Ordem dos Advogados, o Bastonário da Ordem dos Notários, a Associação Sindical dos Juízes, o Sindicato do Ministério Publico, o Sindicato dos Oficiais de Justiça, todas as partes interessadas na organização da justiça em Portugal, todas estas mesmas partes, todos estes sindicatos, foram unânimes em se pronunciarem contra o mapa judiciário, contra a reformulação apresentada pelo Partido Socialista.
Mas aquilo que para o PSD mais revelou foi que com a presente proposta se vai agravar a situação de desertificação do País, bem como o facto de se seguirem medidas e soluções já tentadas na saúde e na educação, que visam apenas o encerramento de tribunais, como houve o encerramento de hospitais, de centros de atendimento, como há encerramentos de escolas. Portanto, é mais uma machadada no interior do País, é mais uma machadada nesta necessidade de sermos solidários com as pessoas que não vivem nos grandes centros urbanos.

O governo reviu em baixa o crescimento económico. Como avalia estes resultados?
É no fundo a confirmação daquilo que o PSD tem vindo sempre a dizer. Dissemo-lo no debate do orçamento, dissemo-lo mais tarde em vários debates da Assembleia da Republica. Que as realidades que o Governo trouxe para o Orçamento de Estado, e as realidades que fizeram e ainda fazem, é uma maneira de mostrar aos portugueses que é possível uma recuperação, são completamente falsas, são no fundo realidades sem nenhuma sustentação, ou são números sem nenhuma sustentação na realidade. São quadros macroeconómicos que não existem, que não vão existir, e portanto levarão a uma situação económica gravíssima nos próximos meses, até fim de 2009.

O PM está em visita à Venezuela, em vésperas da Cimeira União Europeia-América Latina. Que expectativas têm para essa cimeira?
Deveria ser uma cimeira com a qual Portugal teria grandes expectativas. Não penso que a solução política que está a ser seguida pelo Governo, e com a tentativa de ligação bilateral a alguns países da América latina, seja a melhor, por duas ou três razões. A primeira, não havendo uniões económicas na América Latina, isso dificulta o relacionamento com a Europa, tal como ela existe em termos de união económica, de União Europeia. Depois porque o facto de poderes de soluções calvinistas, estarem a ser seguidas na América Latina dificulta também o relacionamento com uma Europa, com os países democráticos da Europa. Em terceiro lugar porque Portugal deveria privilegiar o relacionamento com o Brasil, e portanto esta tentativa de entendimento com outros países da América Latina que não o Brasil, são situações que, quanto a nós, não deveriam ser uma prioridade. Não deixam de ser importantes, mas a prioridade de Portugal deveria ser o Brasil. Por isso é que houve tanto investimento nos últimos anos, até em Governos em que o próprio primeiro-ministro José Sócrates era membro desse mesmo Governo, estou-me a referir ao governo do Engenheiro Guterres, e por isso a prioridade deveria ser o Brasil. Não percebo por que é que o Governo abandonou essa prioridade. |

“Sinto uma necessidade de renovação no BE”

Francisco Louçã já anunciou que pretende continuar no partido, pelo menos, até às eleições de 2009. Ana Drago, em entrevista ao SEMANÁRIO, elogia as qualidades do líder, que, considera, “até são reconhecidas pelos seus adversários”. A deputada do Bloco realça, no entanto, que “é o momento de se fazer alguma crítica interna e avançar com a renovação de cargos e do projecto político”.

Como é que está a assistir a este aumento exponencial, pelo menos em termos mediáticos, da criminalidade violenta?
Há uma diferença na forma como a criminalidade violenta tem vindo a aparecer no espaço público e os seus números. Há um paradoxo entre a forma como a criminalidade violenta tem preocupado a população e a forma como ela acontece. Nós, hoje, temos a percepção que existem em Portugal redes organizadas de criminalidade sofisticada que fazem tráfico de pessoas, tráfico de droga e tráfico de armas. Portanto, percebemos que ao nível da investigação criminal, na prevenção, não está a haver a capacidade de investigar essas redes. Temos um acesso muito facilitado às armas e temos crimes que têm uma escalada de violência e um número de mortos absolutamente insustentável.

E em resposta, o que se deve fazer?
Deve haver um forte investimento na investigação criminal para desmantelar estas redes e não possibilitar o acesso às armas, que é o que, no fundo, vai criar a criminalidade tão violenta. Mas também temos de ter políticas de prevenção ao nível da população. Temos regiões do país onde, de facto, as pessoas se sentem muito inseguras. E isso não é aceitável num regime democrático.

Esta criminalidade violenta poderá ser uma manifestação da “grave crise social” que o relatório da SEDES diz que Portugal está à beira?
É muito difícil fazer esse tipo de afirmações imediatas. A criminalidade violenta não se relaciona apenas com o angariar recursos para uma pessoa viver. Tem a ver com outro tipo de fenómenos: a desestruturação das redes de bairro, formas de vida, a perspectiva das pessoas terem a trajectória de ingressarem no trabalho e de organizarem uma família. Mas é muito difícil dizer que a criminalidade violenta resulta imediatamente de uma crise social.

O mesmo relatório denuncia uma crescente descredibilização da classe política junto dos cidadãos. Na qualidade de dirigente do BE sente isso?
Na qualidade de dirigente do BE e de cidadã. Existe um enorme descrédito da política democrática, muito em torno dos principais dirigentes. Mas não diria que atinge todos os partidos do espectro partidário.

O Bloco está fora da descredibilização.
Diria que sim. Mas eu sou suspeita a fazer essa avaliação. Creio, também, que esse tipo de avaliação não se estende ao PCP. Ou seja, a descredibilização estende-se mais aos partidos que fazem parte do arco da governação: do PS ao CDS. Histórias que conhecemos de processos que lesaram os interesses públicos e a total descoincidência entre promessas que se fazem em altura de eleições e as práticas governativas levam a que as pessoas sintam uma enorme falta de confiança na classe política.

Excluiu o BE e o PCP da mácula da descredibilização. Existe uma superioridade moral de uma certa esquerda em relação aos restantes partidos?
Não. A superioridade moral não é chamada para a política. Tem a ver com a forma como forças políticas e sociais se organizam e quais são os seus projectos. Não deve existir uma avaliação moral Essa é uma análise que os indivíduos, em casa, farão.
Por vezes fica a ideia que o BE se arroga de uma certa superioridade moral.
Longe disso! O BE discute matérias que tocam a vida das pessoas e que têm a ver com injustiças, ausências de liberdade e atropelos de direitos. Isto não é a mesma coisa do que discutir futebol. Portanto, uma pessoa quando discute matérias destas obviamente que se entusiasma, tem paixão, tem crença e se sente indignada. Não se pode discutir estas coisas como se fosse uma questão teórica ou que não tivesse importância nenhuma. Quando discutimos matérias de política apaixonamo-nos e deixamo-nos levar por essa indignação. Não creio que isso corresponda a mostrar uma superioridade moral. Mas também não aceito que me arrastem e ao projecto político onde estou para a ideia que somos todos iguais e que temos as mesmas responsabilidades naquilo que acontece no país. Não é bem verdade: o meu partido não é financiado pela Somague e há razões para isso.

Mas se o BE chegar à governação…
Essa ideia de que o ocupar o lugar do poder necessariamente implica uma mácula… não creio que seja assim. Não pode ser assim. Nem todos os dirigentes do PS que ocuparam o poder em determinados momentos estão envolvidos nas grandes negociatas do chamado “centrão dos interesses”. Tem de se fazer distinções. Não aceito essa coisa de sermos todos amalgamados. Mas isso não é uma superioridade moral; é uma prática política, uma responsabilidade, um compromisso.

Neste cenário de contestação, Maria de Lurdes Rodrigues tem condições para continuar à frente do Ministério da Educação?
Nenhuma.

Acredita que José Sócrates a vai remodelar?
Não, não acredito. O primeiro-ministro toma isto como um teste pessoal à sua autoridade enquanto chefe do Executivo. Que é a forma mais errada de ver a avaliação dos professores. É necessário avaliar os professores para qualificar o sistema educativo, isso é consensual. O problema é que o Ministério criou um sistema muitíssimo burocrático, que impôs nas escolas a meio do ano lectivo. Nada estava planeado e as escolas ficaram absolutamente assoberbadas.

É só a questão da avaliação que merece crítica?
Há várias questões. O ensino especial, por exemplo, vai ter um efeito gravíssimo sobre os membros mais vulneráveis do sistema educativo. Quando toda a agente percebe que o sistema de avaliação, tal como está montado, é errado e não há ninguém que o defenda; é muito estranho que haja um Governo que insista em levá-lo para a frente. Isso só é explicável da forma como José Sócrates tem apresentado a coisa: como já cedeu, em parte, nas questões da saúde – remodelando um ministro; ele crê que, ao remodelar Maria de Lurdes Rodrigues, o seu Governo perde aquilo que ele gosta de chamar de “ímpeto reformista”. José Sócrates acredita que isto é um teste à sua autoridade. Que é a forma mais errada de ver o problema…

José Sócrates está a personalizar nele próprio esta questão.
Acho que sim. Na entrevista que ele deu à SIC há uns dias a trás, o primeiro-ministro coloca a questão nestes termos: a avaliação dos professores sou eu. Ele quer chegar a 2009 e dizer ao país “contra tudo e contra todos eu impus uma avaliação dos professores”. Está-se a tornar numa birra do primeiro-ministro para afirmar a sua autoridade. E os grandes prejudicados são os alunos.

Há quem diga que o BE é o partido dos professores. Acha que esta contestação vivida na educação tem trazido benefícios eleitorais? As sondagens mostram isso.
Não sei. Grande parte do que é a batalha em torno da educação não passa pelo Parlamento. É muito centrada entre associações de professores, sindicatos e o Ministério. Até se dá pouca relevância ao que sucede no Parlamento ao nível da educação. Nós tentamos confrontar a bancada do PS com os problemas da educação, mas não sei se tiramos dividendos.

O Governo já entrou em campanha eleitoral?
Em parte sim. O Governo já entrou numa lógica de campanha eleitoral. Acho mesmo que aquela que tem sido a actuação da ministra da Saúda é um bocadinho indicativa. A ministra da Saúde não diz nada. Somente diz que está a avaliar o sistema, a ver as propostas, a ver a possibilidade de avançarmos… Havia uma lógica de racionalização do SNS que, agora, fica mais ou menos em stand by. Sem que se saiba o que vai acontecer ao que já fechou ou se o que estava para fechar vai fechar ou não. Mas, acima de tudo, aquilo que são as parcerias público-privadas no âmbito da saúde vão continuar.

E o BE quando é que dá o tiro de partida para a campanha eleitoral?
O Bloco vai tentando sempre construir proposta política. O BE dá o tiro de partida para a campanha eleitoral quando começar a ter a capacidade de estar mais fora do Parlamento.

Acha que o Bloco é um partido fechado na Assembleia da República?
Não, não acho. Nós tentamos sempre, sempre, sempre contraria isso. Esta casa [a entrevista foi realizada no Parlamento] produz muita coisa interna que às vezes não tem assim tanta relevância, mas que prende as nossas agendas pessoais. Todos os deputados do Bloco fazem o esforço de tentar fugir e não perder a capacidade de ir lá fora e falar com as pessoas. No próximo ano, obviamente, devemos apostar mais na capacidade de chamar gente ao Parlamento e de nós sairmos daqui.

Louçã disse que coligações com o PS nem pensar; Sá Fernandes vem dizer que em Lisboa, com ele, não será bem assim. Em que situação ficamos?
Todos nós compreendemos que o acordo que se fez em Lisboa, nestas últimas eleições, resultou da crise política mais profunda que a Câmara Municipal alguma vez viveu. Tinha-se batido no fundo em termos de credibilidade, das dívidas, de capacidade de fazer alguma política para a cidade. O acordo que se fez entre António Costa e José Sá Fernandes foi sobre pontos específicos muito claros. Isso tem permitido, até agora, responder a essa profunda crise que a CML tem vivido. Passados estes dois anos de articulação entre o vereador Sá Fernandes e António Costa, é preciso repensar quais as políticas que Lisboa necessita. É mais clarificador para a cidade se as diferentes forças políticas tiverem a capacidade de apresentar os seus projectos. E acho que José Sá Fernandes também concorda com isto.

Se este balão de ensaio correr bem, por que não continuar com a experiência?
É preciso perceber também o que António Costa pretende para Lisboa. Muitas propostas de António Costa nestas eleições não tinham a ver com a nossa visão para a CML. Nomeadamente, a questão dos despedimentos. António Costa, no início, achava que era necessário despedir grande parte dos trabalhadores. Mas esta articulação entre ele e Sá Fernandes permitiu integrar um conjunto de falsos recibos verdes nos trabalhadores da Câmara.

Se a coligação está a dar frutos positivos…Temos que perceber quais as propostas de António Costa a partir de 2009. Não creio que a política de António Costa para a cidade de Lisboa tem alguma coisa a ver com a proposta de José Sócrates para o país. São duas partes diferentes do PS. Mas não ponho as minhas mãos no fogo. Todos nós ganhamos, em 2009, que os projectos sejam claros. Se António Costa concordar em todos os aspectos com o que tem vindo a ser a estruturação do programa do BE, mas de pessoas independentes como o Sá Fernandes, então, logo se vê. Mas acho que é muito difícil isso acontecer. António Costa será, em parte, condicionado pela estrutura do PS. Podemos ser ingénuos e pensar que tudo correrá bem e que vamos ser todos muito amigos. Mas as coisas são o que são. António Costa, certamente, terá vontade de também fazer distinções em relação ao projecto do BE. Se calhar, é melhor toda a gente clarificar bem qual o seu projecto e as pessoas atribuem a sua confiança a uns ou a outros.

Sá Fernandes é independente. Pode voltar costas ao BE e juntar-se a António Costa.
Creio que não. José Sá Fernandes não está connosco por um acaso. Tem havido um projecto construído entre independentes e o Bloco. Temos tido uma consonância de pontos de vista, que se mantém. Não vejo razão para, subitamente, haver uma mudança de lado.

Não há ninguém no BE que possa suceder a Francisco Louçã? Estamos a assistir à eternização do líder.
Eternização é um bocadinho excessivo. Em 2009 serão dez anos. O problema não é que o BE não tenha tido a capacidade de gerar e criar diferentes dirigentes, responsáveis e protagonistas. O Francisco Louçã – e até os seus adversários o reconhecem – é um excelente porta-voz de um programa político. Uma pessoa muito competente e um excelente comunicador.

Mas não há ninguém no BE que seja tão bom ou melhor que Francisco Louçã?
Não estou a dizer que o Francisco Louçã é a perfeição em pessoa. Ele tem os seus defeitos – e eu bem os conheço. Mas é um excelente porta-voz de um projecto político. Isso, obviamente, cria sempre dificuldades: quem é que é capaz, tão bem, de protagonizar essa passagem de…

… Há medo de suceder ao líder carismático?
Não sei se há medo. Mas há a percepção que a política são propostas, mas também reconhecimentos. As pessoas, na rua, reconhecem o Francisco Louçã e vão ter com ele.

Também reconhecem a Ana Drago. Gostaria de ser líder do BE?
Devo-lhe dizer que não. É uma enorme responsabilidade e é muito trabalhoso. Eu, como dirigente do Bloco e deputada, sinto que às vezes há um momento em que é preciso saber respirar. Nós somos tudo isto mas não somos apenas isto. Enquanto pessoas gostamos de nos interessar por outras coisas. O Francisco Louçã faz por mês 2 mil quilómetros.

Sente internamente uma necessidade de renovação no BE?
Sinto. Até minha. Já estou em política mais visível há 5 anos.

O BE deveria entrar num novo ciclo e emergir uma nova geração?
Acho que essa nova geração vai surgindo. Agora, é preciso que também tenha espaço para fazer a sua afirmação. Uma década é muito pouco tempo para organizar uma força política, mas já é o suficiente para nos permita fazer uma avaliação. Começa a ser o momento de haver uma geração que vem olhar para as forças e fraquezas do Bloco. É o momento de se fazer alguma crítica interna e avançar com a renovação de cargos e do projecto político.

2009 será um ano vários desafios eleitorais. A Ana Drago está disponível para estar presente em quais?
É uma decisão que ainda não tomei. Gosto de ser deputada. Quando chego ao final do dia sinto-me útil e que fiz qualquer coisa que gosto e que mexe comigo. Mas também não sei se devo ficar aqui tanto tempo e não devo ir experimentar transformar o mundo em noutros sítios.

Onde?
Gostava muito de trabalhar numa organização que tivesse um impacto mais local.

Câmara Municipal do Porto, por exemplo?
Não estou a falar de instituições de política, mas da sociedade civil.

Está a ponderar abandonar a política?
É uma questão que está sempre presente. Sou um receptáculo de gente que tem histórias muito dolorosas. E eu tento tornar essas histórias mais visíveis e pressionar o poder de modo a que isso não aconteça. Mas às vezes não consigo resolver os problemas da vida das pessoas – o que é muito frustrante.

Barack Obama ou Hillary Clinton?
John Edwards.|

Aliança Santana-Menezes trava avanço de cavaquistas

Nas últimas semanas, Santana Lopes e Luís Filipe Menezes tiveram algumas divergências, o que foi aproveitado pelos cavaquistas para intervirem. Porém, esta semana, os dois homens fizeram declarações recíprocas de admiração e fidelidade, o que pode ter travado, para já, novas investidas dos adversários. Entretanto, caso o líder do PSD aceite a realização de directas antecipadas, antes das eleições legislativas de 2009, o SEMANÁRIO sabe que Ferreira Leite é o nome desejado pelos cavaquistas.

Nas últimas semanas, Santana Lopes e Luís Filipe Menezes tiveram algumas divergências, o que foi logo aproveitado pelos cavaquistas e barrosistas para intervirem. Porém, esta semana, ambos fizeram declarações recíprocas de admiração e fidelidade, o que pode ter travado, para já, novas investidas dos adversários desta direcção do PSD. Estas movimentações dos dois homens, fazendo prever um caminho e depois revelando-se outro, muito diferente, estão a deixar desconcertados, sabe o nosso jornal, muitos opositores de Menezes.
No fim-de-semana, em entrevista à TSF, Santana Lopes referiu que Menezes “tem sido irrepreensível” e que tem uma “relação exemplar” com o líder social-democrata.
Esta terça-feira, na SIC-Notícias, Luís Filipe Menezes correspondeu a esta declaração, de um modo semelhante, até com os mesmos termos. O líder laranja considerou que Santana “tem sido de uma lealdade irrepreensível, cumprindo “escrupulosamente” as decisões da direcção do partido, acrescentando que o líder parlamentar laranja “tem a minha confiança, a minha solidariedade, o meu respeito e o meu apoio. Tinha, tem e terá”. Saber se os dois homens têm sabido resistir a todas as pressões para se tornarem desavindos, conseguindo manter a unidade, ou se tudo não passa de uma encenação política de ambos, visando, precisamente, condicionar a accão política dos adversários, é a grande questão que se coloca. Levar os adversários a cometerem erros de avaliação, pode ser a principal motivação de Menezes e Santana. Refira-se que, nas últimas semanas, assistiu-se a um quase ambiente insurrecional no PSD, daqueles onde o partido tem sido fértil nos últimos anos e que parecem prenunciar movimentações com vista à mudança. Manuela Ferreira Leite multiplicou-se em declarações políticas, Paula Teixeira da Cruz criou o seu clube de reflexão, António Borges reapareceu mais uma vez, Nuno Morais Sarmento acordou da sua hibernação política, já esta semana, para criticar a proposta de Menezes de acabar com a publicidade na RTP 1 caso venha a ser primeiro-ministro. A possibilidade de existirem novas eleições directas no PSD, ainda antes das eleições legislativas de 2009, tornou-se o grande tema de discussão em vários sectores da oposição a Menezes, tendo como base o facto de, já com quatro meses de liderança, o actual líder laranja não ter revelado um programa e uma estratégia coerente para fazer uma oposição eficaz a José Sócrates. Nuno Morais Sarmento referiu, por exemplo, que Menezes não tem correspondido, sequer, como líder da oposição, quanto mais como candidato a primeiro-ministro. Recorde-se que este género de critícas foi o pão nosso de cada dia no tempo de Marques Mendes, inclusivé vindas de Menezes.
No caso de directas antecipadas, a importância de uma campanha junto das bases parece ser crucial. Foi, aliás, este um dos principais segredos da vitória de Menezes. Tendo presente esta realidade, alguns sectores menezistas não se têm cansado de acusar muitos dos críticos do actual líder de não representarem ninguém no partido, a não ser a si próprios, dando, assim, a entender, que teriam poucos votos caso fossem a directas. Porém, a perspectiva dos critícos é pouco sensível a este ataque. Entre os cavaquistas e os barrosistas há a noção de que as lógicas aparelhísticas podem de nada valer se, efectivamete, os militantes social-democratas perceberem que há uma real e forte hipótese de um nome credível e com uma política e estratégia coerente conduzir o PSD de regresso ao poder já nas legislativas de 2009, desfazendo uma meta com que Sócrates já conta. A verificar-se uma luta nestes termos, seria o confronto entre o apelo basista de Menezes e a jogada da cartada do poder, funcionando com uma das naturezas mais fortes do PSD, partido com vocação mais de governo do que de oposição.

Ferreira Leite podia ganhar a Sócrates


Caso o líder do PSD aceite a realização de directas antecipadas, antes das eleições legislativas de 2009 o SEMANÁRIO sabe que Ferreira Leite é o nome desejado pelos cavaquistas. De forma a que se diminuam os riscos e que a estratégia dê certo. Precisamente, combatendo áquela que pode ser a armadilha tecida por Santana e Menezes, levando os adversários a jogo quando já têm montado no terreno, nas distritais e concelhias, através das bases profundas, a cama em que se vão deitar. É aqui que surge o nome de Manuela Ferreira Leite. A ex-ministra das Finanças de Durão Barroso escreveu na semana passada, no “Expresso”, um pequeno artigo com grande fôlego político, começando por dizer que “governar não é um trabalho técnico que se esgota na produção legislativa e não transpõe as paredes do Conselho de Ministro”, numa alusão ao autismo do primeiro-ministro e às criticas de que é alvo de desfazamento da realidade do país, e terminando a dizer que de pouco vale a Sócrates remodelar o governo, diminuindo tensões, quando é o próprio primeiro-ministro que está na origem do problema. Os cavaquistas parecem estar convencidos que nenhum dos nomes que mais se têm agitado nos últimos meses para enfrentarem Menezes, casos de António Borges, Paula Teixeira da Cruz, Aguiar Branco ou mesmo Rui Rio, garante um sucesso fiável. Ferreira Leite tem a grande vantagem de ter mantido pontes com o menezismo e o santanismo, quer no Congresso pós-directas, quer em declarações equidistantes que fez, sempre com a preocupação do interesse do partido, quer, ainda recentemente, através da sua participação central nas últimas Jornadas Parlamentares do partido. Este estatuto de independência de Ferreira Leite poderia ter efeitos paralisantes na estratégia de Santana e Menezes. Por outro lado, segundo os cavaquistas, a ex-ministra teria fortes hipóteses de levar a melhor sobre Sócrates nas legislativas de 2009. Resta saber se Ferreira Leite está disponível para corresponder aos anseios dos opositores de Menezes e Santana.|