2025/11/18

Cadernos eleitorais do CDS não são actualizados há mais de 30 anos

O Conselho Nacional de amanhã, que decidirá entre eleições directas ou a realização de um congresso estatutário, promete ser de pacificação. A proposta apresentada por Paulo Portas de convocação de eleições directas seguidas de um congresso estatutário deverá ser votada pela maioria dos conselheiros nacionais. As directas terão por base cadernos eleitorais que não são actualizados há mais de 30 anos, constando neles muitos militantes que já faleceram ou que abandonaram o partido.

Amanhã realiza-se o primeiro Conselho Nacional democrata-cristão, na cidade de Torres Novas, após os acontecimentos de Óbidos. Entre as duas facções em disputa pela liderança existe um desejo comum: que a serenidade paute o decorrer dos trabalhos. Em cima da mesa vão estar duas propostas: a realização de directas seguidas de um congresso estatutário ou o inverso, isto é, primeiro um congresso estatutário a regular o modelo de directas adoptado e só depois o plebiscito do líder. Com a saída de Maria José Nogueira Pinto, o CN irá ser presidido pelo seu vice-presidente, Artur Jorge Bastos.
Paulo Portas e Ribeiro e Castro querem um CN pacífico, sem a crispação de Óbidos. Porém, pacifismo não significa unanimismo. Os conselheiros nacionais deverão votar maioritariamente a proposta de Portas, adoptando a realização de eleições directas e só depois um congresso estatutário a consagrar este método electivo como definitivo, à semelhança do que já aconteceu em Óbidos. Porém, a direcção bater-se-á pela aprovação de um modelo de directas, em seu entender, mais vantajoso e pela consagração de determinados aspectos considerados fundamentais para o bom funcionamento do processo eleitoral.
O Conselho Nacional de Jurisdição votou favoravelmente a supremacia do requerimento apresentado pelos 130 conselheiros sobre a petição, da iniciativa da distrital de Leiria, assinada por 1344 militantes a pedir um congresso extraordinário. Deste parecer, por emanar de um órgão de topo, só pode existir recurso para as instâncias judicias, portanto, para fora do partido. Do lado da direcção já veio a certeza de que tal mecanismo legal não será utilizado, visto que “os problemas internos resolvem-se no interior do partido”. Porém, Isabel Gonçalves, presidente da distrital de Leiria, não pôs de parte tal cenário, com um recurso da distrital afecta a Ribeiro e Castro para o Tribunal Constitucional. O SEMANÁRIO apurou junto da direcção que esta desaconselha uma acção da distrital nesse sentido, referindo que uma discussão dos assuntos internos do partido em órgãos externos só vai agudizar a crise e acentuar a imagem de desunião e desordem junto da opinião pública.
A existência de uma comissão independente organizadora das directas parece reunir o consenso entre ambas as partes da contenda, com o nome de António Lobo Xavier a conseguir a maior receptividade. O CN de amanhã vai ter como fim delinear as condições de realização das eleições directas. Em cima da mesa estarão questões como a localização das mesas das urnas, que em eleições já ocorridas chegaram a ficar em casas privadas, os documentos necessários para os militantes centristas poderem votar ou o local de contagem dos votos, aspectos que poderão aquecer os trabalhos.
É importante referir que os cadernos eleitorais do CDS/PP não são actualizados desde os anos setenta. Uma actualização que não acontecerá nestas eleições, pois não existe um prazo suficientemente alargado para proceder a tal reforma. Dos 44 mil militantes que o partido tem, muitos já terão falecido ou mesmo abandonado o partido. Em Torres Novas serão ultimados os pormenores em torno das eleições directas, com a direcção a tentar não perder mais terreno e com os Portistas e a maioria que têm no CN a poderem ditar as regras. A proposta de directas que irá emergir do CN terá de ser, na íntegra, de acordo com a Lei dos Partidos Políticos, sob pena de a parte derrotada, em última instância, impugnar o resultado das eleições no Tribunal Constitucional.
Ao que o SEMANÁRIO apurou, as decisões saídas de Torres Novas serão de compromisso entre os dois candidatos, com o intuito de não macular mais a imagem do partido que, com o anúncio ontem por parte de Maria José Nogueira Pinto de abandonar o CDS/PP e o cargo de vereadora na Câmara de Lisboa, aproxima-se de uma cisão. Uma outra questão que tem sido levantada nos últimos dias é o surgimento de uma terceira candidatura, facto que ainda não foi confirmado. A existir, será de alguém sem o “peso político” necessário para ambicionar um resultado expressivo.
Miguel Anacoreta Correia, vice-presidente dos democratas-cristãos e número dois da lista do CDS/PP na capital, vai ocupar o cargo deixado vago por Nogueira Pinto, voltando a colocar como possível no curto prazo uma nova coligação entre democratas-cristãos e sociais-democratas.

Apesar da “estocada” de Sócrates Marques Mendes resiste, resiste…

“Eu não quero que o PSD mude, por mim está bem assim” – disse o primeiro-ministro no debate mensal de anteontem, na Assembleia da República, no meio de um diálogo crispado com o líder social-democrata, a propósito da Ota. Esta frase indignou a direcção política do maior partido da oposição e foi sublinhada pelos críticos internos, dizendo que se tratou de uma “estocada” mortal para Marques Mendes. E dizem mais, que até agora, nenhum primeiro-ministro em funções ousou ir tão longe numa apreciação interna da vida de um partido com vocação de poder.

Ninguém diria, perante o modo desabrido e violento do ponto de vista da linguagem utilizada com que se confrontaram no Parlamento que Marques Mendes e José Sócrates são os mesmos dirigentes que volta e meia se encontram para negociar ou para trocar impressões sobre a política portuguesa nos mais diversos patamares, não havendo notícia de qualquer altercação entre ambos nesses encontro, no âmbito da política quotidiana. Com efeito, são muitos e frequentes os contactos entre o primeiro-ministro, o líder do PSD, porventura muitos deles nem são noticiados. Mas, por exemplo, a última edição do “Povo Livre” refere, a certa altura: “No passado dia 6 o líder do PSD Marques Mendes elogiou o esforço da Comissão Europeia para criar um mercado europeu de energia e adiantou que o Governo português terá o seu apoio se seguir a linha defendida por Bruxelas.” A esta notícia acrescenta-se o seguinte: “As declarações de Marques Mendes foram proferidas após ter sido recebido pelo primeiro-ministro José Sócrates, em S. Bento, encontro que durou hora e meia e que se destinou a preparar a próxima cimeira europeia.”
Evidentemente que há divergências de fundo, que uma coisa é a liturgia parlamentar, o comportamento público sob o escrutínio atento da comunicação social e do público em geral, outra é o tratamento das questões de Estado dentro dos gabinetes.
Como quer que seja, em termos públicos, nunca, nem nos célebres e confrangedores (para Durão Barroso) entre António Guterres e o hoje presidente da Comissão Europeia, ao tempo líder do PSD, se tinha ido tão longe no confronto entre dois dirigentes políticos com tão elevado grau de responsabilidades.
O facto poderia ser meramente conjuntural, não fora a circunstância, penosa, de uma luta sem quartel que círculos do PSD desencadeiam contra Marques Mendes e as crises, que repercutem, objectivamente na vida dos social-democratas, ou seja, a situação de indefinição que se vive na Câmara de Lisboa, onde rumores não confirmados, informações cruzadas e os mais variados boatos se misturam nos últimos dias com muita insistência. Por outro lado, a crise do CDS acaba por ser seguida com alguma apreensão, ainda que seja um factor externo à vida do PSD.

Os cenários de Lisboa

É sempre difícil fazer a abordagem de assuntos que, pela sua própria natureza, estão sob investigação judicial e, nesse âmbito, sob segredo de justiça. Mas não é possível fugir a eles, quando se dá conta de que estão outra vez a inquinar relações e a contribuir para paralisar ainda mais o funcionamento da maior autarquia do País.
Garantem alguns meios que os próximos dias, até meio da próxima semana, muita informação (boatos, rumores ou conhecimento antecipado de factos ainda ocultos) será deslindada, e então se saberá se o actual quadro se mantém ou se há alterações de fundo e de que teor.
Vale a pena, em todo o caso, referir que o SEMANÁRIO pôde comprovar um desconforto em várias forças políticas pela situação que se vive na Câmara de Lisboa, ao ponto de voltar a reequacionarem-se alguns cenários que podem ocorrer perante desenvolvimentos resultantes de conclusões perante as investigações em curso.
Por exemplo: o cenário da queda de Carmona Rodrigues voltou a ser referenciado em vários círculos, nomeadamente pelo PSD. É certo que tal cenário só poderia resultar de uma de duas razões: a demissão voluntária (ou induzida…) do autarca ou a demissão forçada por qualquer facto eventualmente resultante das investigações em curso. Num caso ou noutro, pelo menos num primeiro momento, e tal como o SEMANÁRIO escreveu, há já algum tempo, a Presidência da Câmara de Lisboa seria assumida por Marina Ferreira, vereadora e recém-vice-presidente, logo após a saída de Fontão de Carvalho. O PSD aposta neste cenário de contingência, para evitar eleições intercalares. Do ponto de vista legal isso é absolutamente possível, sendo que também legitima a opção política e essa parece tomada. Ainda assim, o Executivo camarário pode cair…

A importância de Maria José…

A crise que se vive no seio do CDS/PP pode, por ironia do destino, ter uma enorme repercussão na Câmara de Lisboa, sobretudo perante o cenário (que alguns meios, de várias forças políticas, julgam provável para muito breve) de saída de Carmona Rodrigues. Vale a pena uma explanação sucinta sobre este tema.
Maria José Nogueira Pinto anunciou que pode estar iminente a sua saída do partido em face dos acontecimentos do último Conselho Nacional. Saia, ou não saia, em qualquer caso o seu protagonismo no interior do CDS tenderá a diminuir, por força da exposição sofrida e das atitudes que assumiu e que não foram do agrado das partes em litígio. Apesar de defender Nogueira Pinto, pelos ataques e vexames de que terá sido alvo no interior do último Conselho Nacional, Ribeiro e Castro não se coibiu de dizer que “nem sempre concordou com as decisões tomadas pela ainda presidente do Conselho Nacional”.
Ora Maria José Nogueira Pinto é vereadora da Câmara Municipal de Lisboa. Foi efémero o acordo que celebrou com Carmona Rodrigues, mas nada impede Marina Ferreira, se ascender à presidência da Câmara, voltar a negociar um acordo político com Maria José Nogueira Pinto, partindo do princípio de que, deixando o CDS, continuará como vereadora, na situação de independente. Tal acordo permitiria que o Executivo da Câmara voltasse à situação de maioria absoluta e, nesse sentido, o PSD blindaria a hipótese de recurso a eleições intercalares que não deseja e que tudo fará para evitar.
Permanece, porém, o cenário simétrico, isto é, PSD e Marina Ferreira (ou ainda Carmona Rodrigues, se se mantiver) não conseguirem um acordo político com Maria José Nogueira Pinto, então é a oposição que detém maioria absoluta, como neste momento e nesse caso, a ponderação política dos outros partidos será determinante para manter ou fazer cair o Executivo da Câmara. Dito de outra maneira: se os vereadores do PS, do PCP, do Bloco de Esquerda e Maria José Nogueira Pinto, em nome do CDS ou dele desvinculada, se demitirem em bloco, tal obriga a eleições intercalares, apenas para a vereação.
É claro que podem introduzir-se subcenários. Por um lado, a manifesta indisponibilidade do PS, uma vez que o PSD tem maioria absoluta na Assembleia Municipal, as próprias divergências internas que atravessam os vereadores socialistas e a eventual incapacidade de uma coligação de esquerda, tudo isso pode tolher iniciativas e favorecer as pretensões, afinal de todos, os quais, por razões diversas, apostam na manutenção da vereação, sem recurso a eleições. Uma coisa parece certa: a degradação chegou ao limite dos limites e só um milagre poderá inverter a situação. Aguardem-se, por isso, os respectivos desenvolvimentos.

Marques Mendes e as “pilhas”
De (muito) longa duração…

Apesar dos contratempos sofridos no debate parlamentar de anteontem, Marques Mendes quer seguir o seu percurso e vem adoptando, de há algum tempo a esta parte, uma estratégia de afirmação de liderança em voz alta. Até agora, o líder social-democrata ouvia imperturbavelmente as críticas que lhe eram feitas. A partir das críticas que lhe fez Manuela Ferreira Leite, mudou de atitude, passando a dizer: “Respeito as opiniões divergentes, mas sou eu quem lidera o partido. Disse-o no Conselho Nacional, reafirmou-o anteontem várias vezes durante o controverso diálogo travado com José Sócrates.” Esta diferença qualitativa comprova aquilo que se diz que Marques Mendes vem afirmando no interior do partido: “Sou um osso duro de roer e vou à luta.”
Um célebre barrosista terá dito recentemente a um deputado que se procurava aproximar dos santanistas, desencantado com Marques Mendes, qualquer coisa como isto: “Tem calma, porque quando chegar o momento haverá quem saia a terreiro para se candidatar à liderança, com muitas hipóteses de afastar o ‘gajo’.”
Nos meios “oposicionistas” do PSD existe a convicção de que não será fácil desalojar Marques Mendes e por isso atribuem-lhe as seguintes intenções: voltar a ganhar a liderança, escolher os deputados europeus, fazer a lista de deputados às próximas legislativas e ter uma palavra decisiva nas autárquicas. E depois com um conjunto de fidelidades à sua volta sentar-se-á no Parlamento, mesmo que seja substituído por outro líder na sequência da “inevitável derrota do PSD, se o rumo dos acontecimentos não for mudado”, como dizem esses adversários internos.
A questão magna subsiste porém: quem “saltará”, para disputar com Marques Mendes, a liderança do partido. Que apoios recolherá? Que hipóteses tem de vitória?
Para além do desgastado nome de Luís Filipe Menezes, há um conjunto de dirigentes aparentemente disponíveis, sobretudo se os seus apoiantes potenciais lhe estenderem a passadeira vermelha. Rui Rio é o mais citado, sendo que Aguiar Branco, António Borges e Nuno Morais Sarmento também são falados. É duvidoso porém que tenham a capacidade para vencer Mendes ou sequer que desejem afrontá-lo. Há um nome mais consensual que pode unir, mas que, por força das circunstâncias, se manterá no mais discreto dos recatos: chama-se Manuela Ferreira Leite e pode congregar consensos surpreendentes.
Por enquanto, o PSD continuará a ter na liderança Luís Marques Mendes. Este segue o percurso que se impôs e agora vai dar primazia à revisão do programa do partido e “cavalgar” a onda da Ota e da eventual baixa de impostos. Como diz com alguma irritação um deputado crítico: “Ele é como aquelas pilhas… dura, dura, dura…”

Jardim “abriu a alma” a Cavaco

O sítio da Presidência da República, na parte onde refere as audiências de Cavaco Silva, raramente terá sido tão seco na divulgação de uma informação. Título: Presidente da República recebeu o presidente do Governo Regional da Madeira. Teor da notícia: “O Presidente da República recebeu, em audiência, o presidente do Governo Regional da Madeira, Dr. Alberto João Jardim.”

Apesar das limitações informativas, o encontro terá sido uma das mais importantes audiências do novo Presidente da República depois de ter tomado posse. É que, como pano de fundo, está, tal como o SEMANÁRIO referiu há uma semana, a possibilidade de eclodir uma crise política com epicentro na Região Autónoma da Madeira, por causa da nova Lei de Finanças Locais. E se houver crise, obviamente que Cavaco Silva terá de “meter a mão na massa”, pela primeira vez desde que está em Belém. E por isso, ouviu Jardim, que lhe abriu a alma, ou seja, que o pôs ao corrente dos pontos de vista políticos e financeiros que norteiam a estratégia do actual governo regional madeirense.
Ao contrário do que tem sucedido noutras ocasiões, a pequenina notícia, inserta no sítio da Presidência da República, não explica de quem foi a iniciativa da audiência. Tanto assim que, ontem, dois jornais diários de referência, um dizia uma coisa – que Jardim tinha sido chamado a Lisboa por Cavaco Silva – e outro tinha uma versão diferente, isto é, de que tinha sido o dirigente madeirense a solicitar o encontro com o Presidente. O SEMANÁRIO indagou os serviços de imprensa do Palácio de Belém, que responderam do seguinte modo: “A audiência foi pedida por Alberto João Jardim, há já algum tempo, só se realizou agora, por ter havido a necessidade de compatibilizar as respectivas agendas.” Não havendo razões para duvidar da informação, anota-se apenas que a mesma ocorreu menos depois de uma semana após o SEMANÁRIO ter publicado, como tema de capa, a possibilidade de serem desencadeadas eleições antecipadas na Madeira, na sequência aliás do que é voz corrente nos meios social-democratas daquela região autónoma e de que o nosso jornal se fez eco, depois de ter ouvido alguns dirigentes social-democratas. Ou seja, a situação política é, no mínimo, muito tensa entre os Governos da República e da Região Autónoma da Madeira e que, por via disso, parafraseando um dirigente político, “o Presidente também tem de ser metido ao barulho”.
Esta afirmação vai ao encontro de algumas informações, à boca muito pequena, que circulam nalguns meios políticos de que não há absoluta consonância política entre Cavaco Silva e o primeiro-ministro nesta questão, apesar das declarações “em todo o caso muito genéricas”, como disse uma das fontes do SEMANÁRIO, que a esse propósito proferiu o Presidente na sua primeira entrevista televisiva à SIC. O nosso jornal procurou encontrar pistas que confirmassem ou desmentissem tais rumores, mas, a todas as portas a que bateu, se recusaram a falar no assunto, mesmo em “off”. O que, tendo em conta as fontes consultadas e o conhecimento que existe sobre o modo de actuar, quer do Presidente, quer do primeiro-ministro, não permite, sequer, fazer uma especulação num sentido ou noutro. E se se anotam as informações é porque elas foram colhidas de modo informal e quase inesperadamente, através de um canal absolutamente credível, na opinião do autor deste texto.
Parece, no entanto, ficar claro que: a) José Sócrates e Cavaco Silva já terão falado neste assunto por mais de uma vez; b) que o Presidente sentiu necessidade de ouvir, de viva voz, o presidente do Governo Regional da Madeira (convém também não esquecer que Alberto João Jardim é conselheiro de Estado por inerência das funções que exerce, sendo mesmo o mais antigo membro do Conselho de Estado – a par de Ramalho Eanes); c) que Alberto João Jardim explicou minuciosamente as reservas do Governo regional ao conteúdo da nova Lei de Finanças Regionais, e explicou que tais reservas derivam essencialmente do facto de serem alterados quadros financeiros a meio de um mandato sufragado pelo eleitorado da Madeira, com um determinado programa que continha expectativas que, por causa disso, podem ser atrasados ou mesmo anulados. Jardim terá explicado ao Presidente que, por causa desses estrangulamentos, podem ficar em risco verbas comunitárias; d) até agora, que se saiba, nem José Sócrates, nem João Jardim, tiveram qualquer encontro sobre esta matéria; e) razão pela qual, o Presidente, se a tanto se dispuser, pode funcionar como intermediário activo para estancar uma crise que pode, no limite, desencadear eleições antecipadas na Região Autónoma da Madeira.

Recandidatura pode ser anunciada
Das fontes contactadas pelo SEMANÁRIO, registam-se algumas afirmações interessantes. Por exemplo, o convencimento, “sem nenhuma base, apenas como pressentimento”, de um antigo governante do PSD de que o Presidente acabará por vetar a Lei das Finanças Regionais, se se mantiverem as reservas colocadas pelo Governo das região autónoma”.
Trata-se de uma especulação política, que terá ganho ou perdido força a partir da audiência de terça-feira entre Cavaco e Jardim, mas que precisa ainda de passar pelo “crivo” do Tribunal Constitucional, a quem os deputados do PSD em S. Bento vão remeter o diploma, logo que tenha sido dada por concluída a redacção final que ontem à tarde prosseguia na Assembleia da República.
Um eventual veto político do Presidente da República a uma Lei, que, embora seja do Parlamento, resulta de uma proposta do Governo, marcará um primeiro sinal de desentendimento entre Belém e S. Bento. Não é a mesma coisa vetar uma lei da paridade, do que vetar um diploma governamental concreto…
A outra informação relevante, detectada pelo SEMANÁRIO, tem a ver com o ambiente político que se vive na Região Autónoma da Madeira, onde, de acordo com vários dirigentes políticos locais (e não apenas do PSD), nunca o prestígio do “velho”, como já chamam a Jardim, foi tão grande. “Se houver eleições antecipadas, por causa de um confronto com o Governo da República, Jardim obterá uma das suas mais retumbantes vitórias. Está mesmo em condições de voltar a ser candidato, de afirmar que só cumpre metade do mandato e indicar quem vai ser o seu sucessor à frente do PSD Madeira e, consequentemente, à frente do Governo regional.” Esta euforia tem razão de ser, com eventual dúvida de que em democracia não se indicam previamente sucessores… mas enfim é a opinião de alguém que está próximo de João Jardim.
Tanto quanto foi possível apurar, o PSD não abandonar a sua pressão política, razão pela qual Jardim disse, à saída de Belém, que o Conselho regional do PSD Madeira, que se realiza no dia 13 e Dezembro, vai ser muito interessante. Isto quer dizer, pura e simplesmente, que, a promulgação da lei de Finanças Regionais, contra a vontade da Região Autónoma, ou do seu Governo, implicam uma atitude de força, que nem o Presidente da República será capaz de suster. Com efeito, como pode Cavaco Silva impedir Jardim de pedir a sua demissão? como pode Cavaco Silva impedir o PSD Madeira de dizer que não indica outro dirigente para completar a legislatura regional?
E se chegarmos a este ponto, como pode o Presidente evitar a dissolução do Parlamento regional e a subsequente convocação de eleições antecipadas, depois, obviamente de cumprir todas as exigências constitucionais?
Este é o ponto de situação, que não parece ter reversibilidade. E que, mesmo sem confessar, está a causar algumas apreensões ao núcleo duro do Governo de José Sócrates. Qual vai ser o epílogo? Provavelmente só o saberemos nos primeiros dias de 2007.

“Tenho uma mágoa profunda com a direcção do PCP”

Luísa Mesquita, deputada comunista que viu recentemente retirada a confiança política por parte da direcção do partido, referiu, em declarações ao SEMANÁRIO, que “tem uma ferida incurável com a direcção do PCP”. Acusa, ainda, a direcção do seu partido de ter “violado um compromisso ético e político”.

Por que razão recusou renunciar ao mandato de deputada?
Recusei renunciar ao mandato como deputada, porque a direcção do PCP não cumpriu com a deputada Luísa Mesquita o acordado no início de 2005.

Qual o conteúdo de tal acordo?
Em início de 2005, os contactos com os candidatos a deputados são feitos. No contacto feito à na altura candidata Luísa Mesquita, por uma dirigente nacional do PCP, foi colocada a questão de poder continuar no exercício do mandato de deputada e houve da minha parte toda a disponibilidade. Entretanto, fui informada pela direcção do partido que se pretendia durante a legislatura de 2005/2009 iniciar-se a renovação do Grupo Parlamentar e que essa renovação iniciar-se-ia em meados de 2007. Ao que eu respondi, com toda a clareza, que estava indisponível para ser cabeça de lista, por razões de natureza pessoal e profissional. Portanto, o meu cargo ficou à disposição do partido, de acordo com aquilo que são os estatutos e os compromissos que os eleitos comunistas exercem com o PCP. Ao contrário daquilo que agora é dito, o PCP insistiu comigo durante duas semanas para que passa-se da indisponibilidade para a disponibilidade. Estes contactos tiveram como resultado uma reunião na Soeiro Pereira Gomes, com a referida dirigente nacional e do líder do Grupo Parlamentar. Onde fui informada que as duas questões de natureza sócio-profissional por mim colocadas duas semanas antes tinham sido compreendidas e consideradas pela direcção do PCP. A minha resposta foi clara, se o PCP considera as duas questões colocadas, eu, então, estou em condições de aceitar.

E quais eram essas condições?
As condições que coloco são de natureza socioprofissional. Por terem a ver com a minha vida privada não as tenciono dizer publicamente. Essas questões socioprofissionais impediam-me de vir para o Parlamento e sair a meio do mandato ou a dois terços do mandato, portanto, não estava disponível para a minha substituição em 2005/2009. A direcção do PCP aceitou as condições que para mim constituíam entrave à minha disponibilidade para ser cabeça de lista.

Então, Jerónimo de Sousa não tem razão ao dizer que a deputada Luísa Mesquita violou um compromisso político e de ética?
Obviamente que não tem. Quem tem razão para dizer que a direcção do PCP violou um compromisso ético e político com a deputada Luísa Mesquita e com a militante Luísa Mesquita, sou eu. Porque, efectivamente, tudo aquilo que se passou no início de 2005 para a constituição das listas foi ignorado e a situação para a direcção do PCP inicia-se no dia 21 de Junho de 2006, que é no preciso momento em que me pedem uma reunião na Soeiro Pereira Gomes para me informarem que deverei arrumar as minhas coisas e apresentar-me no meu local de trabalho em 1 de Setembro de 2006. É nesta reunião que é incumprido tudo aquilo que foi acordado em 2005. Existem, inclusivamente, gravações feitas por colegas seus, onde é expresso e claramente referido por mim que venho para a Assembleia da República para cumprir inteiramente o meu mandato, ou seja, até 2009. É no mínimo estranho, que feitas estas declarações publicamente e reiteradamente, nenhum membro da direcção do PCP me tenha dito que tais afirmação não corresponderiam à verdade.

Sai magoada deste processo com Bernardino Soares?
Saio muito magoada e penso que é uma ferida incurável com a direcção do PCP, naturalmente que dessa direcção do PCP faz parte o deputado Bernardino Soares.

O que pretende dizer com “ferida incurável”?
Estou a dizer que há feridas que são demasiado profundas para se poder equacionar alguma possibilidade de cura. São feridas e mágoas profundas.

Equaciona abandonar o partido?
Por modo próprio não o farei. Mas, como sabe, a saída do PCP não depende só da vontade do militante, depende também da vontade da direcção. A minha vontade é continuar como militante do PCP, pois a minha mágoa e o meu conflito presente não são com o meu partido, não são com os valores e princípios do PCP, mas sim com a direcção do PCP, a direcção da bancada parlamentar e a direcção política do PCP.

Por que não foi às Jornadas Parlamentares da Guarda?
As minhas decisões estão a ser tomadas minuto a minuto e hora a hora. Sobre esta matéria não é de ânimo leve que a decidi, foi reflectindo sobre ela. Quando o deputado Bernardino Soares me anuncia o conjunto de actos persecutórios e de punições de que eu vou ser alvo, enuncia-me também aquilo que a direcção do PCP me permite fazer, isto é, aquilo que eu posso fazer dentro da Assembleia da República e fora dela. E dentro da Assembleia da República, o deputado Bernardino Soares diz-me que eu, a partir de agora, integro a comissão de saúde e que posso participar nas jornadas parlamentares e nas reuniões do Grupo Parlamentar; e fora do Parlamento, continuo a ser vereadora da Câmara Municipal de Santarém. Reafirmando, mais uma vez, a total confiança política e ideológica na militante, na vereadora e na deputada Luísa Mesquita, para além de valorizar, mais uma vez, o significativo valor do meu trabalho.
A partir do momento em que o deputado Bernardino Soares, vinte e quatro horas depois, informa o país, sendo isto um caso inédito na história do PCP, que a militante perde parte da confiança política, mesmo não sabendo que parte é essa e porque a deputada está a ser transformada em algo parecido com Fernando Pessoa, que tem vários processos de heteronomia, obviamente que o âmbito das jornadas parlamentares, que têm reuniões circunscritas aos deputados, em que se reflecte sobre o trabalho do Grupo Parlamentar, em que se definem estratégias de natureza política, não tem nenhuma razão de ser. A não ser que se seja muito hipócrita, que alguém que não tem total confiança política possa integrar essas reuniões. Como eu não sou hipócrita não poderia fingir que não ouvi o que o deputado Bernardino Soares disse acerca da parcela da minha confiança política que foi perdida e participar em reuniões fechadas, onde é exigida total confiança política.

Esta realidade vai ser suportável ou sustentável por quanto tempo?
Em cada minuto avalio as minhas condições de permanecer como deputada. Quero dizer que a minha vontade de hoje é a mesma do que a de há duas semanas, continuo com o mesmo empenhamento e a mesma vontade de trabalhar. Naturalmente que o trabalho não é exclusivo no seio do grupo parlamentar, os deputados são deputados da nação e têm outras tarefas que poderão desenvolver. O meu empenhamento vai ser muito grande, independentemente do Grupo Parlamentar do PCP não permitir a minha intervenção em plenário.

Vai continuar na Comissão de Saúde ou pondera sair?
Sobre essa matéria não tomei ainda qualquer decisão. A minha presença na Comissão de Saúde não me foi proposta, foi me imposta. Portanto, estou à espera que a questão se clarifique, e enquanto tal não acontecer não tomarei qualquer decisão.

Pacto de Justiça II na calha

PS e PSD podem vir a realizar nos próximos meses um Pacto de Justiça II, com vista a rever a composição do Conselho Superior da Magistratura e do Conselho Superior do Ministério Público, o que exige a revisão da Constituição. A hipótese de os membros dos dois órgãos passarem a ser indicados pelo poder político, deixando os magistrados de indicar quaisquer nomes, pode ser a alteração mais significativa, uma reforma já tentada no tempo de António Guterres mas que não resistiu ao poder das corporações de juízes e delegados do Ministério Público da altura.

PS e PSD podem vir a realizar nos próximos meses um Pacto de Justiça II, com vista a rever a composição do Conselho Superior da Magistratura e do Conselho Superior do Ministério Público, o que exige a revisão da Constituição. A hipótese de os membros dos dois órgãos passarem a ser indicados pelo poder político, deixando os magistrados de indicar quaisquer nomes pode ser a alteração mais significativa, uma reforma já ensaiada no tempo de António Guterres mas que não resistiu ao poder das corporações de juízes e delegados do Ministério Público da altura. Curiosamente, foi o hoje presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha do Nascimento, um dos mais acérrimos críticos dos propósitos do PS, então formulados por Almeida Santos.
A actual composição do CSM integra sete membros eleitos pela Assembleia da República, cinco pela Presidência da República e outros sete eleitos entre as magistraturas. O artigo 218º da lei fundamental dá dignidade constitucional a esta matéria, razão pela qual as alterações neste domínio tenham de envolver um Pacto de Justiça II entre socialistas e social-democratas com incidência ao nível da revisão da Constituição, de modo a perfazer a maioria de dois terços. Por sua vez, a composição do CSMP integra elementos eleitos pela Assembleia da República, designados pelo ministro da Justiça e escolhidos entre os magistrados, tendo esta matéria igual dignidade constitucional.
Uma nova composição do CSM e do CSMS poderá envolver ou a eleição de todos os membros pela Assembleia da República ou a manutenção do poder do Presidente da República de indicar nomes para os cargos. Ainda esta semana, numa entrevista que deu à SIC-Notícias, Laborinho Lúcio, vogal do Conselho Superior da Magistratura, indicado pelo Presidente da República, Cavaco Silva, fez questão de defender, a título pessoal, que o CSM e o CSMP não deveriam ser membros escolhidos entre os seus pares, considerando que os vogais respectivos poderiam ser eleitos pela Assembleia da República, sendo magistrados ou não magistrados. Naturalmente que a opinião de Laborinho é sua e de mais ninguém mas não deixa de ter grande relevo político. Laborinho é muito próximo de Cavaco Silva, tendo o actual Presidente da República grande admiração pelo seu trabalho. Refira-se que uma alteração desta envergadura, envolvendo a revisão da Constituição, só pode ser feita com o patrocínio do Presidente da República. Resta saber qual a posição de Marques Mendes. O líder do PSD não tem espaço de manobra para divergir de Belém ou dos homens mais próximos de Cavaco. Mas, por sua vez, a assinatura de um Pacto de Justiça II pode debilitar mais a sua posição em relação aos críticos menezistas e santanistas, que na última semana sustentaram que Mendes anda complacente com Sócrates e que não faz uma verdadeira oposição.
No pacto da Justiça celebrado há dois meses entre PS e PSD as alterações mencionadas ao nível do Estatuto dos Magistrados do Ministério Público e do Conselho Superior da Magistratura, limitaram-se a envolver mudanças ao nível de direitos e regalias, reformas, cálculo de pensões e jubilação. Em relação ao Conselho Superior da Magistratura prevê-se no acordo que o CSM “será dotado de autonomia administrativa e financeira, por forma a permitir-se uma efectiva responsabilização pela gestão de meios e recursos colocados à sua disposição. O acordo entre o PS e o PSD também refere que são criadas “as adequadas condições que assegurem a presença, em regime de permanência, de membros não magistrados no Conselho.” Curiosamente, estas duas propostas contidas no acordo PS e PSD deixaram alguns magistrados com uma pulga atrás da orelha.
Refira-se que o Conselho Superior da Magistratura é hoje presidido por Noronha do Nascimento, na qualidade de presidente do STJ. Na vice-presidência está Santos Bernardino, homem próximo de Noronha. Há eleições em Fevereiro para substituir Bernardino e o nome melhor colocado para ganhar é o de Ferreira Girão, outro homem próximo de Noronha. Recorde-se que Noronha de Nascimento tem Pinto Monteiro como inimigo de estimação. O novo PGR, como é sabido, foi escolhido por Sócrates (e parece que por mais um núcleo muito influente) e por Cavaco. O que pode querer dizer, se a lógica fizer sentido na política, que Noronha não está nas boas graças do poder político. Não por acaso, certamente, Noronha do Nascimento, denunciou esta semana, no seu discurso de tomada de posse como presidente do STJ a existência de “poderes fácticos” interessados em pôr em causa o poder judicial, acrescentando que há uma “deslegitimação larvar e surda dos tribunais”. Refira-se que, há pouco mais de dois meses, Pinto Monteiro denunciou que Noronha do Nascimento teria controlo político sobre o colégio eleitoral de conselheiros do STJ que elege o presidente do STJ. Como em política, quase sempre o que parece é, também não é certamente por acaso que o poder político aponta a mira à composição do Supremo Tribunal da Justiça, prevendo~se no pacto PS-PSD a existência de uma quota para não magistrados. O mesmo se diga em relação a uma eventual “revolução” na composição do Conselho Superior da Magistratura. Em política não há coincidências.

Vendaval na Justiça

O vendaval na Justiça não dá, assim, mostras de abrandar. Com dois blocos muito bem definidos a medirem as suas forças, testando estratégias e colocando as suas peças no terreno. O procurador-geral da República, Pinto Monteiro, deu há quase duas semanas o primeiro passo, propondo um homem da sua estrita confiança para vice-procurador-geral da República, o procurador-adjunto, Mário Dias Gomes. As estruturas do Ministério Público reagiram imediatamente, com um veto ao nome indicado por Pinto Monteiro. Em cima da mesa está agora a hipótese do novo PGR não apresentar novo nome, delegando competências em procuradores-adjuntos, tal como o SEMANÁRIO revelou na semana passada, ou voltar a apresentar Mário Gomes Dias. Caso em que corre nos meios judiciais afectos ao Ministério Público que o veto pode ser ainda mais pesado em termos de votos. Na votação de 16 de Outubro, Mário Gomes Dias foi chumbado à tangente por nove contra oito votos. No sábado passado, o semanário “Expresso” noticiou que o governo deverá reforçar os poderes do PGR, designadamente com a possibilidade de escolher livremente os seus colaboradores. O que implica, naturalmente, mudar o Estatuto do MP, que exige parecer prévio do CSMP para a escolha do vice-PGR. No mesmo sábado, um almoço de homenagem a Souto Moura reuniu quase mil pessoas. Souto Moura e muitos dos presentes fizeram saber que estavam contra alterações do Estatuto do MP ao nível da escolha do vice-PGR. Dois dias depois, o presidente do STJ fez questão de denunciar a existência de “poderes fácticos” que colocam em causa a independência do poder judicial. A próxima batalha ainda pode ser só no campo imediato do vice-PGR mas a próxima guerra já é no baluarte do CSM e do CSMP. Com o novo acesso ao STJ pelo meio.